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A construção da geomorfologia brasileira, Manuais, Projetos, Pesquisas de Geografia

Artigo que trata do desenvolvimento da Geomorfologia brasileira, destacando as principais influências e os principais nomes brasileiros desta ciência tão maravilhosa.

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2014

Compartilhado em 09/01/2014

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Baixe A construção da geomorfologia brasileira e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Geografia, somente na Docsity! Geografia: Ensino & Pesquisa, Santa Maria, v. 1 2, n. 2, p.36 - 45, 2008 ISSN 0103­1538 ACONSTRUÇÃO DAGEOMORFOLOGIA BRASILEIRA: AS TRANSFORMAÇÕES PARADIGMÁTICAS E O ESTUDO DO RELEVO¹ Antonio Carlos Vitte² RESUMO O objetivo do presente trabalho é o de realizar um estudo histórico e epistemológico sobre o desenvolvimento da geomorfologia brasileira. Para a realização deste trabalho foram levantados artigos de periódicos nacionais, além da leitura de teses de doutorado e dissertações de mestrado produzidas nos programas de pós-graduação da Universidade de São Paulo e Universidade Estadual Paulista-Unesp, Campus de Rio Claro-SP. A fundamentação teórica baseia-se na concepção de Thomas Kuhn (Kuhn, 1 992) de ciência normal e rupturas paradigmáticas. Foram identificadas as seguintes fases da geomorfologia brasileira: a) Primórdios, quando há forte vinculação com a teoria davisiana. ; b) Ruptura Epistemológica dos anos de 1 950, marcada pela incorporação da teoria da pediplanação de Lester King, com destaque para os trabalhos de Aziz Ab`Saber, João José Bigarella, Maria Regina Mousinho e Fernando Flávio Marques de Almeida. C) Problemática Ambiental. Marcada por forte inserção da teoria geral dos sistemas e influenciada pela concepção geossistêmica, principalmente a desenvolvida por Georges Bertrand. D) Fase Atual: marcada pelo aprofundamento das questões ambientais, como a urbana, com o desenvolvimento de metodologias de estudos. Há um crescente aumento de estudos de morfotectônica, quando a neotectônica passa a ser uma componente importante dos estudos geomorfológicos. Outra participação importante é a crescente preocupação com a geoquímica, destacando-se a teoria da etchplanação que está fundamentando novos estudos regionais de geomorfologia no Brasil e possibilitando que se reveja a datação das superfícies da aplainamento que foram definidas na fase B, de ruptura epistemológica. Palavras-Chave: Epistemologia da Geografia. Paradigmas. Geomorfologia. Brasil. RESUMEM El objetivo del presente trabajo es el de realizar un estudio histórico y epistemológico sobre el desarrollo de la geomorfología brasileña. Para la realización de este trabajo fueron estudiados artículos de periódicos nacionales, además de lecturas de tesis de doctorado y disertaciones de maestría producidas en los programas de pós-graduación de la Universidad de San Pablo y Universidad Estadual Paulista –Unesp, Campus de Rio Claro-SP. Los fundamentos teóricos se basan en la concepción de Thomas Kuhn (Kuhn, 1 992) de “ciência normal e rupturas paradigmáticas”. Fueron identificadas las siguientes fases de la geomorfología brasileña: a) Primordios, cuando hay un fuerte vínculo con la teoría davisiana. b) Ruptura Epistemológica de los años de 1 950, marcada por la incorporación de la teoría de la pediplanación de Lester King, con destaque para los trabajos de Aziz Ab`Saber, João José Bigarella, Maria Regina Mousinho y Fernando Flávio Marques de Almeida. C) Problemática Ambiental. Marcada por la fuerte inserción de la teoría de los sistemas e influenciada por la concepción geosistémica, principalmente la desarrollada por Georges Bertrand. A partir de la mitad de los años 1 980 y al comienzo de 1 990 es marcado por trabajos asociados a la degradación ambiental en redes hidrográficas, particularmente a la erosión de los suelos provocada por el uso de las tierras. D) Fase Atual: marcada por la profundidad de las cuestiones ambientales, como la urbana, como el desarrollo metodológico de estudios. Hay un creciente aumento de estudios de morfotectónicos, cuanto a neotectónica pasa a ser un componente importante de los estudios geomorfológicos. Otra participación importante es la creciente preocupación con la geoquímica, destacándose la teoría de la “etchplanação” que está fundamentado nuevos estudios regionales de geomorfología en el Brasil y posibilitando que se rebaje las fechas de las superficies del aplanamiento que fueron definidas en la fase B, de ruptura epistemológica. Palabras-Clave: Epistemología de la Geografía. Paradigmas. Geomorfología. Brasil. ¹ Projeto Fapesp 2006/01047-7 ² Departamento de Geografia, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Unicamp, Campinas (SP), Brasil. CP 6152, CEP 13087-970. E-mail: vitte@uol.com.br. Pesquisador CNPq. INTRODUÇÃO Nos últimos anos, a comunidade científica de geógrafos que trabalham com a natureza e mais especificamente a geomorfologia vem chamando à atenção para o fato de que há uma necessidade em avaliarmos as bases históricas e epistemológicas da geomorfologia e de sua relação com a Geografia. Para Rhoads e Thorn (2002), devemos enfrentar o desafio de refletirmos sobre os problemas filosóficos e metodológicos da geomorfologia, que achávamos que estavam resolvidos, mas que hoje, com o impacto da big science nas ciências de ummodo geral, está descaracterizando a geomorfologia do contexto da Geografia. Fato que levou Gregory (2000) a avaliar que a maior produção de geomorfologia não se realiza mais em periódicos de Geografia, mas nos periódicos de ciências naturais e multidisciplinares e, que, muito mais que realidade, há um dogma de que a geomorfologia seja o núcleo agregador da geografia física. Esta situação tende a ficar mais evidente a partir dos anos 2000, onde passa a ser cada vez maior as relações e o atrelamento da geomorfologia com as questões culturais, políticas e ambientais, acelerando a partir de então a fusão da geomorfologia com outras disciplinas, como por exemplo a hidrologia e os estudos do quaternário, que segundo Gregory etAL (2002) estaria em constituição um novo campo científico, a Ciência do Quaternário. É dentro deste quadro que o objetivo deste artigo é apresentar e discutir rapidamente a produção da geomorfologia brasileira, fundamentado na noção de rupturas paradigmáticas de Thomas Kuhn (1992). Devemos ressaltar que a análise da produção não se faz pela quantidade de artigos ou pelos centros produtores da geomorfologia no Brasil. Antes, é uma discussão sobre a história e a epistemologia da geomorfologia no Brasil, procurando destacar os momentos de reflexão e ruptura que levaram as transformações paradigmáticas na geomorfologia brasileira e sua relação com a produção do território nacional. No Brasil, exceto em alguns momentos em que Ab’Saber (1958) refletiu rapidamente sobre o fazer geomorfologia no Brasil, devemos destacar o trabalho de Abreu (1982) em sua tese de livre-docência, intitulada “Análise Geomorfológica: reflexão e aplicação” procurou estabelecer uma filogênese sobre o pensamento geomorfológico, em nível global, identificando duas grandes linhagens de pensamento sobre o relevo, sendo a primeira a “Linhagem Epistemológica Americana” e a segunda, a “LinhagemAlemã”. Assim, a “linhagem americana” está associada diretamente aos trabalhos de William Morris Davis e ao seu clássico trabalho de 1899, intitulado “The Geographical Cycle”, assim como a conquista do oeste norte-americano e a busca pelo ouro, conduzida pelos trabalhos dos geólogos que priorizaram a ação fluvial sobre a dinâmica das vertentes, na esculturação do relevo. A “linhagem Alemã” desenvolveu-se a partir dos trabalhos de grandes naturalistas, que tinham por referência as obras de Kant, Goethe e Humboldt, que privilegiavam uma visão totalizadora e integrada entre os elementos da natureza, emergindo desta postura a noção de georelevo e o seu significado para a análise integrada dos espaços humanizados (Abreu, 1982). Apesar da rápida exposição que fizemos do trabalho de Abreu (1982) percebe-se claramente que o mesmo preocupou-se com as matrizes do pensamento geomorfológico em geral e não propriamente sobre a produção da geomorfologia no Brasil, muito embora tenha destacado o papel de Aziz Ab’Saber na renovação da geomorfologia brasileira. A PRODUÇÃO DA GEOMORFOLOGIA NO BRASIL A ASSIMILAÇÃO DO PARADIGMA DAVISIANO NOS ESTUDOS DO RELEVO DO BRASIL Genericamente, pode-se dizer que a estruturação científica da geomorfologia no Brasil está muito associada a dois grandes marcos na história política e cultural do Brasil dos anos de 1930, que são de um lado a criação e a institucionalização de várias universidades, destacando-se neste caso a Universidade de São Paulo, USP e já com o Estado Novo (1937-1945) a criação do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que oficialmente terá incumbência de coletar, sistematizar e pensar a questão do território brasileiro, a fim de fornecer elementos analíticos que norteassem as políticas de Estado. Especificamente, no que se refere a concepção de elaboração das superfícies erosivas no sudeste brasileiro, a história da geomorfologia registra a influência de duas grandes matrizes epistemológicas. A primeira compreende a década de 1930 e avança até aproximadamente meados da década de 1950, onde o paradigma dominante é o “Ciclo Geográfico da Erosão”, elaborado por Davis em 37 Geografia: Ensino & Pesquisa ISSN 0103­1538 40 Geografia: Ensino & Pesquisa ISSN 0103­1538 climáticas da Terra e a possibilidade de associar as evidências destas variações com os sedimentos continentais e, a partir daí, estabelecer uma idade para as formas de relevo. Ainda dos anos 50, temos o uso, ainda que tímido, das fotografias aéreas para as pesquisas geográficas e geomorfológicas, possibilitando uma visão tridimensional das formas e de suas associações em escalas, que associadas aos trabalhos de campo permitiriam construir hipóteses mais condizentes para explicar os fenômenos geomorfológicos em ambiente intertropical. É neste contexto cultural que a comunidade brasileira de geomorfólogos entrará em contato com a Teoria da Pediplanação elaborada pelo geólogo sul africano Lester King (1956), que segundoAbreu (1982) surgirá a partir da influência do congresso de Chicago de 1936, que foi dedicado à obra deWalter Penck. No ano de 1956, realiza-se no Rio de Janeiro, o Congresso da UGI, em que as discussões internas são intensificadas com as que se desenvolvem nos trabalhos de campo “pós-congresso”, que foram comandados por Jean Tricart, Jean Dresch e Ab’Saber. O foco central das discussões foi o da problemática dos materiais nas vertentes, principalmente para os paleopavimentos detríticos e o seu significado paleoambiental e geomorfológico. Uma outra influência muito forte na geomorfologia brasileira, com repercussões no aspecto da geomorfologia climática e principalmente para a cronogeomorfologia e importante para a estruturação da Teoria dos Refúgios Florestais, foi o surgimento das concepções de bisotasia e resistasia por Erhart (1966). Outro fato marcante para a consolidação da ruptura epistemológica da geomorfologia brasileira, foi a vinda de Lester King ao Brasil, à convite do IBGE. O produto da estada de King trabalhando em território nacional, foi a publicação do artigo de 1956 na Revista Brasileira de Geografia intitulado PROBLEMAS GEOMORFOLÓGICOS DO BRASIL ORIENTAL, que forneceu elementos para a sua teoria da pedimentação e da pediplanação (1967) que passaram a influenciar as pesquisas geomorfológicas no Brasil. Assim, em função das especializações da geologia, das novas técnicas e o cimento teórico-metodológico que foi a Teoria da Pediplanação e a Teoria da Bio-Resistasia, os geógrafos-geomorfólogos foram despertados para o estudo dos materiais superficiais e principalmente para o possível papel das “Stones-lines” e cascalheiras enquanto registro das mudanças climáticas no Brasil (Ab’Saber, 1962). Muito embora trabalhando no Brasil a convite do IBGE, King não conseguiu resolver o problema dos pedimentos e dos pediplanos no Brasil Tropical (Penteado, 1969), e é neste momento que a imaginação e a criatividade dos pesquisadores brasileiros irá desenvolver estratégias conceituais e teóricas provocando uma “revolução” mundial dentro da chamada geomorfologia climática. Como o modelo de King fora desenvolvido tendo como área empírica o deserto de Bostwana, muito de suas formulações não se encaixavam na explicação da pedimentação e da pediplanação no Brasil, eis que os trabalhos de Bigarella e principalmente Ab’Saber procuram entender o processo de pedimentação- pediplanação a partir de uma correlação entre as taxas de epirogênese e as variações climáticas ao longo do Quaternário. A pressuposição de que uma dada área passou da fase de tropicalidade, biostática para uma fase de aridez profunda dada por uma variação climática. O que se procura demonstrar é a complexização do relevo no mundo tropical quando ocorre uma variação climática do úmido para o seco e vice-versa. As “Stones-lines”, neste caso, seriam o produto da desagregação de núcleos rochosos em fase de extrema semi-aridez e que os fragmentos rochosos seriam transportados por sobre o relevo a partir da ação das enxurradas e que também posteriormente seriam recobertas por sedimentos carreados de outras áreas.(Bigarella, Marques Filho & Ab’Saber, 1961; Bigarella, Mousinho & Silva, 1965a). Neste esquema explicativo, os geomorfólogos braileiros resolviam o problema de explicar os paleopavimentos detríticos e rudáceos, em um ambiente tropical, em que sabidamente não há rocha disponível à desagregação tão facilmente como na área modelo de Lester King pois como é sabido, que na região tropical o intemperismo das rochas é muito intenso. A partir deste modelo desenvolvido pelo geomorfólogos brasileiros, e com o uso de fotografias aéreas, a análise geomorfológica, agora não mais com o objetivo de buscar em que fase o relevo encaixava-se no ciclo davisiano, mas sim estabelecer as grandes superfícies de aplainamento, geradas pela coalescência de pedimentos e a idade a elas correlacionadas. É assim que Bigarella & Ab’Saber em 1961 irão produzir o trabalho “ As superfícies aplainadas do Primeiro Planalto do Paraná”, em que se busca claramente a correlação entre os níveis de aplainamento, os seus depósitos e as idade associadas. No final dos anos de 1960 a geomorfologia brasileira presenciar duas grandes revoluções com Aziz Ab’Saber. Primeiramente, fruto de uma longa reflexão e muita 41 Geografia: Ensino & Pesquisa ISSN 0103­1538 experiência em campo, que já começara durante a elaboração de sua tese de doutoramento em 1951, Ab’Saber irá publicar em 1969 o clássico trabalho “ Um Conceito de Geomorfologia a Serviço das Pesquisas sobre o Quaternário”, um trabalho de cunho metodológico e que exerce influência nas pesquisas geomorfológicas até os dias atuais. Uma outra revolução é a noção domínios morfoclimáticos (Ab’Saber, 1967) de Refúgios Florestais (1979) que não apenas revolucionou a geomorfologia climática no mundo, mas também aBiogeografia. No trabalho de 1969, Ab’Saber apresenta a sua concepção de geomorfolgia, que para Abreu (1982) é um marco teórico e metodológico nos trabalhos de geomorfologia e ao mesmo tempo, em que coloca Aziz como sendo aquele que incorpora e desenvolve as proposições da linhagem epistemológica germânica (Abreu, 1982). Para Ab’Saber (1969) para a análise geomorfológica dever estar centrada no Quaternário. Esta análise envolve três etapas, sendo o relevo o produto de uma interação complexa que é tecida pelas forças endogenéticas e exogenéticas. Assim, em um trabalho de geomorfologia, devemos considerar como primeiro nível de análise a “compartimentação topográfica”, que envolve não apenas a análise da topografia, mas principalmente a influência da geologia e da estrutura nesta compartimentação, que é regionalmente definida pelos remanescentes de aplainamentos. No segundo nível de análise, o geomorfólogo deve considerar a “estrutura superficial da paisagem”, que corresponde aos solos, mas principalmente aos colúvios, as rampas coluviais e neste caso a possibilidade de cascalheiras e “Stones-lines” não apenas no contato rocha- colúvio, mas inclusive com linhas embutidas no pacote coluvial. As análises físicas, químicas, micromorfológicas permitem a dedução dos processos e a qualidade dos mesmos que atuaram na destruição ou mesmo no reafeiçoamento das formas pretéritas. A correlação dos dois primeiros níveis permite já o estabelecimento de uma compartimentação das formas geneticamente homogêneas, com grande utilidade no planejamento ambiental. O terceiro nível de análise de Ab’Saber (1969) é a “fisiologia da paisagem”, compreendida pelo autor como sendo a expressão do funcionamento atual da geoesfera. No caso, corresponde aos processos atuais que atuam no modelamento das formas. Com esta proposição metodológica, Ab’Saber (1969) desprende-se dos problemas advindos com a adoção da taxonomia das formas de relevo, como as propostas por Tricart (1965). Agora, as formas são produto dos processos passados e dos atuais, em um quadro em que participam tanto a geologia quanto as forças climáticas e paleoclimáticas. A Teoria dos Refúgios Florestais representa uma imensa revolução da geomorfologia brasileira em contexto mundial, uma vez que Aziz imprime em sua elaboração a necessidade de considerarmos a compartimentação geomorfológica como sendo condição sine qua non para compreendermos de um lado a complexidade do tecido biogeográfico brasileiro e de outro a própria especificidade dos ditos refúgios. A partir da Teoria dos Refúgios Florestais, a geomorfologia climática é dinamizada. Agora torna-se possível especificar as relações entre as variações do Wurm-Winsconsin, por exemplo, com a distribuição do tecido florestal, a existência e a persistência de formas de relevo e depósitos correlativos em ambientes morfoclimáticos distintos ou mesmo contrastantes com as condições atuais. A partir deste modelo desenvolvido pelo geomorfólogos brasileiros, e com o uso de fotografias aéreas, a análise geomorfológica, agora não mais com o objetivo de buscar em que fase o relevo encaixava-se no ciclo davisiano, mas sim estabelecer as grandes superfícies de aplainamento, geradas pela coalescência de pedimentos e a idade a elas correlacionadas. É assim que Bigarella & Ab’Saber em 1961 irão produzir o trabalho “ As superfícies aplainadas do Primeiro Planalto do Paraná”, em que se busca claramente a correlação entre os níveis de aplainamento, os seus depósitos e as idade associadas. No final dos anos de 1960 a geomorfologia brasileira irá promover duas grandes revoluções com Aziz Ab’Saber. Primeiramente, fruto de uma longa reflexão e muita experiência em campo, Ab’Saber irá publicar em 1969 o clássico trabalho “ Um Conceito de Geomorfologia a Serviço das Pesquisas sobre o Quaternário”, um trabalho de cunho metodológico e que exerce influência nas pesquisas geomorfológicas até os dias atuais. Uma outra revolução é a noção domínios morfoclimáticos (Ab’Saber, 1967) de refúgios biogeográficos (1979) que não apenas revolucionou a geomorfologia climática no mundo, mas também a biogeografia. 42 Geografia: Ensino & Pesquisa ISSN 0103­1538 O RELEVO NO CONTEXTO DA PRODUÇÃO DO TERRITÓRIO. A década de 1970 é marcada pela integração autoritária (Becker & Egler, 1993), a técnica a serviço da concepção geopolítica de Território-Estado-Nação, é o momento da criação do Projeto RADAMBRASI, financiado pelo governo autoritário, objetivava o levantamento minucioso e em pequena escala dos recursos naturais do território brasileiro. É o momento em que as análises sobre o espaço natural, com o objetivo de localização de recursos e potencialização das regiões visando o rápido processo de acumulação capitalista em umnovo contexto da ordem econômicamundial. É também em 1972 com a Conferência de Estocolmo, que oficialmente nos damos conta da degradação ambiental e suas conseqüências na sociedade moderna. Problematiza-se a partir deste momento o papel da Ciência Moderna na geração destes problemas, ou seja, a sua relação com o capitalismo, com a definição do papel das técnicas e da tecnologia na geração não somente da degradação ambiental mas também na segregação social. Na década de 1970 a Geografia passava por forte impacto da Teoria Geral dos Sistemas que segundo Tricart (1965) possibilitou o aprofundamento analítico da geomorfologia pois permitiu relacionar mais estritamente as causas e os processos resultantes, levando com isto a estudos mais detalhados sobre a gênese do relevo. Neste momento, também sob impacto da Conferência de Estocolmo e fruto de trabalhos naAustrália, será produzido o livro La Ecogeografía y La Ordenacion del Medio Natural de Jean Tricart e Jean Kilian em 1979. Esta obra pode ser considerada o grande marco metodológico para os estudos ambientais nas mais variadas escalas territoriais, com grande destaque para o papel do relevo e de seus processos na degradação ambiental. No Brasil, o impacto será ainda maior, pois consonante a esta publicação, passávamos pelo RadamBrasil e onde Tricart será um personagem importante na constituição epistemológica e metodológica das equipes de trabalho, cujo marco metodológico será a publicação do livro Ecogeografia, realizada pelo autor, fruto de suas reflexões com as equipes do RadamBrasil. Consonante a esta necessidade desenvolve-se a cartografia, particularmente a geomorfológica, em que as unidades de relevo são utilizadas como base de definição territorial através da concepção de fragilidade, viabilizando à ação estatal tanto para o estabelecimento de colônias agrícolas no norte e centro-oeste brasileiro quanto os sítios de exploração mineral. É a fase de desenvolvimento do sensoriamento remoto, das análises geoquímicas, sedimentológicas e geológicas, com a definição de sítios metalogenéticos. Na biogeografia, desenvolve-se a concepção de geossistemas (Monteiro, 1978) ou seja, grandes unidades naturais, que apresentam uma homogeneidade, marcada pela interação entre clima, vegetação, solos, relevo e geologia, esta unidade, que passou a ser utilizada como sinônimo de paisagem, foi desenvolvida na Ex-União Soviética por geógrafos que trabalhavam com o planejamento estatal e cujo objetivo era estabelecer novas área urbanas e industrias no interior soviético. O referencial geossistêmico associado à cartografia geomorfológica permitiu a racionalização e a estratégia estatal no uso e controle do território brasileiro, quanto a exploração do espaço nacional. Em 1982 Adilson Avansi de Abreu, em sua tese de livre docência estabelece uma proposta de filogênese para se entender as escolas de geomorfologia no mundo e a partir daí reflete sobre o comportamento da geomorfologia brasileira frente a estas posturas interpretativas, destacando o trabalho de Aziz Ab’Saber e a sua forte participação na renovação da geomorfologia brasileira, com a incorporação e retrabalhamento das concepções da escola alemã de geomorfologia. Neste trabalho (Abreu, 1982) também foi discutido a questão metodológica de aquisição e tratamento dos dados geomorfológicos, como por exemplo, os critérios utilizados para a aquisição e classificação geomorfológica, que irão refletir a escola predominante na pesquisa geomorfológica. Emerge daí a questão da cartografia geomorfológica que se vinha trabalhando no Brasil e como a mesma não problematizava a questão da relação entre as forças endogenéticas e as exogenéticas em suas legendas e espacializações. Dessa reflexão e fruto de experiências vivenciadas no projeto RADAMBRASIL, Jurandyr Ross defenderá sua tese de doutoramento em 19 ---, que representa um significativo marco teórico e metodológico nos estudos das formas de relevo e na cartografia geomorfológica, indicando claramente uma filiação com os trabalhos vinculados à escola alemã de geomorfologia, na medida em que incorpora em suas reflexões e na cartografia geomorfológica os critérios de Demek, Mescerjakov, e em cujo eixo interpretativo faz-se segundo as premissas de Gregoriev. A tese de doutorado de Jurandyr Ross é um importante marco, pois abre real possibilidade da incorporação de uma nova forma de interpretação sobre a gênese do relevo brasileiro, que evoluirá para a publicação dos trabalho paradigmático que é a nova classificação do relevo brasileiro.(Ross, 1992).
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