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A Ideologia Alemã - Karl Marx, Friedrich Engels, Notas de estudo de Filosofia

Abordagem prática sobre a ideologia alemã

Tipologia: Notas de estudo

2013

Compartilhado em 03/12/2013

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Baixe A Ideologia Alemã - Karl Marx, Friedrich Engels e outras Notas de estudo em PDF para Filosofia, somente na Docsity! As ideias da classe dominante são, em todas as épocas, as ideias dominantes, ou seja, a classe que é o poder material dominante da sociedad piritual dominante. A classe que tem à sua disposição os meios ao mesmo tempo, o seu poder es- para a produção material dispõe assim, ao mesmo tempo, dos meios para a produção espiritual, pelo que lhe estão assim, ao mesmo tempo, submetidas em média as ideias daqueles a quem faltam os meios para a produção espiritual. As ideias dominantes não são mais do que a expressão ideal [ideell] das relações materiais dominantes, as relações materiais dominantes concebidas como ideias; portanto, das relações que precisamente tornam dominante uma classe, portanto as ideias do seu domínio. Os indivíduos que constituem a classe dominante também têm, entre outras coisas, consciência, e daí que pensem; na medida, portanto, em que dominam como classe e determinam todo o conteúdo de uma época histórica, é evidente que o fazem em toda a sua extensão, e portanto, entre outras coisas, dominam também como pen- sadores, como produtores de ideias, regulam a produção e a distribuição de ideias do seu tempo; que, portanto, as suas ideias são as ideias dominantes da época. JH EXPRESSÃO POPULAR KARL MARX - FRIEDRICH ENGELS A IDEOLOGIA ALEMà expressas POPULAR Kart Marx FriEDRICH ENGELS A IDEOLOGIA ALEMà 1º edição EDITORA EXPRESSÃO POPULAR São Paulo - 2009 À IDEOLOGIA ALEMà das Concepções Materialista e Idealista. (Nova edição do primeiro capítulo de À Ideologia Alemã), Moscou, 1966. Todos os títulos e interpolações acrescentados pelos editores vão entre colchetes, assim como os números das páginas do manuscrito. As folhas da primeira cópia a limpo, a principal, numeradas por Marx e Engels, são assinaladas com a letra “” e um número: [f. 1] etc. As páginas da primeira cópia a limpo não têm numeração do autor e são as- sinaladas com a letra “p? e um número: [p. 1] etc. As páginas das três partes em rascunho do manuscrito, numeradas por Marx, são assinaladas com um simples número: [1] etc. Os termos que foram utilizados em outra línguas no texto original, que não o alemão, foram mantidos como tal seguidos pela sua tradução entre colchetes. As notas de rodapé inseridas pela edição portuguesa estão assinaladas no texto como (N.E.); as que foram inseridas para a edição brasileira estão assinaladas por (N.E.B.); as que não estão assinaladas são notas do original alemão que serviu de base para a tradução da obra. INTRODUÇÃO Texto e contexto A Aideologia alemá é uma obra escrita por K. Marxe F. Engels nos anos de 1845-1846. Sem dúvida, a mais importante no que se refere à elaboração dos fundamentos de uma nova concepção de história. Para entender o significado mais profundo dessa obra é preciso compreender o momento histórico-social em que ela foi escrita e, ao mesmo tempo, o momento na trajetória intelectual dos seus autores. Como se sabe, Marx e Engels viveram no século 19, que teve uma importância extraordinária na história da humanidade. É nesse momento, na virada do século 18 para o século 19, que a sociedade burguesa chega ao seu pleno florescimento. Esse flores- cimento é o resultado de um conjunto de transformações — eco- nômicas, políticas, sociais, ideológicas, culturais — impulsionadas pela dinâmica do capital, que a levaram a se tornar plenamente madura, vale dizer, plenamente social. Essa maturidade significava que, nesse momento, a sociedade atingiu uma forma que a distin- guia claramente da natureza, embora mantendo sua vinculação insuperável com ela. A realidade social se torna plenamente social. É isso que permite que ela possa ser conhecida em sua legalidade própria, ou seja, como algo que é produzido pela atividade humana e não por forças naturais ou sobrenaturais. Por outro lado, a sociedade burguesa, por ser baseada numa forma de exploração do homem pelo homem que mistifica as A IDEOLOGIA ALEMà relações sociais, também oculta a sua verdadeira natureza. Ao transformar as relações sociais em relações entre coisas, faz com que essas relações apareçam como se fossem naturais. Como consequência, as relações de exploração não aparecem como produtos da atividade humana, mas como algo que independe dos homens. A completude da revolução burguesa também tem outra con- sequência importante. Juntamente com a classe burguesa, também adentra o cenário histórico uma outra classe, que terá uma im- portância fundamental para o futuro da humanidade — trata-se da classe proletária. Pela primeira vez na história da humanidade, não só a classe dominante, mas também a classe dominada abre uma perspectiva para toda a humanidade. Esta, classe dominada, por sua vez, é também a primeira classe social que exige, por sua própria natureza, a superação radical da exploração do homem pelo homem. Mas, para isso, ela precisa de um tipo de saber, de um conhecimento da realidade social, de uma concepção de mundo radicalmente diferente daqueles que orientavam a construção da sociedade burguesa, Esse novo tipo de saber era absolutamente necessário para que ela pudesse orientar a sua luta pela construção dessa nova forma de sociabilidade. Ora, a elaboração desse novo tipo de saber implicava a crítica do modo dominante de pensar e a elaboração de novos e diferentes fundamentos para a compreenção da realidade social. O modo de pensar tradicional era marcado pelo idealismo e pelo empirismo. Segundo o idealismo, é a atividade intelectual que cria a realida- de social. O empirismo, por sua vez, simplesmente narra os fatos como eles se apresentam de modo imediato. Esse modo de pensar falseia, embora de modo não intencionalmente, o conhecimento da realidade social, contribuindo, assim, para reproduzi-la segundo os interesses das classes dominantes. É esse conjunto de circunstâncias que permite entender o sur- gimento das ideias que estão expressas nesta obra. Kart MARX Mas também é fundamental compreender o momento da trajetória intelectual dos autores para entender o significado de A ideologia alemã. Essa nova concepção de mundo, por ser radi- calmente nova e não simplesmente o conhecimento de um tema parcial, implicou um processo de busca intensa, de mudanças profundas, de desbravamento de um terreno completamente des- conhecido. Implicou também a passagem dos próprios autores de uma concepção ainda marcada pelo idealismo para uma concepção materialista. Contudo, também não se tratava de um materialismo mecanicista, mas, sim, de caráter histórico, social e dialético. Essa transição, do idealismo ao materialismo, se deu ao longo de alguns anos, mais precisamente de 1837 a 1846, com uma in- flexão significativa nos anos de 1843-1844. O ponto culminante da elaboração dos fundamentos dessa nova concepção se encontra precisamente nesta obra chamada A ideologia alemã. Nela, Marx e Engels fazem uma crítica de alguns autores alemães, que expres- savam a maneira idealista de pensar, e esboçam os fundamentos da concepção materialista da história. Como Marx mesmo adverte, este texto foi escrito como um meio de passar a limpo os fundamentos dessa nova maneira de pensar, que para ele e Engels haviam ficado claros ao longo desses anos. Dificuldades surgidas na publicação desse trabalho fizeram com que ele fosse deixado de lado e nem sequer recebesse uma forma final apropriada. Como Marx conta no “Prefácio” da Contribuição à crítica da Economia Política, em 1859, eles abandonaram o manuscrito à “crítica roedora dos ratos”, já que haviam atingido o seu objetivo que era o de ver com clareza esses novos ftindamentos. Felizmente, os ratos foram “camaradas” e não se interessaram por esse texto, o que nos permite, hoje, ter acesso a essa precio- sidade que são os fundamentos dessa nova forma de entender a realidade social. Contudo, é preciso ter sempre em mente que este texto é um manuscrito, que não recebeu uma forma final para publicação. n A CIDEOLOGIA ALEMà Trata-se, portanto, de um esboço. Suas ideias centrais permane- cerão inteiramente válidas, mas algumas delas sofrerão correções e aprofundamentos em obras posteriores. Além disso, o escrito de 1845-1846 permaneceu durante muitos anos desconhecido, somente sendo redescoberto e publicado em 1932, pelo Instituto de Marxismo-Leninismo de Moscou. Ao longo desse tempo, páginas foram perdidas e outras se deterioraram, dificultando enormemente a sua ordenação e compreensão. Além do mais, tratava-se — especialmente na primeira parte, referente a Feuerbach, em que aparecem mais claramente os fundamentos da concepção materialista da história — de um trabalho inacabado, cheio de interrupções, lacunas, correções e rasuras. Vale lembrar que toda obra, de qualquer autor, deve ser lida, sempre, com espírito crítico. Mais ainda quando se trata de uma obra como esta, que não recebeu de seus autores uma forma definitiva. Ideias fundamentais Nada disso diminui a importância desta obra. Não obstante as ponderações feitas acima, os elementos fundamentais dessa concepção de mundo radicalmente nova estão claramente visíveis. Poder-se-ia dizer que essa concepção está resumida na frase, pre- sente nesta obra, em que eles afirmam que “Não é a consciência que determina a vida, é a vida que determina a consciência”. Vale dizer, não são as ideias, os produros da consciência que constituem o fundamento, a marriz da realidade social. São as relações mate- riais, concretas, que os homens estabelecem entre si que explicam as ideias e as instituições que eles criam. Por isso mesmo, para se ter uma compreensão adequada da realidade, não se pode nem partir nem permanecer no mundo das ideias. É preciso buscar a conexão do que elas têm com a realidade objetiva. Só essa conexão permitirá entender o que os homens pensam, por que pensam desse modo e também as ideias errôneas que eles criam a seu respeito. Criticando os pensadores alemães, Marx e Engels afirmam: 12 KARL MARX A nenhum desses filósofos acorteu perguntar qual era a conexão entre à filosofia alemã e a realidade alemã, a conexão entre a sua crítica e o seu próprio meio material. Por isso mesmo, enfatizam eles, o ponto de partida para compreen- der a história deve ser concrero, real, objetivo: Os pressupostos de que partimos não são arbitrários, nem dogmas. São pressupostos reais de que não se pode fazer abstração a não ser na ima- ginação. São os indivíduos reais, sua ação e suas condições materiais de vida, tanto aquelas por eles já encontradas, quanto as produzidas por sua própria ação. Esses pressupostos são, pois, verificáveis por via puramente empírica. Deve-se, pois, partir daquelas atividades básicas, sem as quais é impossível a continuidade da existência humana. Esse ponto de partida não é uma escolha arbitrária. É uma exigência do processo real. Os autores enfatizam: -.. somos forçados a começar constatando que o primeiro pressuposto de toda a existência humana, e, portanto, de toda a história, é que os homens devem estar em condições de viver para poder “fazer história”, Mas, para viver, é preciso, antes de tudo, comer, beber, ter habitação, vestir-se e algumas coisas mais. Vale dizer, para viver é preciso produzir os bens necessários à existência. Isso é trabalho, ou seja, uma transformação intencional da natureza, Essa transformação intencional, por sua vez, implica a fabricação de instrumentos necessários a essa tarefa, mas é im- portante observar que, ao transformar a natureza, os homens não produzem apenas os bens materiais necessários à sua existência, mas também a si mesmos e as suas relações sociais. Por isso os homens são radicalmente históricos e radicalmente sociais, isto é, são eles que se criam inteiramente a si mesmos e a toda a realidade social, através da atividade coletiva. O trabalho, portanto, e não as ideias, aparece aquí como o fundamento da vida social. É ele a única categoria que faz a me- diação entre os homens e a natureza. Todo o processo histórico 13 (INTRODUÇÃO) mM [E 1] Segundo anunciam ideólogos alemães, a Alemanha passou nos últimos anos por uma revolução sem paralelo. O processo de de- composição do sistema de Hegel, iniciado com Strauss, transformou- sé numa fermentação universal para a qual são arrastados todos os “poderes do passado”, No caos geral, poderosos impérios se formaram pata logo de novo ruírem, emergiram momentaneamente heróis para serem de novo remetidos para a obscuridade por tívais ousados e mais poderosos. Foi uma revolução ao pé da qual a Revolução Francesa? é uma brincadeira de crianças; uma lura universal face à qual as lutas dos Diádocos* parecem mesquinhas. Os princípios expulsaram-se uns aos outros, os heróis do pensamento derrubaram-se uns aos outros com uma pressa inaudita, e nos três anos entre 1842, e 1845 varreu-se mais do passado na Alemanha do que anteriormente em três séculos. “Tudo isso teria ocorrido no pensamento puro. Trata-se, por certo, de um acontecimento interessante: do processo de putrefação do es- pírito absoluto. Depois de extinta a última centelha de vida, as várias * Trata-se da obra fundamenta! de D. E. Strauss 4 vida de Jesus (D. F. Strauss, Das Leben Jesus, Bd. 1-2, Tiúbingen, 1835-1836), que marcou o início da crítica filosófica da religião e da divisão da escola hegeliana em velhos hegelianos « jovens hegelianos. (N.E.) Trata-se da revolução burguesa francesa de fins do século 18. (N.E)) Diádocos: generais de Alexandre Magno que, após a sua morte, iniciaram uma aguda lua entre si pela conquista do poder. No decurso dessa luta (fim do século é e início do século 3 antes da nossa ra) a monarquia de Alexandre, que constituía em si mesma uma união militar-administrativa sem solidez, dividiu-se numa série de Estados separados. (N.E.) A IDEOLOGIA ALEMà partes constitutivas deste caput mortuzm entraram em decomposição, estabeleceram novas combinações e formaram novas substâncias. Os industriais da filosofia, que até aí haviam vivido da exploração do espí- rito absoluto, lançaram-se agora sobre as novas combinações. Cada um procedeu, com o maior zelo possível, à venda e ao desbarato do quinhão que lhe coubera, Isso não podia se dar bem sem concorrência. Essa foi inicialmente conduzida de um modo bastante burguês e respeitável. Mais tarde, quando o mercado alemão estava saturado e a mercado- ria, a despeito de todos os esforços, não encontrava acolhimento no mercado mundial, o negócio se deteriorou à maneira habitual na Ale- manha — pela produção em grande escala e fictícia, pela deterioração da qualidade, pela adulteração da matéria-prima, pela falsificação dos rótulos, por compras fictícias, por especulações fraudulentas no saque de lerras e por um sistema de crédito destituído de qualquer base real. A concorrência acabou numa luta encarniçada que agora nos é exaltada e apresentada como uma mudança de importância histórica, como geradora dos resultados e conquistas mais prodigiosos. Para apreciar corretamente essa charlatanice filosófica, que até no peito do cidadão alemão honesto desperta um grato sentimento nacional, para dar bem a ideia da mesquinhez, da tacanhez provin- ciana de todo esse movimento jovem-hegeliano, nomeadamente do contraste tragicômico entre os verdadeiros feitos desses heróis e as ilusões sobre esses feitos, é necessário observar todo o espetáculo de um ponto de vista exterior à Alemanha 4 Literalmente: cabeça morta; termo usado na química para o resíduo que fica da destilação; aqui: restos, resíduos. [No manuscrito foi riscado a passagem seguinte:] [p. 2] Por isso fazemos preceder a crítica específica de cada um dos representantes desse movimento de algumas observações gerais. (Essas observações bastarão para indicar o ponto de vista da nossa crítica tanto quanto é necessário para a compreensão e a fundamentação das críticas individuais subsequentes. Contrapomos essas observações [p. 3] precisamente a Feuerbach por ser ele o único que pelo menos fez algum progresso, e em cujas obras se pode entrar de bonne fai [de boa fé — Francês] (O texto traduzido entre parênteses encontra-se riscado horizontalmente no manuscrito), as quais iluminarão mais de perto os pressupostos ideológicos comuns a todos eles. 1. A ideologia em geral, e a filosofia alemã em especial. 2 Kant MARX [L.] A ideologia em geral e a alemã em particular [£2] A crítica alemã não abandonou, até os seus esforços mais recentes, o terreno da filosofia. Longe de examinar as suas premissas filosóficas gerais, as suas questões saíram todas do terreno de um sistema filosófico determinado, o de Hegel. Não apenas nas suas respostas, mas já nas próprias questões estava uma mistificação. Essa dependência de Hegel é a razão pela qual nenhum desses críticos mais recentes tentou sequer uma crítica ampla do sistema de Hegel, por mais que cada um deles afirme estar para além de Hegel. A sua polêmica contra Hegel, e entre si, reduz-se ao fato de cada um deles ter chamado a si uma faceta do sistema de Hegel e tê-la virado tanto contra todo o sistema quanto contra as facetas reclamadas pelos outros. Em princípio chamavam a si categorias puras de Hegel, não falsificadas, como substância e consciência de si, mas posteriormente profanaram essas categorias com nomes mais mundanos, como espécie [Gaztungl, o Único, o Homem” etc. Toda a crítica filosófica alemã de Strauss a Stirner se reduz à crítica de representações religiosas? Partiu-se da religião real e da autêntica teologia. O que são consciência religiosa e representa- ção religiosa foi posteriormente definido de maneiras diversas. O progresso consistiu em subsumir [szbsumieren] as representações metafísicas, políticas, jurídicas, morais e outras, pretensamente Conhecemos apenas uma única ciência, a ciência da história. A história pode ser conside- rada de dois lados, dividida em história da natureza e história dos homens. No entanto, esses dois aspectos não podem se separar; enquanto existirem homens, a história da narureza e a história dos homens condicionam-se mutuamente, À história da natureza, a chamada ciência da natureza, não é a que aqui nos interessa; na história dos homens, porém, teremos de entrar, visto que quase toda à ideologia se reduz ou a uma concepção deturpada dessa história ou a uma completa abstração dela. A ideologia é, ela mesma, apenas um dos aspectos dessa história. £Ascategorias básicas de David Strauss « Bruno Bauer. 7 As categorias básicas de Ludwig Feuerbach e Max Stirner. [No manuscrito encontra-se riscada a passagem seguinte; (..) que surgiu reclamando pata sia qualidade de redentora absoluta do mundo de todo o mal. À religião foi conti- nuamente considerada e tratada como a causa última de todas as relações repugnantes a estes filósofos, como o arqui-inimigo. a À IDEOLOGIA ALEMÁ dominantes, também na esfera das representações religiosas ou teológicas; e, do mesmo modo, em explicar a consciência política, jurídica e moral como consciência religiosa ou teológica, e o ho- mem político, jurídico e moral em última instância, “a Homem” — como religioso. Pressupunha-se o domínio da religião. Gradual- mente, cada relação dominante foi explicada como uma relação da religião e transformada em culto: culto do direito, culto do Estado etc. Por toda a parte se lidava apenas com dogmas e com a fé em dogmas. O mundo foi canonizado numa medida sempre crescente, até que por fim o venerável São Max” o pôde declarar santificado en bloc [em bloco — francês], e desse modo despachá-lo de uma vez por todas. Os velhos-hegelianos tinham a tudo compreendido, com a con- dição de tudo ser reduzido a uma categoria lógica de Hegel. Os jovens-hegelianos a tudo criticaram, porém subscrevendo (gnters- choben) tudo como representações religiosas ou declarando-o teo- lógico. Os jovens-hegelianos concordam com os velhos-hegelianos na crença no domínio da religião, dos conceitos, do universal no mundo existente. Só que uns combatem o domínio como usut- pação, e outros o celebram como legítimo. Como para os jovens-hegelianos as representações, ideias, con- ceitos, em geral os produtos da consciência (por eles autonomizada) têm o valor de autênticos grilhões dos homens; como, do mesmo modo, para os velhos-hegelianos significam os verdadeiros elos da sociedade humana, percebe-se que os jovens-hegelianos também só tenham de lutar contra essas ilusões da consciência. Segundo a sua fantasia, as relações dos homens, tudo o que os homens fazem, os seus grilhões e barreiras, são produtos da sua consciência, assim os jovens-hegelianos, de modo consequente, colocam aos homens o postulado moral de trocarem a sua consciência presente pela * Max Stirner. 2 KARL MARX consciência humana, crítica ou egoísta,!º e, desse modo, de elimi- narem as suas barreiras. Essa exigência de mudar a consciência conduz à exigência de interpretar de outro modo o que existe, ou seja, de o reconhecer por meio de outra interpretação. Os ideólogos jovens-hegelianos são, apesar das frases com que pretendem “aba- lar o mundo”; os maiores conservadores. Os mais novos dentre eles encontraram a expressão correta para a sua atividade quando afirmam que lutam apenas contra “ frases”. Esquecem, apenas, que a essas mesmas frases nada opõem senão frases, e que de modo algum combatem o mundo real existente se combaterem apenas as frases deste mundo. Os únicos resultados a que essa crítica filosófica pôde conduzir foram alguns esclarecimentos, e ainda por cima unilarerais, de história da religião, sobre o cristianismo; todas as suas demais afirmações são apenas outros tantos adornos para a sua pretensão de haverem proporcionado, com esses esclarecimentos insignificantes, descobertas de importância histórica e universal. Não ocorreu a nenhum desses filósofos procurar a conexão da filosofia alemã com a realidade alemá, a conexão da sua crítica com o seu próprio ambiente material.” [2. Premissas da concepção materialista da história] [p. 3] As premissas com que começamos não são arbitrárias, não são dogmas, são premissas reais, e delas só na imaginação se pode abstrair. São os indivíduos reais, a sua ação e as suas condições materiais de vida, tanto as que encontraram quanto as que produ- Referência respectivamente a Ludwig Feuerbach, Bruno Bauer e Max Stirner. Pensamentos que fazem abalar o mundo: expressão de um artigo anônimo da revista Wigand': Vierteliabrssebrifi de 1845, £. IV, p. 327. Wigand's Vierteljabrsschrifi (Revisa Trimestral de Wigand): tevista Blosófica dos jovens hegelianos; foi editada por O. Wigand em Leipeig em 1844 e 1845, Colaboravam na revista B. Baucr, M. Stirner, L. Feuerbach coutros. (N.E) A seguir, no manuscrito da versão principal do texto passado a limpo, 0 resto da página está em branco. O cexto da página seguinte vem reproduzido neste volume como |, 3. O texto desta seção é extraído da primeira versão da cópia passada a limpo. õ A JPEOLOGIA ALEMà começou muito cedo (prova: a lei agrária liciniana)* e se processou muito rapidamente desde as guerras civis e sob os imperadores; por outro lado, e em conexão com isso, a transformação dos pequenos camponeses plebeus num proletariado, o qual, porém, dada a sua posição média entre os cidadãos possuidores e os escravos, não conseguiu um desenvolvimento autônomo. A terceira forma é a propriedade feudal, ou de Estados [ou ordens sociais — stindische]. Se a Antiguidade partiu da cidade e da sua pequena área, a Idade Média partiu do campo. A população ao tempo existente, pouco densa e dispersa por uma grande área, e que não cresceu grandemente com os conquistadores, condicionou esse ponto de partida diferente. Em contraste com Grécia e Roma, o desenvolvimento feudal começa, por isso, num território muito mais extenso, preparado pelas conquistas romanas e pela expansão da agricultura a elas inicialmente ligada. Os úlrimos séculos do império romano em declínio e a conquista pelos próprios bárbaros destruíram grande quantidade de forças produtivas; a agricultura afundara-se, a indústria declinara por falta de mercado, o comércio adormecera ou fora violentamente interrompido, a população rural e urbana decrescera. Essas condições ao tempo existentes e o modo de organização da conquista por elas condicionado desenvolveram, sob a influência da organização militar germânica, a propriedade feudal. Esta se baseia, tal como a propriedade tribal e comunal, novamente sobre uma comunidade [Gemeinwesen] face à qual se encontram, não como face à antiga os escravos, mas os pequenos camponeses servos como classe produtora direta (unmistelbar produzierende Klasse). Ao mesmo tempo, com a completa formação do feudalismo, surge também a oposição às cidades. A estrutura hierárquica da proprie- dade fundiária e os vassalos armados (bewaffneten Gefolgschafien) a ela ligados deram à nobreza o poder sobre os servos. Essa estrutura * A lei agrária dos tribunos populares romanos Licinius e Sextius, adotada no ano de 367 antes da nossa era, proibia os cidadãos romanos de possuírem mais de 500 jeiras (cerca de 125 hectares) de terra do fundo público de terras (ager publicus). (N.E.) 28 KARL MARX feudal era, do mesmo modo que a antiga propriedade comunal, uma associação face à classe produtora dominada; só que a forma de associação e a relação com os produtores diretos era diferente, porque existiam diferentes condições de produção. À essa estrutura feudal da propriedade fundiária correspondia, nas cidades, a propriedade corporativa, a organização feudal dos oft- cios. A propriedade consistia [f. 4] aqui principalmente no trabalho de cada indivíduo. A necessidade da associação contra a rapina da nobreza associada, a carência de mercados cobertos comuns num tempo em que o industrial era simultaneamente comerciante, a concorrência crescente dos servos fugitivos que confluíam para as cidades florescentes e a estrutura feudal de todo o país deram origem às corporações; os pequenos capitais gradualmente economizados de artesãos individuais e o múmero estável destes na população cres- cente desenvolveram a relação de oficial e aprendiz, que originou nas cidades uma hierarquia semelhante à do campo. A propriedade principal consistiu assim, durante a época feudal, a e no trabalho do servo a ela por um lado, na propriedade fund; preso, e, por outro, no trabalho próprio com um pequeno capital a dominar o trabalho dos oficiais. A estrutura de um e outro estava condicionada pelas relações de produção [Produktionsverháilinisse) limitadas — a pequena cultura agrícola rudimentar e a indústria artesanal. Pouca foi a divisão do trabalho que teve lugar no apogeu do feudalismo. Cada país tinha em si a oposição de cidade e cam- po; a estrutura de Estados [ou ordens sociais] era certamente muito marcada, mas além da diferenciação de príncipes, nobreza, clero e camponeses, no campo, e de mestres, oficiais e aprendizes, e em breve também a plebe de jornaleiros, nas cidades, não teve lugar nenhuma divisão importante, Na agricultura, era dificultada pela cultura parcelada, a par da qual surgia a indústria caseira dos próprios camponeses; na indústria, o trabalho não era dividido sequer no interior de cada um dos ofícios, e muito pouco entre eles. A divisão de indústria e comércio encontrava-se já em cidades mais antigas, 22 A IDEOLOGIA ALEMà mas só mais tarde se desenvolveu nas mais novas, na medida em que as cidades entraram em relação umas com as outras. A reunião de territórios maiores em reinos feudais era uma necessidade tanto para a nobreza latifundiária quanto para as cidades. A organização da classe dominante, a nobreza, tinha por isso, em toda a parte, um monarca à frente” [4. A essência da concepção materialista da história. Ser social e consciência social] . [5] O fato é, portanto, este: o de determinados indivíduos, que são produtivamente ativos de determinado modo? [auf bestimmie Weise produltiv tátig sind], entrarem em determinadas relações sociais e políticas. A observação empírica tem de mostrar, em cada um dos casos, empiricamente e sem qualquer mistificação e espe- culação, a conexão da estrutura social e política com a produção. A estrutura social e o Estado decorrem constantemente do processo de vida de determinados indivíduos; mas desses indivíduos, não como eles poderão parecer na sua própria representação ou na de outros, mas como eles são realmente, ou seja, como agem, como produzem material, realmente, como atuam [tásig], portanto, em determinados limites, premissas e condições mareriais que não dependem da sua vontade. % A seguir, no manuscrito, o resto da página ficou em branco. Na página seguinte começa o sumário da concepção materialista da história. A quarta forma de propriedade, a burguesa, é tratada na Parte IV do capítulo, Seções 2-4. [Versão original:) determinados indivíduos em determinadas relações de produção. [No manuscrito encontra-se riscada a passagem seguinte:] As representações [Vorstellngen] que esses indivíduos formam são representações ou da sua relação com a natureza ou da sua relação uns com os outros, ou sobre a sua própria natureza. É evidente que em todos esses casos essas representações são a expressão consciente — real ou ilusória — das suas relações e atividades reais, da sua produção, do seu intercâmbio, da sua organização social e política. A suposição oposta só é possível quando se pressupõe, além do espírito dos indivíduos reais e materialmente condicionados, ainda um espírito à parte. Se a expressão consciente das relações reais desses indivíduos é ilusória, eles nas suas representações colocam a realidade de cabeça para baixo, e isso por sua vez é uma consequência do seu modo de trabalho material limitado e das relações sociais limitadas que dele resultam. 30 Kari MARX A produção das ideias, das representações, da consciência está em princípio diretamente entrelaçada com a atividade material e o intercâmbio material dos homens, linguagem da vida real. O representar, o pensar, o intercâmbio espiritual dos homens apa- rece aqui ainda como direta exsudação [direkter Ausfluf?) do seu comportamento material. O mesmo se aplica à produção espiritual como ela se apresenta na linguagem da política, das leis, da moral, da religião, da metafísica etc., de um povo. Os homens são os pro- dutores das suas representações, ideias erc., mas os homens reais, os homens que realizam [die wirklichen, wirkenden Menschenl, tal como se encontram condicionados por um determinado desen- volvimento das suas forças produtivas e pelas relações [Verkebrs] que a estas corresponde até as suas formações mais avançadas.“ A consciência [das Bewusstsein], nunca pode ser outra coisa senão o ser consciente [das bewusste Sein], e o ser dos homens é o seu processo real de vida. Se em toda a ideologia os homens e as suas relações aparecem de cabeça para baixo como numa câmera escura, é porque esse fenômeno deriva do seu processo histórico de vida da mesma maneira que a inversão dos objetos na retina deriva do seu processo diretamente físico de vida. Em completa oposição à filosofia alemá, a qual desce do céu à terra, aqui sobe-se da terra ao céu. Isto é, não se parte daquilo que os homens dizem, imaginam ou se representam, e também não dos homens narrados, pensados, imaginados, representados, para daí se chegar aos homens em carne e osso; parte-se dos homens realmente ativos, e com base no seu processo real de vida apresenta-se também o desenvolvimento dos reflexos [Reflexe] e ecos ideológicos desse processo de vida. Também as fantasmagorias [Nebelbildungen] no cérebro dos homens são sublimações necessárias do seu processo a [Versão original) Os homens são os produtores das suas representações, ideias etc., e precisamente os homens condicionados pelo modo de produção da sua vida material, pelo seu intercâmbio material e o seu desenvolvimento posterior na estrutura social € política. a À IDEOLOGIA ALEMà de vida material empiricamente constatável e ligado a premissas materiais. A moral, a religião, a metafísica, e toda outra Eonstige] ideologia, e as formas da consciência que lhes correspondem, não conservam assim por mais tempo a aparência de autonomia [Selbstândigkeir). Não têm história, não têm desenvolvimento, são os homens que desenvolvem a sua produção material e o seu intercâmbio material que, ao mudarem essa sua realidade, mudam também o seu pensamento e os produtos do seu pensamento. Não é a consciência que determina a vida, é a vida que determina a consciência. No primeiro modo de consideração, parte-se da consciência como indivíduo vivo. No segundo, que corresponde à vida real, parte-se dos próprios indivíduos vivos reais e considera-se a consciência apenas como a sua consciência. Esse modo de consideração não é destituído de pressupostos. Parte dos pressupostos reais e nem por um momento os abandona. Os seus pressupostos são os homens, não num qualquer isolamento e fixidez fantásticos, mas no seu processo, perceptível empiricamen- te, de desenvolvimento real e sob determinadas condições. Assim que esse processo de vida ativo é apresentado, a história deixa de ser uma coleção de fatos mortos — como é para os empiristas, eles próprios ainda abstratos —, ou uma ação imaginada de sujeitos imaginados, como para os idealistas. Lá onde a especulação cessa, na vida real, começa, portanto, a ciência real, positiva, a descrição [Darstellung) da atividade prática, do processo de desenvolvimento prático dos homens. Terminam as frases sobre a consciência, o saber real tem de as substituir. Com a descrição [Darstellung] da realidade, a filosofia autônoma perde o seu meio de existência. Em seu lugar pode, quando muito, surgir uma súmula [Zusammenfassung] dos resultados mais gerais que é possível abstrair da observação do desenvolvimento histórico. Essas abstrações por si não têm, separadas da história real, o menor valor. Só podem servir para facilitar a ordenação do material histórico, para indicar a sequência de cada um dos seus estratos. Mas não a Kant Marx dão, de modo algum, como a filosofia, uma receita ou um esque- ma segundo o qual as épocas históricas possam ser classificadas Izurechtgestutzt]. A dificuldade começa ao contrário, precisamente quando nos damos à observação e ordenação do material, seja de uma época passada, seja do presente, quando passamos à descrição [Darstellung] real. A eliminação dessas dificuldades está condicio- nada por premissas que de modo algum podem ser aqui dadas, e que só resultarão [claras] no estudo do processo real da vida e da ação dos indivíduos de cada época. Tomaremos aqui algumas dessas abstrações, as quais contraporemos à ideologia, e vamos explicá-las com exemplos históricos.” 2 A versão principal (a segunda) da cópia passada a limpo termina aqui. Este volume vai continuar com três partes do manuscrito original. 33 A IDEOLOGIA ALEMà histórica e uma história natural), da qual saíram todas as “obras imperscrutavelmente elevadas”** sobre “substância” e “consciência de si”, desfaz-se por si própria com a compreensão de que a cele- brada “unidade do homem com a natureza” desde sempre existiu na indústria e existiu em todas as épocas de formas diferentes, segundo o menor ou maior desenvolvimento da indústria, tal como a “luta” do homem com a natureza, até o desenvolvimento das suas forças produtivas numa base correspondente. A indústria e o comércio, a produção e a troca das necessidades da vida, por um lado, exigem [bedingen) e, por outro, são requeridos [bedingil, no modo como se processam, pela distribuição, pela articulação das diferentes classes sociais; e assim acontece que Feuerbach, em Manchester, por exemplo, só vê fábricas e máquinas onde há um século se viam apenas rodas de fiar e teares, ou na Campagne di Roma só descobre pastagens e pântanos onde no tempo de Augusto nada teria encontrado a não ser vinhedos e vilas de capitalistas ro- manos. Feuerbach fala em especial da observação [Anschawung] da ciência da natureza, menciona segredos que apenas se revelam aos olhos do físico e do químico; mas, sem a indústria e o comércio, onde estaria à ciência da natureza? Mesmo essa ciência “pura” da natureza só alcança o seu objetivo, bem como o seu material, por meio do comércio e da indústria, por meio da atividade sensível dos homens. E de ral modo essa atividade, esse trabalho e essa criação sensíveis contínuos e essa produção são a base de todo o mundo sensível como ele agora existe, que, se fossem interrompidos ao me- nos um ano, Feuerbach não só encontraria uma enorme mudança no mundo natural como muito em breve daria pela falta de todo o mundo dos homens e da sua própria faculdade de observação [Anschauungvermôgen] — mais, da sua própria existência. É certo que, no meio de tudo isso, se mantém a prioridade da natureza exterior, e é certo que tudo isso não tem qualquer aplicação aos * Goethe, Fausto, “Prólogo no céu”, 38 Kari MARX homens originais, produzidos por generatio aequivoca [geração espontânea — latim]; mas essa diferenciação só tem sentido na medida em que se considera o homem como sendo diferente da natureza. De resto, essa natureza que precedeu a história huma- na não é, de modo algum, a natureza em que Feuerbach vive, é a natureza que hoje em dia, à exceção talvez de uma ou outra ilha de coral australiana de origem recente, em parte alguma existe, e que portanto também não existe para Feuerbach. Feuerbach tem, no entanto, [10] sobre os materialistas “puros”, a grande vantagem de compreender que também o homem é “objeto sensível”; mas, à parte o fato de entender o homem apenas como “objeto sensível”, e não como “atividade sensível”, como também aqui se mantém na teoria, e não concebe os homens na sua cone- xão social dada, nas suas condições de vida existentes que fizeram deles aquilo que são, nunca chega aos homens ativos, realmente existentes, permanecendo na abstração “o Homem”, e só consegue reconhecer o “homem corpóreo, individual, real” no sentimento, ou seja, não conhece outras “relações humanas” “do homem com o homem” além de amor e amizade, e mesmo assim idealizados. Não faz nenhuma crítica às condições de vida [Lebensverháilinisse) atuais. Nunca chega, portanto, a conceber o mundo sensível como a totalidade da atividade sensível viva dos indivíduos que o consti- tuem, e é por isso obrigado — quando vê, por exemplo, em vez de homens saudáveis, uma rurba de famélicos escrofulosos, esgotados pelo excesso de trabalho e tuberculosos — a buscar o seu refúgio na “concepção [Anschauung] superior” e na “igualização” superior Em alemão: Alles eine Amwendung auf die urspringlichen, durch generario acquivoca erzeugten Menschens aber diese Unterscheidung bar nur insofern Sinm, als man den Men- seben als von der Natur unterscbieden besrachter. Erase de dificil rradução. Uma possível interpretação é que apenas após a separação do ser social em relação à natureza, pelo surgimento do trabalho, à categoria fundante do ser social, essa afirmação faria sentido. Antes dessa distinção do mundo dos homens e da natureza, os “homens originais”, “Produzidos por generatio aequivoca”, eram partes integrantes do mundo natural, não eram ainda seres humanos. (N.E.B.) A IDEOLOGIA ALEMà “no gênero”,% e portanto a recair no idealismo precisamente onde o materialista comunista vê a necessidade e, ao mesmo tempo, a condição de uma transformação tanto da indústria quanto da estrutura social. Como materialista, para Feuerbach a história não conta; € quando considera a história não é materialista. Para ele, materia- lismo e história divergem completamente, o que de resto se explica pelo que ficou dito.” [B. Relações históricas primordiais, ou os aspectos básicos da atividade social: produção dos meios de subsistência, produção de novas necessidades, reprodução das pessoas (a família), intercâmbio social, consciência] [11]* Com os alemães, que não partem de qualquer pressuposto [voraussetzungslosen], temos de começar por constatar 0 primeiro pressuposto de toda a existência humana, e portanto, também, de toda a história, a saber, o pressuposto de que os homens têm de estar em condições de viver para poderem “fazer história”. Mas da vida fazem parte sobretudo comer e beber, habitação, vestuário e ainda algumas outras coisas. O primeiro ato histórico é, portanto, a pro- ** No alemão: “zur ideellen Ausglei-chung in der Gustung”. Gattung é um termo de difícil tradução. Indica a máxima universalidade, por isso muitas vezes é traduzido por espécie (por exemplo, espécie humana) e, outras vezes, por gênero humano. Ourras vezes tem-se criado neologismos para eraduzi-lo, por exemplo, generidade ou genericidade quanto se trata de Gartungmaffigheis. (N.E.B) [No manuscrito encontra-se riscada a passagem seguinte:] Se aqui, porém, entramos mais na história, isso deve-se ao fato de os alemães estarem habituados a imaginar por “história” e “histórico” tudo o que é possível, mas não o que é real, e disso nos dá um exemplo brilhante nomeadamente o São Bruno com a sua “eloquência do púlpito”. INota marginal de Marx:] História. No tomo 3 dos Marx/Engels, Werke, Dietz Verlag, Berlim, 1969, p. 28, esse parágrafo vem precedido do subrítulo [7] Geschichte (História), e segue-se imediatamente ao parágrafo com que termina a versão principal (a segunda) da cópia passada a limpo. (N.E.) » CEcap.I1,8. [Nota marginal de Marxi] Hegel . Condições geológicas, hidrográficas etc. Os corpos humanos. Necessidade, trabalho. [Ver Hegel, Filosofia da história, Introdução, Base Geográfica da História Mundial.) “o KARL MARX dução dos meios para a satisfação dessas necessidades, a produção da própria vida material, e a verdade é que esse é um ato histórico, uma condição fundamental de toda a história, que ainda hoje, tal como há milhares de anos, tem de ser realizado dia a dia, hora a hora, para ao menos manter os homens vivos. Mesmo quando o mundo sensível é reduzido ao mínimo, a um bastão, como com o sagrado Bruno,º pressupõe a atividade da produção desse bastão, Assim, a primeira coisa a fazer em qualquer concepção da história é observar esse fato fundamental em todo o seu significado e em toda a sua extensão, € atribuir-lhe a importância que lhe é devida. Como é sabido, os alemães nunca o fizeram, e por isso nunca tiveram uma base [Basis] terrena para a história nem, consequentemente, um historiador. Os franceses e os ingleses, embora tenham concebido a conexão desse fato com a chamada história apenas de um modo extremamente unilateral, no- meadamente enquanto enredados na ideologia política, fizeram não obstante as primeiras tentativas para dar à historiografia uma base materialista, tendo sido os primeiros a escrever histórias da sociedade civil? [biirgerlichen Gesellschafi), do comércio e da indústria. O segundo ponto é [12] este: a própria primeira necessidade satisfeita, a ação da satisfação e o instrumento já adquirido da sa- “Trata-se de uma expressão de B. Bauer no artigo “Caracterização de Ludwig Feuerbach” (Wigand's Vierteliabrsscbrifi, 1845, É. III, p. 130). (N.E)) O cermo alemão para sociedade civil é birgerliche gesellschafe, cuja tradução literal é sociedade burguesa. Para Marx e Engels, sociedade burguesa pode significar duas coisas: 1) 0 conjunto da sociabilidade burguesa (capitalista); 2) a base material da sociedade, vale dizer, o “intercâmbio material” que os homens estabelecem entre si na produção dos bens materiais necessários à existência, em qualquer tipo de sociedade, Em A ideologia alemã o termo é utilizado nesse segundo sentido. Com isso, os autores querem deixar claro que essa base material é o fundamento da história, em contraposição ao modo de pensar idealista. Desse modo, biirgertiche gesellsscabfi não se refere apenas à forma burguesa (capitalista) da sociedade, mas à base material existente em todas às sociedades. Essa base material ganha seu pleno desenvolvimento na sociedade burguesa (capitalista) céa partir daí que surge esse último termo. O sentido atual de sociedade civil muda radicalmente aquele atribuído por Marx e Engels, com enormes consequências. Socie- dade civil, então, ganha o sentido de organização dos cidadãos em oposição ao Estado, situando-o, portanto, no contexto da teoria liberal (N.E.B) 4 A IDEOLOGIA ALEMà tisfação, conduz a novas necessidades — e esta produção de novas necessidades é o primeiro ato histórico. Logo por aqui se revela de quem descende espiritualmente a grande sabedoria histórica dos alemães, os quais, ao esgotar-lhes o material positivo e ao não se tratar de nenhum absurdo [Unsinn] teológico, político ou literário, não reconhecem nenhuma história, mas o “tempo pré- histórico*”, sem entretanto nos esclarecerem como desse absurdo da “pré-história” se chega à verdadeira história — embora, por outro lado, a sua especulação histórica se lance muito particularmente sobre essa “pré-história”, porque acredita estar aí mais segura face às incursões dos “fatos crus” e, ao mesmo tempo, porque pode soltar as rédeas ao seu impulso especulativo e produzir e derrubar hipóteses aos milhares. A terceira relação, que logo desde o início entra no desenvol- vimento histórico, é esta: os homens que, dia a dia, renovam a sua própria vida começam a fazer outros homens, a reproduzir-se — a relação entre homem e mulher, pais e filhos, a família. Essa família, que a princípio é a única relação social, torna-se mais tarde, quando o aumento das necessidades cria novas relações sociais e o aumen- to do número dos homens cria novas necessidades, uma relação subordinada (exceto na Alemanha), e tem então de ser tratada e desenredada segundo os dados empíricos existentes, e não segundo o “conceito da família”, como se costuma fazer na Alemanha. De resto, essas três facetas da atividade social não devem ser entendi- das como três fases diferentes, mas apenas como três facetas ou, para escrever claro para os alemães, três “momentos” que, desde o começo da história e desde os primeiros homens, existiram simul- taneamente, e que ainda hoje se afirmam na história. A produção da vida, tanto da própria, no trabalho, quanto da alheia, na procriação, surge agora imediatamente como uma dupla * Pré-histórico, nesta passagem, não como uma fase da história, mas como antes de qualquer história. Em alemão Vorgescbichie) (N.E.B.) “2 Kant MAUX [13] relação: por um lado como relação natural, por outro como re- lação social — social no sentido em que aqui se entende a cooperação de vários indivíduos seja em que circunstâncias for e não importa de que modo e com que fim. Daqui resulta que um determinado modo de produção, ou fase industrial, está sempre ligado a um determinado modo da cooperação, ou fase social, e esse modo da cooperação é ele próprio uma “força produtiva”; e que a quantidade das forças produtivas acessíveis aos homens condiciona a situação da sociedade, e portanto a “história da humanidade” tem de ser sempre estudada e tratada em conexão com a história da indústria e da troca. Mas também é evidente que na Alemanha é impossível escrever essa história, porque para tanto faltam aos alemães não só a capacidade de concepção e o material, mas também a “certeza sensível”, e para além do Reno não se pode colher experiência dessas coisas, pois lá nenhuma história se processa. Revela-se, assim, logo de princípio, uma conexão materialista dos homens entre si, a qual é requerida [bedingal pelas necessidades e pelo modo da produção e é tão velha como os próprios homens — uma conexão que assume sempre formas novas e que, por conseguinte, apresenta uma “história”, mesmo que não exista um absurdo político ou religioso qualquer que una ainda mais os homens. Só agora, depois de termos considerado quatro momentos, quatro facetas das relações históricas primordiais, descobrimos que o homem também tem “consciência”? Mas também, logo de início, não como consciência “pura”, O “espírito” tem consigo de antemão [14] a maidição de estar “preso” à matéria, a qual nos surge aqui na forma de camadas de ar em movimento, de Em alemão extra zusansmenhalse. O sentido é mesmo que não haja uma instância política ou religiosa, absurda em si mesma, que promova uma articulação extra (para além da história) entre os homens. (N.B.B) [Nora masginal de Marx) Os homens têm história porque têm de produzir a sua vida e, ainda, o têm de fazer de deteriminado modo: isto é [na mega: este ter de.) dado pela sua organização física, tal como a é a sua consciência. a À IDEOLOGIA ALEMà percebem uma sílaba, apesar de lhes ter dado para isso indicações suficientes nos Deutsch-Franzosische Jabrbiicher'º e em A sagrada família); e também que todas as classes que aspiram ao domínio, mesmo quando o seu domínio, como é o caso com o proletaria- do, condiciona a superação de toda a velha forma da sociedade e da dominação em geral, têm primeiro de conquistar o poder político, para por sua vez representarem o seu interesse como o interesse geral, coisa que no primeiro momento são obrigadas a fazer. Precisamente porque os indivíduos procuram apenas o seu interesse particular, o qual para eles não coincide com o seu inte- resse comunitário — a verdade é que o geral é a forma ilusória da existência na comunidade —, este é feito valer como um interesse que lhes é “alienado” [fremdes) [18] e “independente” deles, como um interesse “geral” que é também ele, por sua vez, particular e peculiar, ou eles próprios têm de se mover” nesta discórdia, como na democracia. Por outro lado, também a luta prática desses in- teresses particulares, que realmente se opõem constantemente aos interesses comunitários e aos interesses comunitários ilusórios, torna necessários a intervenção e o refreamento práticos pelo inte- resse “geral” ilusório como Estado”. [17] E, finalmente, a divisão do trabalho oferece-nos logo o primeiro exemplo de como, enquanto os homens se encontram na sociedade natural, ou seja, enquanto existir a cisão entre o interesse particular e o comum, enquanto, por conseguinte, a atividade não * Deussch-Franzôsische Jabrbicher (Anais Franco-Alemães) foram publicados em Paris sob a direcção de K. Marx e À. Ruge em língua alemã, Saiu apenas um número, duplo, em fevereiro de 1844. Incluía as obras de K. Marx Para a questão judaica e Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Introdução, assim como as obras de F. Engels Esboços para uma critica da Economia Política c À situação na Inglaterra: “O passado e o presente”, de Thomas Carbyle. Estes trabalhos craduzem a passagem definitiva de Marx e Engels para o materialismo e o comunismo. A causa principal do desaparecimento da revista foram as divergências de princípio entre Marx e o radical burguês Ruge. (N.E.) “ Na MEGA: chocar (begegnen). (N.E) Esses dois últimos parágrafos foram inseridos na margem pela mão de Engels. as Kari MARX é dividida voluntariamente, mas sim naturalmente, a própria ação do homem se torna para este um poder alienado e a ele oposto [einer fremden, gegeniberstebenden Macht), que o subjuga, em vez de ser ele a dominá-la. E que assim que o trabalho começa a ser distribuído, cada homem tem um cítculo de atividade determinado e exclusivo que lhe é imposto e do qual não pode sair; será caçador, pescador ou pastor ou crítico crítico,” e terá de continuar a sê-lo se não qui- ser perder os meios de subsistência — ao passo que na sociedade comunista, na qual cada homem não tem um círculo exclusivo de atividade, mas pode se formar [zusbilden] em todos os tamos que preferir, a sociedade regula a produção geral e, precisamente desse modo, torna possível que eu faça hoje uma coisa e amanhã outra, que cace de manhã, pesque de tarde, crie gado à tardinha, critique depois da ceia, tal como me aprouver, sem ter de me tornar caçador, pescador, pastor ou crítico. [18] Essa fixação da atividade social, essa consolidação do nosso próprio produto como força objetiva [sachlichen Gewalt) acima de nós que escapa ao nosso controle, contraria as nossas expectativas e aníquila os nossos cálculos, é um dos principais momentos no desenvolvimento histórico até os nossos dias. O poder social, isto é, a força de produção multiplicada que surge pela cooperação [Zusammenwirken] dos diferentes indi- víduos requerida [bedingte] na divisão do trabalho, aparece a esses indivíduos — porque a própria cooperação não é voluntária, mas natural — não como o seu próprio poder unido, mas como uma força alienada [fremde) que existe fora deles, da qual não sabem donde vem e a que se destina, que eles, portanto, não podem dominar e que, ao contrário, percorre uma série peculiar de fases e etapas de desenvolvimento independente da vontade e do esforço dos homens, e que até mesmo dirige essa vontade e esse esforço! De outro modo, “Crítico exítico”: referência aos teóricos da esquerda hegeliana que Marx c Engels criri- caram duramente em A sagrada femília. (N.E.B,) Sabre esse passo escreveu Marx, à margem, o texto que é reproduzido neste volume nos dois primeiros parágrafos da seção que se segue a 5º, logo depois do parágrafo em curso. 49 À IDEOLOGIA ALEMà como poderia, por exemplo, a propriedade ter uma história, assumir várias formas, e, por exemplo, a propriedade fundiária, conforme as diferentes condições existentes, passar na França do parcelamento para a centralização em poucas mãos e, na Inglaterra, da centraliza ção em poucas mãos para o parcelamento, como é hoje realmente o caso? Ou como explicar que o comércio, que não é de fato mais do que a troca de produtos de diferentes indivíduos e países, domine o mundo inteiro pela relação de procura e oferta [Nachfrage und Zasfiuhor] - uma relação que, como diz um economista inglés, paira sobre a Terra semelhante ao Destino antigo e com mão invisível distribui a felicidade e a infelicidade aos homens, funda impérios e destrói impérios, faz nascer [19] e desaparecer” povos —, ao passo que com a superação [Aufhebung) da base, da propriedade privada, com a regulação comunista da produção e o aniquilamento a ela inerente da alienação [Fremaheis] com que os homens se relacionam com o seu próprio produto, o poder da relação de procura e fornecimento se dissolve em nada e os homens voltam a ter sob o seu domínio a troca, a produção, o modo da sua mútua relação? [5. Desenvolvimento das forças produtivas como uma premissa material do comunismo] [18] Essa “alienação” [Ensfremdung], para continuarmos com- preensíveis para os filósofos, só pode ser superada, evidentemente, dadas duas premissas [Voraussetzungen) práticas. Para que ela se torne um poder “insuportável”, isto é, um poder contra o qual se faça uma revolução, é necessário que tenha criado uma grande massa da humanidade absolutamente “destituída de propriedade” [durchaus “Eigentumslos”) e ao mesmo tempo em contradição com um mundo existente de riqueza e cultura, o que pressupõe um grande aumento da força produtiva, um grau elevado do seu de- senvolvimento — e, por outro lado, esse desenvolvimento das forças 5 Nos MEW, verschwinden; na MEGA, scbwinden. (N.E.) so Kaui MARX produtivas (com o qual já está dada, simultaneamente, a existência empírica concreta dos homens no plano Aistórico-mundial, em vez de no plano local) é também uma premissa prática absolutamente necessária porque sem ele só a escassez [Mangel] se generaliza, e, portanto, com a carência [Nosdurf] também teria de recomeçar a luta pelo necessário e teria de se produzir de novo toda a velha merda [Scheifie]; porque, além disso, só com esse desenvolvimento universal das forças produtivas se estabelece um intercâmbio universal dos homens, que por um lado produz o fenômeno da grande massa “desrituída de propriedade” em todos os povos ao mesmo tempo (concorrência geral), tornando todos eles depen- dentes das revoluções uns dos outros e, por fim, colocando indi- víduos empiricamente universais, indivíduos histórico-mundiais, no lugar dos indivíduos locais. Sem isso, 1) o comunismo apenas poderia existir como algo local [eine Lokalitár]; 2) os poderes do intercâmbio não teriam eles próprios podido desenvolver-se como poderes universais, e pot isso insuportáveis, e teriam permanecido “circunstâncias” de superstição locais; 3) todo o alargamento do intercâmbio superaria o comunismo local. Empiricamente, o comunismo só é possível como o ato dos povos dominantes “de repente” e ao mesmo tempo”, o que pressupõe o desenvol- * Em alemão lemos “heimish-aberglâugie 'Umstânde”. Literalmente: “circunstâncias” de superstições locais, familiares, domésticas. Marx e Engels estão aqui contrapondo a universalidade dos poderes, das forças, necessárias para a revolução proletária, forças revolucionárias essas que apenas podem surgir na luta contra forças alienadas igualmente universais, às forças e processos de alienações apenas locais que caracterizam o capi- talismo antes do seu pleno desenvolvimento histórico. Na luta contra essas alienações ainda não universais, as potências revolucionárias também não poderiam se desenvolver plenamente, (N.E.B.) Na MEGA: “de repente” ou ao mesmo tempo. Essa conclusão da possibilidade da vitória da revolução proletária apenas em simultâneo nos países capitalistas avançados é, consequentemente, a impossibilidade da vitória da revolução num só país, que recebeu a sua formulação mais completa no trabalho de Engels Princípios básicos do comunisma (1847) era justa para o período do capitalismo pré-monopolista. Nas novas condições históricas, no período do capitalismo monopolista, V. L. Lenin, partindo da lei por ele descoberta do desenvolvimento político e econômico de- sigual do capitalismo na época do imperialismo, chegou à uma nova conclusão: à st A IDEOLOGIA ALEMà vimento universal da força produtiva e o intercâmbio mundial a ele articulado. [19] De resto, a massa de meros trabalhadores [bloffsen Arbei- tern] — força de trabalho [Arbeiverkraft] massiva” separada do capi- tal ou de qualquer limitada satisfação —, e por isso também a perda não temporária desse mesmo trabalho como uma fonte assegurada de vida, pressupõe o mercado mundial por meio da concorrência. O proletariado só pode, por conseguinte, existir à escala histórico- mundial, tal qual o comunismo; a sua ação apenas pode se dar como existência “histórico-mundial”; existência histórico-mundial dos indivíduos, ou seja, a existência dos indivíduos diretamente vinculada à história mundial, [18] O comunismo não é para nós um estado de coisas [Zustand) que deva ser estabelecido, um ideal pelo qual a realidade [terá] de se regular. Chamamos comunismo ao movimento reaí que supera o atual estado de coisas. As condições desse movimento resultam do pressusposto atualmente existente. ek [19] A forma de intercâmbio requerida [bedingte] pelas forças de produção existentes em todos os estágios históricos até os nossos dias, e que por sua vez as requer, é a sociedade civil [biirgerliche da possibilidade da vitória da revolução socialista inicialmente nalguns ou num só país, individualmente considerado, e da impossibilidade da vitória simultânea da revolução em todos os países ou na maioria deles. A formulação dessa nova conclusão surge pela primeira vez no trabalho de Lenin Sobre « palavra de ordem dos Estados Unidos da Europa (1915) (N.E) [Nota de Marx no topo da página seguinte do manuscrito que contínua o texto] Co- munismo. * Na MEGA: massivamente. (N.E) No manuscrito, este parágrafo foi inserido por Marx por cima do primeiro parágrafo desta seção. s2 KARL MARX GesellschafilS, a qual, como se torna claro pelo que já foi dito, tem por pressuposto e fundamento [Voraussetzung und Grundlage) a família simples e a família composta, o chamado sistema tribal, cujas características marcantes mais precisas foram acima expostas. Já por aqui se revela que esta sociedade civil é o verdadeiro lar e teatro de toda a história, e que é absurda a concepção da história até hoje defendida que despreza as relações reais ao confinar-se às ações altissonantes de chefes e de Estados. Até aqui consideramos principalmente apenas uma das facetas da atividade humana, o trabalho da natureza pelos homens. À outra faceta, o trabalho dos homens pelos homens...º Origem do Estado e a relação do Estado com a sociedade civil.º [6. Conclusões da concepção materialista da história: continuidade do processo histórico, transformação da história em história mundial, a necessidade de uma revolução comunista] [20] A história não é senão a sucessão das diversas gerações, cada uma das quais explora os materiais, capirais, forças de produção que lhe são legados por todas as que a precederam, e que por isso continua, portanto, por um lado, em circunstâncias completamente mudadas, a atividade transmitida, e por outro modifica as velhas circunstâncias com uma atividade completa- mente mudada, o que permite a distorção especulariva de fazer da história posterior a finalidade [Zweck] da anterior, por exemplo, colocar como subjacente ao descobrimento da América a finali- dade [Zweck) de proporcionar a eclosão da Revolução Francesa; desse modo, a história recebe então finalidades à parte e torna-se uma “pessoa a par de outras pessoas” (como sejam: “Consciência SCE nota 42, p. 41. (N.E.B) * [Nota maginal de Marx] Intercâmbio e forças produtivas. «a Q resto da página no manuscrito ficou em branco. À página seguinte começa com a exposição das conclusões da concepção materialista da história. 53 A IDEOLOGIA ALEMà de intercâmbio intimamente ligada a esse modo de produção e por ele produzida, ou seja, a sociedade civil” nos seus diversos estágios, como base de toda a história, e bem assim na represen- tação da sua ação como Estado, explicando a partir dela todos os diferentes produtos teóricos e formas da consciência — a religião, a filosofia, a moral etc. etc. — e estudando a partir destas o seu nascimento; desse modo, naturalmente, a coisa pode também ser apresentada na sua totalidade (e por isso também a ação recípro- ca dessas diferentes facetas umas sobre as outras). Ão contrário da visão idealista da história, não tem de procurar em todos os períodos uma categoria, pois permanece constantemente no so/o histórico; não explica a práxis a partir da ideia, explica as for- mações das ideias [Ideenformationen] a partir da práxis material, e chega, em consequência disso, ao resultado” de que todas as formas e produtos da consciência podem ser resolvidos, não pela crítica espiritual, pela dissolução na “Consciência de Si” ou pela transformação em “fantasmas”, “espectros”, “visões”? etc., mas apenas pela subversão [Umsturz] prática das relações sociais reais de que derivam essas fantasias idealistas —- a força motora da his- tória, também da religião, da filosofia e de toda as demais teorias, não é a crítica, mas sim a revolução. Ela mostra que a história não termina resolvendo-se na “Consciência de Si” como “espírito do espírito”? mas que nela, em todos os estágios, se encontra um resultado material, uma soma de forças de produção, uma relação historicamente criada com a natureza e dos indivíduos uns com os outros que a cada geração é transmitida pela sua predecessora, uma massa de forças produtivas, capitais e circunstâncias que, por um lado, é de fato modificada pela nova geração. Mas que, * CF. nota 42, p. 41. (N.E.B) Na MEGA: chega, em consequência disso, a esse resultado. (N.E.) Expressão do livro de M. Stirer O Único e a sua propriedade (M. Stirner, Der Einsige und sein Eigenshum, Leipzig, 1845). (N.E) A expressão é de Bruno Bauer. 58 Kari MARX por outro lado também lhe prescreve as suas próprias condições de vida e lhe dá um determinado desenvolvimento, um caráter especial — mostra, portanto, que as circunstâncias fazem os ho- mens tanto [25] quanto os homens fazem as circunstâncias. Essa soma de forças de produção, capitais e formas de intercâmbio social, que todos os indivíduos e todas as gerações vêm encontrar como algo dado, é o fundamento real daquilo que os filósofos têm representado como “substância” e “essência do Homem”, daquilo que têm hipostatizado e combatido — um fundamento real que de modo algum é afetado nos seus efeiros e influências sobre o desenvolvimento dos homens pelo fato de esses filósofos se rebelarem contra ele como “Consciência de Si” e o “Único”. Essas condições de vida que as diferentes gerações já encontram vigentes é que decidem, também, se o abalo revolucionário pe- riodicamente recorrente na história será suficientemente forte ou não para deitar abaixo a base de todo o existente, — ou seja, por um lado, as forças produtivas existentes, por outro, à formação de uma massa revolucionária que faz a revolução não apenas contra estas ou aquelas condições da sociedade anterior, mas contra à própria “produção da vida” vigente até agora, contra a “atividade total” em que se baseava — e quando esses elementos materiais de uma revolução [Umwilzung) total não estão presentes, então é completamente indiferente para o desenvolvimento prático que a ideia dessa transformação profunda já tenha sido expressa centenas de vezes — como o prova a história do comunismo. [8. Falta de fundamento da concepção anterior da história, a concepção idealista, particularmente da filosofia alemã pós-hegeliana] Toda a concepção da história até hoje ou deixou, pura e sim- plesmente, por considerar essa base real da história, ou viu nela apenas algo de secundário e sem qualquer conexão com o curso histórico. À história tem, por isso, de ser sempre escrita segundo so A IDEOLOGIA ALEMà um critério que lhe é extrínseco; a produção real da vida aparece como pré-histórico” primitiva, enquanto o que é histórico aparece como existindo separado da vida em comum, como extrassupra- terreno. À relação dos homens com a natureza fica, desse modo, excluída da história, pelo que é gerada a oposição entre natureza e história. Daí que tal concepção só tenha podido ver na história ações políticas de chefes e de Estados e lutas religiosas e teóricas em geral, e tenha tido, em especial, em cada época histórica, de partilhar da ilusão dessa época. Pox exemplo, se uma época imagina ser determinada por motivos puramente “políticos” ou “religiosos”, embora a “religião” e a “política” sejam apenas formas dos seus mo- tivos reais, o seu historiador aceita essa opinião. A “imaginação”, a “representação” desses homens determinados sobre a sua práxis real é transformada no único poder determinante e ativo que domina e determina a práxis desses homens. Quando a forma rudimentar em que aparece a divisão do trabalho dos indianos e entre os egípcios dá origem, nesses povos, ao sistema de castas no seu Estado e na sua religião, o historiador acredita ser o sistema de castas [26] o poder que gerou essa forma social rudimentar. Enquanto os franceses e os ingleses se agarram pelo menos à ilusão política, que está mais perto da realidade, os alemães movem-se no reino do “espírito puro” e fazem da ilusão religiosa a força motora da história. A filosofia da história de Hegel é a última consequência, levada à sua “expressão mais pura”, de toda essa historiografia alemã, na qual a questão não é a dos interesses reais, nem sequer dos interesses políticos, mas dos pensamentos puros, e que depois tem de aparecer ao sagrado Bruno como uma série de “pensamentos” que se devoram uns aos outros e que por fim naufragam na “Consciência de Si” e, de um modo ainda mais consequente, ao sagrado Max Stirner, que não sabe absolutamente nada da história real, o curso histórico tem ” Emalemão, Urgescbichelich, literalmente antes da história. Não é pré-histórico enquanto uma fase da história, mas como antes da história. (N.E.B.) o KaBL MARX de aparecer como uma mera história de “cavaleiros”, salteadores e espectros, face às visões dos quais ele naturalmente só sabe salvar- se pela “impiedade” [Heillosigkeit].* Essa concepção é realmente religiosa, faz passar o homem religioso pelo homem original do qual parte toda a história, e coloca, na sua imaginação, a produ- ção de fantasias religiosas no lugar da produção real dos meios de subsistência e da própria vida. Toda essa concepção da história, juntamente com a sua dissolução e os escrúpulos e dúvidas dela resultantes, é um assunto meramente nacional dos alemães e tem interesse apenas /ocaí para a Alemanha, como, por exemplo, esta questão importante, e recentemente muito tratada: como é que de fato “se vem do reino de Deus para o reino dos homens”, como se esse “reino de Deus” tivesse alguma vez existido em qualquer outra parte que não na imaginação, e os doutos senhores não vivessem continuamente, sem o saberem, no “reino dos homens” para o qual agora procuram. caminho, e como se o divertimento cientí- fico, pois não é mais do que isso, de explicar a curiosidade dessa nefelibatice” teórica não residisse precisamente em, ao contrário, demonstrar o seu nascimento a partir das relações terrenas reais. A verdade é que, para esses alemães, a questão é sempre a de des- fazer o contrassenso já existente [27] numa outra tolice qualquer, ou seja, de pressuporem que todo esse contrassenso tem, de faro, um sentido original que há que descobrir, ao passo que se trata apenas de explicar essa frascologia teórica a partir das relações reais vigentes. A resolução [Asftósungl prática, real, dessa fraseologia, a eliminação dessas representações da consciência dos homens, é operada, como já dissemos, pela mudança das circunstâncias, e não por meio de deduções teóricas. Para a massa dos homens, isto é, para o proletariado, não existem essas representações teóricas, * [Nota marginal de Marx: À historiografia dita objetiva consistiu precisamente em conceber as relações históricas separadas da atividade, Caráter reacionário. *» De nefelibato, o que ou quem vive nas nuvens. (N.E.B) e À IDEOLOGIA ALEMà e, portanto, para ele, não precisam ser resolvidas [aufglôst]; e se essa massa teve quaisquer representações teóricas, por exemplo, a religião, já há muito que estas se encontram resolvidas [aufrelóst] pelas circunstâncias. O que há de puramente nacional nessas questões e soluções revela-se ainda no fato de esses teóricos acreditarem, com toda a seriedade, que ideias malucas [Hirngespinste) como “o Homem- Deus”, “o Homem” erc., tivessem alguma vez presidido a cada uma das épocas da história — o sagrado Bruno chega mesmo ao ponto de afirmar que só “a crítica e os críticos fizeram a história”? — e de, quando eles próprios se dedicam a construções históricas, saltarem sobre tudo o que é mais remoto e passarem imediatamente do “Mongolismo”” para a história autêntica e “cheia de conteúdo”, isto é, a história dos Hailische e dos Deutsche Jabrbiicher? e da barulhenta dissolução da escola hegeliana em um desacordo geral. São esquecidas todas as outras nações, todos os acontecimentos reais, o theatrum mundi [teatro do mundo — latim] confina-se à Feira do Livro de Leipzig e às desavenças mútuas da “crítica”, do “Homem” e do “Único”.” Se a teoria se dá alguma vez ao trabalho de tratar de temas realmente históricos, como, por exemplo, o século 18, os seus adeptos dão só a história das representações, desligada dos fatos e dos desenvolvimentos práticos que lhes são o fundamento, e mesmo assim apenas com a intenção de apresentarem esse tempo como um estágio preli- Essa expressão é retirada do artigo de B. Bauer “Caracterização de Ludwig Feuerbach” (ver a revista Wigand's Vierteiabrsscbrifi, 1845, t. LE, p. 139: (N.E) Expressão do livro de M. Stirner O Único e a sua propriedade. Em alemão Mongolentum, referente à civilização Mongol. (N.E.) Halhische Jabrbiicher e Deutsche Jabrbicher: título abreviado da revista literário-filosófica dos jovens hegelianos editada sob a forma de folhas dtárias em Leipzig de janeiro de 1838 a junho de 1841, O título completo era Hlailische Jarbiicher fiir deutsche Wissenschafê und Kaunst (Anais de Halle sobre a ciência e a arte alemãs); de julho de 1841 a janeiro de 1843 passou a chamar-se Deyische Jabrbiicher fiir Wissenschaf? send Kunst (Anais alemães sobre a ciência e a artê). Ex janeixo de 1843 a revista fai proibida pelo governo. (N.E.) Ou seja, Bruno Bauer, Ludwig Feuerbach e Max Stirner. ” e Kant MARX minar inacabado, como precursor ainda limitado da verdadeira época histórica, ou seja, do tempo da luta dos filósofos alemães de 1840-1844. A essa finalidade de escrever uma história de um período anterior para fazer brilhar, com mais fulgor ainda, a gló- ria de uma pessoa a-histórica e das suas fantasias corresponde o fato de não se mencionar nenhum dos fatos realmente históricos, nem mesmo as intervenções realmente históricas da política na história, e de, em vez disso, se dar uma narrativa assente não em estudos mas em construções e historietas de mexericos literários — como aconteceu com o sagrado Bruno na sua já esquecida História do século 18.5º Esses paréticos e arrogantes merceeiros de ideias, que crêem estar infinitamente acima de todos os preconceitos nacionais, são, pois, na prática, ainda muito mais nacionais do que os filisteus bebedores de cerveja que sonham com a unida- de da Alemanha. Não reconhecem como históricos os atos de outros povos, vivem na Alemanha pela Alemanha [28] e para a Alemanha, transformam a canção do Reno” num hino religio- so, e conquistam a Alsácia e a Lorena roubando, não o Estado francês, mas a filosofia francesa, e germanizando, não províncias francesas, mas ideias francesas. Comparado aos sagrados Bruno e Mas, que no domínio universal da teoria proclamam o domínio universal da Alemanha, Herr Venedey é um cosmopolita. [9. Crítica adicional de Feuerbach, da sua concepção idealista da história] Dessas disputas torna-se também claro quanto Feuerbach se ilu- de ao declarar-se, em virtude da qualificação “homem comunitário” * B. Bauer, Geschichre der Politik, Cultur und Anfhlitrung des achszebmten Jabrhunderis, Bd. 12, Charlortenburg, 1843-1845 (B. Bauer, História da política, da cultura e das “luzes” do século dezoito, tt. 1-2, Charlotrenburg, 1843-1845). (N.E) Canção do Reno: do poema Der deutsche Rbein (O Rena alemão), do posta pequeno- bucgués alemão N. Becker, muito utilizado pelos nacionalistas. Foi escrito em 1840 « desde então muitas vezes musicado. (N.E.) e A IDEOLOGIA ALEMà a doutrina da divisão dos poderes, que é agora declarada uma “lei eterna”, A divisão do trabalho, que atrás (pp. [44-50]: encontramos como uma das principais forças da história até os nossos dias, manifesta-se agora também na classe dominante como divisão do trabalho espiritual e [31] material, pelo que no seio dessa classe uma parte surge como os pensadores dessa classe (os ativos ideólogos criadores de conceitos da mesma, os quais fazem da elaboração [Ausbildung] da ilusão dessa classe sobre si própria a sua principal fonte de sustento), ao passo que os outros têm uma atitude mais passiva e receptiva em relação a essas ideias e ilusões, pois que na realidade são eles os membros ativos dessa classe e têm menos tem- po para criar ilusões e ideias sobre si próprios, No seio dessa classe pode essa sua cisão chegar a uma certa oposição e hostilidade entre ambas as partes, mas que por si própria desaparece em todas as colisões práticas em que a própria classe fica em perigo, desapare- cendo então também a aparência de que as ideias dominantes não seriam as ideias da classe dominante e teriam um poder distinto do poder dessa classe. A existência de ideias revolucionárias numa época determinada pressupõe já a existência de uma classe revo- lucionária, e acerca dos seus pressupostos já foi dito o necessário (pp. [50-53]).º Ora, se na concepção do curso da história separarmos da clas- se dominante as ideias da classe dominante, se lhes atribuirmos uma existência autônoma, se nos limitarmos a que numa época dominaram estas e aquelas ideias, sem nos preocuparmos com as condições da produção e com os produtores dessas ideias, se, por- tanto, deixarmos de fora os indivíduos e as condições do mundo que estão na base das ideias, então poderemos dizer, por exemplo, que durante o tempo em que dominou a aristocracia dominaram “ Verll,3e4. (NE) » Verl,5c6.(N.E) Kart MARX os conceitos honra, lealdade etc., durante o domínio da burguesia dominaram os conceitos liberdade, igualdade etc. Em média, é isso que a própria classe dominante imagina. Essa concepção da história, que a todos os historiadores é comum, em especial a partir do século 18, há de necessariamente se chocar com o [32] fenômeno de que dominam ideias cada vez mais abstratas, isto é, ideias que assumem cada vez mais a forma da universalidade. É que cada nova classe que se coloca no lugar de outra que dominou antes dela é obrigada, precisamente para realizar o seu propósito, a apresentar o seu interesse como o interesse universal de todos os membros da sociedade, ou seja, na expressão ideal [ideel!): a dar às suas ideias a forma da universalidade, a apresentá-las como as únicas racionais e universalmente válidas. A classe revolucionária, *” já que tem pela frente uma classe, surge desde o princípio não como classe, mas como representante de toda a sociedade, ela aparece como a massa inteira da sociedade face à única, dominante, classe. E consegue-o porque, em princípio, o seu interesse anda realmente ainda mais ligado ao interesse comum [gemeischafitichen] de to- das as demais classes não dominantes, porque sob a pressão das condições até aí vigentes ele não pôde ainda desenvolver-se como interesse particular de uma classe particular. A sua vitória serve também, por isso, a muitos indivíduos das demais classes que não se tornam dominantes, mas apenas na medida em que permite a esses indivíduos subirem à classe dominante. Quando a burguesia * [Riscado no manuscrito:] Esses “conceitos dominantes” terão uma forma tanto mais geral e ampla quanto mais a classe dominante é obrigada a apresentar o seu interesse como o de todos os membros da sociedade. A classe dominante tem, ela própria, em média, a noção de que esses seus conceitos dominam, e distingue-os de representações dominantes de épocas anteriores apenas pelo fato de as apresentar como verdades eternas. & Literalmente, a classe revolucionante, Die revolutionerende Klasse. “ [Nota marginal de Marx; (A universalidade corresponde: 1) à classe contra o estamento [Stand]; 2) à concorsência, ao intercâmbio mundial exc.; 3) à grande força numérica da classe dominante; 4) à ilusão dos interesses comuns [gemeinschafilichen] (sendo no princípio essa ilusão verdadeira); 5) ao delírio dos ideglogos e à divisão do trabalho.) “e A IDEOLOGIA ALEMà francesa dertubou o domínio da aristocracia, tornou desse modo possível a muitos proletários subirem acima do proletariado, mas apenas na medida em que se tornaram burgueses. Cada nova classe, por isso, instaura o seu domínio apenas sobre uma base mais ampla do que a até aí dominante, pelo que, em contrapartida, mais tarde também o antagonismo da classe não dominante contra a agora dominante se desenvolve muito mais aguda e profundamente. Por ambas as razões é determinado o fato de que a luta à travar contra a nova classe dominante por sua vez visará uma negação mais radical, mais decidida, das condições sociais até aí vigentes [33) do que fora possível a todas as classes que anteriormente procuraram dominar. Toda essa aparência de que o domínio de uma determinada classe seria apenas o domínio de certas ideias cessa, naturalmente, por si mesma logo que o domínio de classes em geral deixa de ser a forma da ordem social, logo que, portanto, deixa de ser necessário apresentar um interesse particular como geral ou “o geral” como dominante. Uma vez separadas as ideias dominantes dos indivíduos do- minantes, e sobretudo das relações decorrentes de uma dada fase do modo de produção, e atingido assim o resultado de que na história dominam sempre as ideias, é muito fácil abstrair dessas várias ideias “a ideia”, a Ideia etc., como aquilo que domina na história e, desse modo, entender todas as diferentes ideias e con- ceitos como “autodeterminações” do conceito que se desenvolve na história. E, então, também é natural que todas as relações dos homens possam ser derivadas do conceito de Homem, do Homem tal como representado, da essência do Homem, do Homem. Foi o que fez a filosofia especulativa. O próprio Hegel confessa, no fim da Filosofia da História, que “apenas considerou o curso do conceito” e que na história apresentou a “verdadeira teodiceia” (p. 446). Podemos agora voltar aos produtores do “conceito”, aos teó- ticos, ideólogos e filósofos, e chegamos então a esta conclusão: os 7” Kari MARX filósofos, os pensadores enquanto tais, desde sempre dominaram na história — uma conclusão que, como vemos, já foi expressa por Hegel.” Todo o truque de demonstrar na história a supremacia do espírito (a hierarquia, em Stirner) reduz-se, portanto, aos seguintes três esforços. [84] Nº 1. É preciso separar as ideias dos que dominam por razões empíricas, em condições empíricas e como indivíduos ma- teriais, desses mesmos que dominam, e por essa via reconhecer o domínio das ideias ou ilusões na história. Nº 2. É preciso pôr uma ordem nesse domínio das ideias, de- monstrar uma conexão mística entre as ideias que sucessivamente dominam, o que se consegue pela via de considerá-las “autodeter- minações do conceito” (e isso é possível pelo fato de essas ideias, graças à sua base empírica, estarem realmente em conexão entre si, e pelo fato de elas, entendidas como meras ideias, se tornarem autodistinções, diferenças feitas pelo pensamento). No 3. Para eliminar o aspecto místico desse “conceito que se autodetermina”, transformam-no numa pessoa — “a Consciência de Si” -, ou, para parecerem verdadeiramente materialistas, numa série de pessoas que representam “o conceito” na história, nos “pensadores”, nos “filósofos”, nos ideólogos, que agora de novo são entendidos como os fabricantes da história, como o “Conselho dos Guardiães”, como os dominantes”? Desse modo eliminaram da história rodos os elementos materialistas e puderam então dar rédea solta ao seu corcel especulativo. [35] Enquanto na vida comum cada shopkeeper [lojista — inglês) sabe muito bem distinguir entre aquilo que alguém pretende ser e Marx « Engels referem-se ao cerceiro capítulo do primeiro tomo de À ideologia alemã. Essa parte do capítulo sobre Feuerbach inicialmente fazia parte desse terceiro capítulo e estava imediatamente a seguir ao texto a que aqui se referem, Marx e Engels. Na pas- sagem indicada do terceiro capítulo Marx e Engels citam a obra de Hegel Filosofia da História e outras, (N.E) * [Nota marginal de Marx] O homem = o “espirito humano pensante”. a A IDEOLOGIA ALEMà aquilo que é realmente, a verdade é que a nossa historiografia ainda não atingiu esse reconhecimento trivial. Ela acredita que todas as épocas são, literalmente, aquilo que dizem e imaginam ser. Esse método histórico que dominou na Alemanha, e especial- mente a razão por que dominou, têm de ser explicados a partir da conexão com a ilusão dos ideólogos em geral, por exemplo, as ilusões dos juristas, políticos (entre os quais, também, os estadistas práticos), a partir das divagações dogmáricas e distorções desses sujeitos,” ilusão aquela que muito simplesmente se explica pela sua posição prática na vida, pela sua atividade e pela divisão do trabalho. * “Sujeitos” [Kerk] no sentido pejorativo. Poderia ser também “tipos”. 72 [t. Instrumentos de produção e formas de propriedade] «.[40]? encontrado. Do primeiro, decorre o pressuposto de uma divisão do trabalho já desenvolvida e de um extenso comér- cio; do segundo, a localidade. No primeiro caso, os indivíduos têm de ser reunidos, no segundo caso descobrem-se, a par do ins- trumento de produção dado, a si próprios como instrumentos de produção. Entra aqui, portanto, a diferença entre os instrumentos de produção naturais e os que foram criados pela civilização. A terra (a água etc.) pode ser considerada como um instrumento de produção natural. No primeiro caso, no caso de um instrumento de produção natural, os indivíduos são subordinados à natureza. No segundo caso, a um produto do trabalho. No primeiro caso, a propriedade (propriedade da terra) surge, por isso, também como domínio natural direto, no segundo como domínio do trabalho, em especial do trabalho acumulado, do capital. O primeiro caso pressupõe que os indivíduos se encontram ligados por algum vín- culo, seja a família, a tribo, a própria terra etc.; o segundo caso, que são independentes uns dos outros e apenas unidos pela troca. No primeiro caso, a troca é principalmente uma troca entre os homens e a natureza, uma troca em que o trabalho de um é trocado pelos produtos da outra; no segundo caso, ela é, predominantemente, troca dos homens entre si. No primeiro caso, basta o senso co- » Aqui faltam quasro páginas no manuscrito. À IDEOLOGIA ALEMà quais, no entanto, dada a sua falta de poder, não produziram quaisquer efeitos, os oficiais chegaram tão-só a pequenas insu- bordinações no seio de corporações separadas e que integravam a existência do próprio sistema das guildas. Os grandes levantes da Idade Média partiram todos do campo, mas ficaram igualmente sem qualquer êxito devido à dispersão dos camponeses e à crueza que dela decorre. O capital, nessas cidades, era um capital natural [naturwiichsiges Kapital)º que consistia da casa, das ferramentas do ofício e dos compradores hereditários naturais, e que, devido ao intercâmbio não desenvolvido e à escassa circulação, tinha de se transmitir de pais a filhos como irrealizável. Não era esse capital, ao contrário do moderno, um capital avaliável em dinheiro e para o qual é indiferente estar investido nesta ou naquela coisa, mas um capital diretamente ligado ao trabalho particular do possuidor, absolu- tamente inseparável deste e, nessa medida, um capital estamental [xândisches Kapital) 1º A divisão do trabalho nas cidades entre [44] as diferentes corporações era ainda [completamente natural]! e nas próprias corporações não era realizada entre os diferentes trabalhadores. Cada trabalhador tinha de ser versado num ciclo inteiro de tra- balhos, tinha de saber fazer tudo o que se podia fazer com as suas ferramentas; o intercâmbio reduzido e a escassa ligação das diferentes cidades enrre si, a falta de população e a limitação das necessidades não permitiram o aparecimento de uma maior divisão do trabalho, e por isso todo aquele que queria ser mestre tinha de dominar completamente o seu ofício. Por isso, nos artesãos me- dievais se encontra ainda um interesse no seu trabalho especial e Em alemão naturwitchstg-saimelische Kapiral, Trata-se do capital que se acumulou “naru- ralmente” sob a ordem feudal e, portanto, anterior à da expansão comercial. (N.E.B) Estamental, aqui, referente às ordens ou estamentos em que se organizava a sociedade feudal. “O manuscrito encontra-se deteriorado nesta passagem. 78 Kari MARX em ser perito nele que podia elevar-se a um certo sentido artístico limitado. Mas também por isso cada artesão medieval se entrega- va completamente ao seu trabalho, mantinha com ele uma grata relação de servo e estava muito mais subsumido a ele do que o trabalhador moderno, ao qual o seu trabalho é indiferente. [3. Maior divisão do trabalho. Separação do comércio e da indústria. Divisão do trabalho entre as várias cidades. Manufatura] A expansão seguinte da divisão do trabalho foi a separação da produção do intercâmbio, a formação de uma classe especial de comerciantes, uma separação que, nas cidades herdadas pela história? fora transmitida (entre outras coisas, com os judeus) e que nas cidades recém-formadas surgiu muito cedo. Estava, assim, dada a possibilidade de uma ligação comercial que ultrapassava os limites locais, uma possibilidade cuja realização dependia dos meios de comunicação existentes, da situação da segurança pública no campo condicionado pelas condições políticas (em toda a Idade Média, como é sabido, os comerciantes deslocavam-se em caravanas armadas), e das necessidades mais rudes ou mais desenvolvidas, dependendo do nível de cultura respectivo, da região acessível ao intercâmbio. Com o intercâmbio constituído numa classe especial, com a expansão do comércio pelos comerciantes para além dos arredores imediatos da cidade, surge imediatamente uma ação recíproca entre a produção e o intercâmbio. As cidades entram em ligação umas com as outras, de uma cidade são levadas para outra novas ferramentas, e a divisão entre a produção e o intercâmbio em breve dá origem a uma nova divisão da produção entre [45] cada uma das cidades, cada uma das quais em breve explora um ramo 2 historisoh iiberlieferten Stázem, cidades que já existiam antes e que foram transmítidas pela história como herança para o processo de renascimento comercial e urbano. (N.E.B.) 79 A GDEOLOGIA ALEMà predominante da indústria. A limitação local inicial começa a ser gradualmente dissolvida. Se as forças produtivas ganhas numa localidade, pricipalmente inventos, se perdem ou não para o desenvolvimento posterior de- pende simplesmente da expansão do intercâmbio. Enquanto não existe um intercâmbio que ultrapasse a vizinhança imediata, cada invento tem de ser feito separadamente em cada localidade, e simples contingências, como irrupções de povos bárbaros, as próprias guerras habituais, são o bastante para fazer regressar uma região com forças produtivas e necessidades desenvolvidas ao ponto em que tem de começar tudo de princípio. Na história inicial, cada invento tinha de ser feito diariamente de novo e independentemente em cada lo- calidade. Quão pouco a salvo de uma ruína completa estão forças produtivas desenvolvidas, até mesmo quando existe um comércio relativamente bastante extenso, demonstram os Fenícios,!* cujos inventos em grande parte se perderam por longo tempo devido à expulsão desta nação do comércio, à conquista de Alexandre e ao declínio que se lhe seguiu. E o mesmo acontece na Idade Média, por exemplo, com os vitrais. Só quando o intercâmbio se tornou intercâmbio mundiaf e tem por base a grande indústria é que está assegurada a duração das forças produtivas conquistadas. A divisão do trabalho entre as diferentes cidades teve por consequência imediata o nascimento das manufaturas nos ramos de produção que tinham ultrapassado o sistema corporativo. O primeiro Aorescimento das manufaturas — na Itália e, mais tarde, na Flandres — teve como seu pressuposto histórico o intercâmbio com nações estrangeiras. Em outros países — Inglaterra e Fran- ça, por exemplo — as manufaturas limitaram-se inicialmente ao mercado interno, As manufaturas têm por pressuposto, além dos mencionados, ainda uma concentração já avançada da população — nomeadamente no campo — e do capital, tendo este começado 2 FNora marginal de Marx:) e os vitrais na Idade Média. so KARL MARX a acumular-se nas mãos de indivíduos, em parte nas guildas, a despeito das leis corporativas, em parte entre os comerciantes. [46] Foi o trabalho que desde o início pressupôs uma máquina, ainda que na mais tosca das formas, que muito rapidamente se mostrou o mais capaz de desenvolvimento. A tecelagem, ante- riormente exercida no campo pelos camponeses, como atividade secundária, para se proverem com o vestuário necessário, foi o primeiro trabalho a receber um impulso e uma maior evolução com a expansão do intercâmbio. A. tecelagem foi a primeira, e permaneceu a principal, manufatura. À procura de tecidos para o vestuário, que crescia à medida que aumentava a população, o começo da acumulação e mobilização do capital natural devido à circulação acelerada, a necessidade do luxo assim provocada e favorecida pela gradual expansão do intercâmbio em geral, deram à tecelagem, quantitativa e qualitativamente, um impulso que a arrancou da forma de produção precedente. A par dos campone- ses que teciam para uso próprio, os quais continuaram € ainda continuam a existis, surge nas cidades uma nova classe de tecelões cujos tecidos se destinavam a todo o mercado interno e, as mais das vezes, também a mercados estrangeiros. A tecelagem, um trabalho que na maior parte dos casos pouca habilidade exigia e que cedo se subdivide em inúmeros ramos, opunha-se, por toda a sua natureza, aos grilhões da corporação de ofício. A tecelagem foi, também por isso, exercida sem organização corporativa, principalmente em aldeias e em vilas que aos poucos se tornaram cidades e, no curto prazo, as cidades mais florescentes de cada país. Com a manufatura liberta das corporações mudaram também, imediatamente, as relações de propriedade. O primeiro progresso sobre o capital natural estamental'” verificou-se com o ascenso »s Emalemão naturwilchsig-siêndische Kapisal, Trata-se do capital que se acumulou “natu- ralmente” sob a ordem feudal 6, portanto, anterior à da expansão comercial. (N.E.B.) 8 À IDEOLOGIA ALEMÁ dos comerciantes, cujo capital era, desde o princípio, móvel, ca- pital no sentido moderno, tanto quanto as condições de então o permitiam. O segundo progresso veio com a manufatura, a qual de novo mobilizou uma massa do capital natural e, acima de tudo, aumentou a massa do capital móvel face ao natural. A manufatura tornou-se, ao mesmo tempo, um refúgio dos camponeses contra as corporações que os excluíam ou lhes pagavam mal, do mesmo modo que anteriormente as cidades das corporações haviam [servido] aos camponeses de refúgio [47] contra [a nobreza rural que os oprimia). Com o começo das manufaturas coincidiu um período de va- gabundagem, ocasionado pela dissolução das vassalagens feudais, pela desmobilização dos populosos exércitos que haviam servido os reis contra os vassalos, pelo aperfeiçoamento da agricultura e pela transformação de grandes extensões de solo arável em pastagens. Já por aqui se vê como essa vagabundagem se encontra em nítida conexão com a dissolução do feudalismo. Já no século 13 ocorrem algumas épocas dessa natureza, mas no fim do século 15 e prin- cípio do século 16 é que essa vagabundagem surge generalizada e permanentemente. Esses vagabundos, que eram tão numerosos que Henrique VIII de Inglaterra, para falar apenas dele, mandou enforcar 72.000, só com as maiores dificuldades e pela miséria mais extrema eram levados a trabalhar — e mesmo assim só ao cabo de longa resistência. O rápido florescimento das manufaruras, nomeadamente na Inglaterra, absorveu-os gradualmente. Com a manufatura, as diferentes nações entram numa relação de concorrência, numa luta comercial que se travou em guerras, proteções alfandegárias e proibições, ao passo que anteriormente as nações, tanto quanto estavam em ligação entre si, haviam pros- seguido"? uma troca inofensiva umas com as outras. De agora em diante, o comércio passa a ter importância política. w Na MEGA: realizado. (N.E.) s Kart MARX Com a manufatura, passa ao mesmo tempo a haver uma relação diferente do trabalhador com quem lhe dá trabalho LArbeitgeber). Nas corporações continuava a existir a relação patriarcal entre os oficiais e o mestre; na manufatura, ocupa o lugar daquela a relação de dinheiro entre trabalhador e capitalista; uma relação que, no campo e em pequenas cidades, conservou uma cor patriarcal, mas que nas cidades maiores, nas cidade realmente manufatureiras, desde cedo perdeu quase toda a coloração patriarcal. A manufatura, e em geral o movimento da produção, recebeu um enorme ascenso com o alargamento do intercâmbio que teve lugar com o descobrimento da América e do caminho marítimo para a Índia. Os novos produros dali importados, nomeadamente as quantidades de ouro e prata que entraram em circulação, alte- raram completamente a posição das classes umas em relação às outras e aplicaram duro golpe na propriedade fundiária feudal e nos trabalhadores, as expedições de aventureiros, a colonização e, sobretudo, a expansão agora possível, dia a dia, dos mercados até se transformarem em mercado mundial, deram origem a uma nova fase [48] do desenvolvimento histórico em que aqui, no geral, não vamos entrar. Pela colonização das terras recém-descobertas, a luta comercial das nações umas contra as outras recebeu novo alimento e, consequentemente, maior extensão e encarniçamento. A expansão do comércio e da manufatura acelerou a acumu- iação do capital móvel, enquanto nas corporações, que nenhum estímulo experimentaram para ama produção mais ampla, o capital natural permaneceu estável ou até diminuiu. O comércio e a manufatura criaram a grande burguesia, nas corporações concentrava-se a pequena burguesia, a qual agora já não domi- nava como antes nas cidades, e tinha de se dobrar ao domínio dos grandes comerciantes e proprietários de manufaturas."* Daí 1os [Nota marginal de Marx) Pequeno-burgueses [Kleinbiirger] — Ordem média [Mirtels- sand) - Grande burguesia [Grosse Bourgeoisie). e A IDEOLOGIA ALEMà submeteu a si o comércio, transformou todo o capital em capital industrial e criou assim a rápida circulação (o desenvolvimento da finança) e centralização dos capitais. Com a concorrência universal obrigou todos os indivíduos à mais intensa aplicação da sua energia. Aniquilou, tanto quanto lhe era possível, a ideologia, a religião, a moral etc., e onde não o conseguiu fez delas uma mentira palpável. Foi ela que, pela primeira vez, criou a história universal, na medida em que tornou dependentes de todo mundo todas as nações civi- lizadas e todos os indivíduos nelas existentes para a satisfação das suas necessidades, e aniquilou a exclusividade até aí narural de cada uma das nações, Subsumiu ao capital a ciência da natureza e retirou à divisão do trabalho a última aparência de naturalidade. De um modo geral, aniquilou a naturalidade, tanto quanto é possível no seio do trabalho, e dissolveu todas as relações naturais em relações de dinheiro. No lugar das cidades surgidas naturalmente criou as grandes cidades industriais modernas, nascidas de um dia para o outro", Onde penetrou, destruiu o artesanato e, de um modo geral, todas as fases anteriores da indústria. Completou a vitória [da] cidade comercial sobre o campo. [O seu primeiro pressuposto] é o sistema automático. [O seu desenvolvimento] criou uma massa de foríças produjtivas para as quais a [propriedade]"" privada se tornou um grilhão, [52] do mesmo modo que a corporação para a manufatura ea pequena oficina rural para o artesanato em desenvolvimento. Sob a propriedade privada, essas forças produtivas recebem um de- senvolvimento apenas unilateral, tornam-se forças destrutivas para a maioria, e uma grande quantidade dessas forças não podem sequer ser aplicadas na propriedade privada. Criou, em geral, por toda a parte, as mesmas relações entre as classes da sociedade, e aniquilou, por esse meio, a particularidade de cada uma das nacionalidades. E, “st Nas frases acima, o “narural” refere-se ao existente antes do desenvolvimento do comércio mundial. CÉ. nota 99 acima. (N.E.B.) O manuscrito encontra-se deteriorado nesta passagem. E Kart MARX finalmente, ao passo que a burguesia de cada nação ainda conserva interesses nacionais particulares, a grande indústria criou uma classe que, em todas as nações, tem o mesmo interesse, e na qual a nacio- nalidade está já anulada, uma classe que realmente já está livre de todo o velho mundo e, ao mesmo tempo, a ele se contrapõe. Torna insuportável para o operário não só a relação com o capitalista mas o próprio trabalho. Como se compreende, a grande indústria não atinge em todas as localidades de um país o mesmo nível de desenvolvimento. Isso, contudo, não detém o movimento de classe do proletariado, visto que os proletários criados pela grande indústria tomam a vanguar- da desse movimento e arrastam consigo toda a massa, e visto que os operários excluídos da grande indústria são atirados por essa grande indústria para uma condição de vida ainda pior do que a dos operários da própria grande indústria. Do mesmo modo atuam os países em que está desenvolvida uma grande indústria sobre os países plus ou moins [mais ou menos — francês] não indusrriais, na medida em que estes são arrastados para a luta universal de concorrência pelo intercâmbio mundial, ox Essas diferentes formas são outras tantas formas da organização do trabalho e, assim, da propriedade. Em todos os períodos teve lugar uma unificação das forças produtivas existentes, na medida em que as necessidades a tornavam necessária. [5. A contradição entre as forças produtivas e a forma de intercâmbio como base de uma revolução social] Essa contradição entre as forças produtivas e a forma de in- tercâmbio, que, como vimos, várias vezes ocorreu na história até 8 A IVEOLOGIA ALEMà os nossos dias sem, contudo, pôr em perigo o seu fundamento, teve todas as vezes de rebentar em uma revolução, assumindo então, ao mesmo tempo, várias formas secundárias, como tota- lidade de colisões, como!!? colisões de diferentes classes, como contradição da consciência, luta de ideias etc., luta política etc. A partir de um ponto de vista limitado, pode-se isolar uma dessas formas secundárias e considerá-la como a base dessas revoluções, o que é tornado mais fácil na medida em que os indivíduos dos quais partiram as revoluções se iludiram, segundo o seu grau de educação e a etapa do desenvolvimento histórico, sobre a sua própria atividade. Todas as colisões da história têm, pois, segundo a nossa concep- ção, a sua origem na contradição entre as forças produtivas e a forma de [53] intercâmbio, Não é, de resto, necessário que essa contradição tenha sido levada ao extremo em um país para conduzir a colisões nesse próprio país. À concorrência com países industrialmente mais desenvolvidos, provocada por um intercâmbio internacional am- pliado, é suficiente para criar uma contradição semelhante também em países com uma indústria menos desenvolvida (por exemplo, o proletariado latente na Alemanha, feito surgir [zur Erscheinung gebrachi] pela concorrência da indústria inglesa). I6. A concorrência dos indivíduos e a formação das classes. Desenvolvimento da contradição entre os indivíduos e as condições da sua vida. A comunidade ilusória dos indivíduos na sociedade burguesa e a unidade real dos »2 Na MEGA: esse segundo “como” (ais) fora omitido. (N.E.) so Kari MARX indivíduos no comunismo. A subjugação das condições de vida da sociedade ao poder dos indivíduos unidos] A concorrência isola os indivíduos uns contra os outros, não apenas os burgueses mas ainda mais os proletários, e isso a des- peito de agregá-los."* Daí que demore muito tempo até que esses indivíduos possam se unir, além do que os meios necessários para essa união — a fim de não ser meramente local —, as grandes cidades industriais e as comunicações baratas e rápidas, têm primeiro de ser estabelecidas pela grande indústria, e por isso só ao cabo de longas lutas se consegue vencer todo o poder organizado contraposto a esses indivíduos isolados que vivem no seio de relações que diaria- mente reproduzem o isolamento. Exigir o contrário seria o mesmo que exigir a não existência de concorrência nessa época histórica determinada, ou que os indivíduos banissem da cabeça relações sobre as quais, enquanto isolados, não têm nenhum controle. Construção de casas. Entre os selvagens, é a coisa mais natural que cada família tenha a sua própria caverna ou cabana, como entre os nômades a tenda separada de cada família. Essa econo- mia doméstica separada se torna ainda mais necessária com o desenvolvimento posterior da propriedade privada. Entre os povos agrícolas, a economia doméstica comum é tão impossível quanto a cultura comum do solo. Foi um grande progresso a construção de cidades. Em todos os períodos até hoje, entretanto, a superação [Aufhebung] da economia separada, a qual não pode se separar da superação da propriedade privada, era simplesmente impossível, dado que ainda não existiam as condições materiais para ela. À instituição de uma economia doméstica comum Igemeinsamen) vs Em alemão, zusammenbringt: vrazer para junto de tal modo a compor um todo; uma alternativa possível seria também “agregar”. (N.E.B.) 9 A JDEOLOGIA ALEMÁ pressupõe o desenvolvimento da maquinaria, da utilização das forças naturais e de muitas outras forças produtivas — por exemplo, água canalizada, [54] iluminação a gás, aquecimento a vapor etc., superação [da oposição) de cidade e campo. Sem essas condições, a economia comum não seria ela própria, por sua vez, uma nova força de produção, careceria de toda a base material, assentaria num fundamento meramente teórico, isto é, seria uma simples mania [blofe Marorte) e não passaria de economia monástica. O que foi possível revela-se na aglomeração nas cidades e na construção de casas comuns com um objetivo determinado (prisões, casernas erco). Que a superação da economia separada não pode se separar da superação da família por si mesmo se compreende. (A afirmação, tão frequente em são Max, de que cada um é, por meio do Estado, tudo o que é, é no fundo o mesmo que dizer que o burguês é apenas um exemplar da espécie burguesa;"* uma afirmação que pressupõe que a classe dos burgueses tenha se constiruído antes dos indivíduos que a constituem. !s) Os burgueses de todas as cidades eram obrigados, na Idade Média, a unir-se contra a nobreza rural para salvarem a pele; a expansão do comércio, o estabelecimento de comunicações, levou as diferentes cidades a conhecer outras cidades, as quais tinham afirmado os mesmos interesses na luta contra a mes- ma oposição. Das muitas corporações locais de burgueses de cada uma das cidades nasceu, em princípio muito gradualmente, a classe dos burgueses. As condições de vida de cada um dos burgueses, pelo Em alemão cin Exemplar der Bourgcoisgastung. Gastung é uma palavra alemá ainda à espera de uma tradução que seja universalmente aceita. A tradição anglo-saxá tem preferido “espécie”, opção também adotada pela edição portuguesa que nos serve de base, A tradição latina (os franceses, italianos e, entre nós, brasileiros, muitos marxistas) quase sempre prefere “gênero”. (N.E.B,) [Nota marginal de Marx:] Pré-existência da classe para os Eilósofos. sz KarL MARX antagonismo contra as relações vigentes e pelo tipo de trabalho por tais condições requerido, tornaram-se a todos eles comuns e, ao mes- mo tempo, independentes de cada um deles, Os burgueses tinham criado essas condições na medida em que haviam rompido com a associação feudal, e foram por elas criados na medida em que foram condicionados pelo seu antagonismo contra a feudalidade [Feudali- sá£is] que já encontraram vigente. Com o estabelecimento da ligação entre as diferentes cidades, essas condições comuns desenvolveram-se em condições de classe, As mesmas condições, a mesma oposição, os mesmos interesses, tinham também de dar origem, por toda a parte e de um modo geral, a costumes iguais. A própria burguesia, com as suas próprias condições, gradualmente se desenvolve, cinde-se de novo em diferentes frações segundo a divisão do trabalho, e acaba por absorver em si todas as classes possuidoras precedentes” (ao passo que transformou a maioria das classes não possuidoras que encontrou e uma parte das classes até aí possuidoras'"* numa nova classe, o proletariado), na medida em que toda a propriedade que encontrou é transformada em capital comercial ou industrial, Os indivíduos isolados só formam uma classe na medida [55] em que têm de travar uma lura comum contra uma outra classe; fora disso, contrapõem-se de novo hostilmente uns aos outros, na concorrência. Por outro lado, a classe autonomiza-se, face aos indivíduos, pelo que estes encontram já predestinadas as suas condições de vida, é-lhes dada [angewiesen] pela classe a sua posição na vida & com esta, o seu desenvolvimento pessoal; estão subsumidos a ela. É esse o mesmo fenômeno que a subsunção de cada um dos indivíduos à divisão do 1 “Feudalidade” por vezes comparece em Marx como a sociabilidade que ainda não co- nheceu à emancipação política, algo bem mais amplo, pois inclui todas as sociedades de classe antes do capitalismo maduro, do que o adjetivo feudal, que se refere apenas ao feudalismo. Parece ser este o caso nesta passagem. (N.E.B.) 1 [Nota marginal de Marx:] Começa por absorver os tamos de trabalho diretamente pertencentes ao Estado, e depois todos os estamentos [5t4nde) + [mais ou menos) ideológicos. v* Na MEGA: da classe até aí possuidora. (N.B.) 93 À IDEOLOGIA ALEMà Decorre de todo o desenvolvimento anterior que a relação comunitária [gemeinschafiliche Verháiltnis] em que entraram os indivíduos de uma classe, e que era condicionada pelos seus inte- resses comunitários [gemeinschafiliche Interessen) face a terceiros, foi sempre uma comunidade [Gemeinschaf?) à qual os indivíduos só pertenceram como indivíduos médios, apenas na medida em que viviam nas condições de existência da sua classe, uma relação em que eles não tomaram parte como indivíduos, mas como membros da classe 2º No caso da comunidade [Gemeinschafi) dos proletá- rios revolucionários, ao contrário, que tomam sob o seu controle as suas condições [59] de existência e as de todos os membros da sociedade, as coisas passam-se precisamente ao contrário; nela os indivíduos tomam parte como indivíduos. É justamente a união dos indivíduos (naturalmente, no quadro do pressuposto das forças produtivas agora desenvolvidas) que coloca as condições do livre desenvolvimento e movimento dos indivíduos sob o seu controle, condições que até aqui estavam abandonadas ao acaso e que haviam se autonomizado contra cada um dos indivíduos, precisamente devido à sua separação como indivíduos, devido à sua união necessária que fora dada pela divisão do trabalho e se tornara, pela sua separação, um elo que lhes era alienado. Até aqui a união era uma união (de modo algum arbitrária, como por exemplo é apresentada no Contract social? mas necessária) nessas condições (compare-se, por exemplo, a formação do Estado estadunidense e as repúblicas sul-americanas) em que os indivíduos tinham então de desfrutar do acaso, A esse direito de se poder deliciar em paz '» É importante dar-se conta que, aqui, “comunitário” e “comunidade” não se referem à sociabilidade que superou a propriedade privada, mas ao que é comum aos indivíduos de uma mesma classe, (N.E.B.) “4 Vero livro de J.J, Rousseau Di conrrace social; ou, principes di droiz politique (Sobre o contrato social; ou princípios do direito político), publicado em Amsterdã em 1762. (N.E.) 98 KARL MARX com o acaso em determinadas condições dava-se, até aqui, o nome de liberdade pessoal. — Essas condições de existência são apenas, naturalmente, as forças de produção e formas de intercâmbio de cada período. O comunismo distingue-se de todos os movimentos anteriores por transformar radicalmente [emwáitz] o fundamento de todas as relações de produção e de intercâmbio anteriores e por tratar cons- cientemente, pela primeira vez, todos os pressupostos naturais como criações dos homens anteriores, por despi-las da sua naturalidade e submetê-las ao poder dos indivíduos associados [vereinigten]. A sua instauração é, por isso, essencialmente econômica, a produção material das condições desta associação; ela faz das condições existentes condições da associação. O existente [Bestebende| que o comunismo cria é precisamente a base objetiva para tornar im- possível tudo que existe independentemente dos indivíduos, já que esse existente não passa de um produto do intercâmbio anterior dos próprios indivíduos. Os comunistas, portanto, tratam na prática como não-orgânicas [unorganische] as condições criadas pela pro- dução e intercâmbio anteriores, sem contudo imaginarem que as gerações anteriores tinham tido o plano de, ou estavam destinadas a, fornecer-lhes material, e sem acreditarem que essas condições eram não-orgânicas para os indivíduos que as criaram. [7. A contradição entre os indivíduos e as suas condições de vida como uma contradição entre as forças produtivas ea forma de intercâmbio. O desenvolvimento das forças produtivas e a mudança das formas de intercâmbio] [60] A diferença entre o indivíduo pessoal e o indivíduo casual [zufilligem Individuum) não é uma distinção conceitual, mas um fato histórico. Essa distinção tem um sentido diferente 99 A IDEOLOGIA ALEMà em tempos diferentes; por exemplo, o estamento e, plus ou moins [mais ou menos — francês] também a família, como algo casual ao indivíduo no século 18. Não é uma distinção que nós tenhamos de fazer para cada época, mas sim uma distinção que cada época faz por si própria, a partir dos diferentes elementos que encontra, e não segundo um conceito, mas forçada pelas colisões materiais da vida. O que aparece como casual numa época posterior, em oposição à anterior, e portanto também os elementos herdados [iberkommenen) da anterior, é uma forma de intercâmbio que cor respondia a determinado desenvolvimento das forças produtivas. A relação das forças de produção com a forma de intercâmbio é a relação da forma de intercâmbio com a atividade ou a atividade [Berátigung) dos indivíduos. (A forma fundamental dessa ativida- de é, naturalmente, a material, da qual dependem todas as outras: espiritual, política, religiosa etc. A diferente configuração dada à vida material depende sempre, naruralmente, das necessidades já desenvolvidas, e tanto a criação quanto a satisfação dessas ne- cessidades são, elas próprias, um processo histórico que não se encontra nem no carneiro nem no cão (renitente argumento prin- cipal de Stirner' adversus hominem [contra o homem -— latim]), embora os carneiros e os cães sejam por certo, na sua forma atual, mas malgré eux [apesar deles — francês], produtos de um processo histórico). As condições em que os indivíduos, enquanto [61] não surgiu ainda a contradição, mantêm intercâmbio uns com os outros são condições que pertencem à sua individualidade, e não algo de exterior a eles, condições em que só esses determinados indivíduos, existindo em determinadas relações, podem produzir a sua vida material e o que com ela se relaciona, são portanto as condições da sua autoarividade [Selbsthesátigung] e são produ- s Trata-se das ideias de M. Stirner no seu artigo “Recensões sobre Stirner”, publicado no HK como da revista Wigand': Vierseljabrsschrifi, 1845, p. 187. (N.E) 100 KARL MARX zidas por essa autoatividade'. Essa condição determinada em que produzem corresponde, portanto, enquanto a contradição ainda não surgiu, à sua real condicionalidade, à sua existência unilateral, tal unilateralidade só se revela com o aparecimento da contradição e, portanto, só existe para as gerações posteriores. Então essa condição surge como um grilhão casual, e então a consciência de que é um grilhão é também dissimuladamente imputada [untergeschoben] à época anterior, Essas diferentes condições, que surgiram primeiro como condi- ções da autoatividade e mais tarde como grilhões, formam em todo o desenvolvimento histórico uma série conexa [zusammenhangende Reibe) de formas de intercâmbio, cuja conexão reside em que no lugar da forma de intercâmbio anterior, tornada um grilhão, é posta uma nova forma de intercâmbio que corresponde a forças produtivas mais desenvolvidas — e, assim, ao tipo mais avançado de autoatividade dos indivíduos — e que, à sor tour [por sua vez — francês), de novo se torna um grilhão e será substituída por ou- tra. Como, em todas as etapas, essas condições correspondem ao desenvolvimento simultâneo das forças produtivas, a sua história é, pois, ao mesmo rempo, a história das forças produtivas em de- senvolvimento e herdadas por cada nova geração e, desse modo, a história do desenvolvimento das forças dos próprios indivíduos. Como esse desenvolvimento se processa naturalmente [na- turwiichsig], ou seja, não está subordinado a um plano global de indivíduos livremente associados, ele parte de diferentes localidades, tribos, nações, ramos de trabalho etc., cada um dos quais em princípio se desenvolve independentemente dos outros e só aos poucos em ligação com os outros. Além disso, só muito lentamente se processa esse desenvolvimento; as diferen- tes etapas e interesses nunca são completamente ultrapassados, mas apenas subordinados ao interesse triunfante, e a par deste »s [Nota marginal de Marx] Produção da própria forma de intercâmbio. 101 À IDEOLOGIA ALEMà se arrastam ainda ao longo de séculos. Daqui decorre que, mesmo no seio de uma nação, os indivíduos tenham, mesmo sem considerarmos as condições de posses, desenvolvimentos completamente diferentes, e que um interesse anterior, cuja forma de intercâmbio característica já tenha sido desalojada pela de um posterior, ainda por longo tempo continue na pos- se de um poder tradicional na comunidade aparente (Estado, direito) que se autonomizou em relação aos indivíduos, poder esse que, em última instância, só se quebrará por meio de uma revolução. Assim se explica também por que razão em relação a alguns pontos [62], que permitem um resumo mais geral, a consciência pode por vezes parecer ter avançado mais do que as relações empíricas que lhe são contemporâneas, de tal modo que nas lutas de uma época posterior as pessoas podem apoiar- se em teóricos anteriores como autoridades. Ao contrário, o desenvolvimento processa-se muito rapi- damente em países que, como a América do Norte, têm o seu começo numa época histórica já desenvolvida. Tais países não têm outros pressupostos naturais além dos indivíduos que neles se fixam, a isso levados pelas formas de intercâmbio dos velhos países que não correspondem às suas necessidades. Começam, portanto, com os indivíduos mais avançados dos velhos países e, por isso, com a forma de intercâmbio mais desenvolvida que corresponde a esses indivíduos ainda antes de essa forma de in- tercâmbio se poder afirmar nos velhos países. É esse o caso com todas as colônias, desde que não sejam meras estações militares ou comerciais. Cartago, as colônias gregas e a Islândia nos séculos 11 e 12 fornecem-nos exemplos disso. Uma relação semelhante tem lugar na conquista, quando uma forma de intercâmbio desenvolvida em outro solo é transferida já pronta para o país conquistado; ao passo que na sua terra de origem estava ainda enleada em interesses e relações de épocas anteriores, aqui pode e tem de ser estabelecida completamente e sem obstáculo, até para 102 Kant MARX assegurar aos conquistadores um poder duradouro. (A Inglaterra e Nápoles depois da conquista normanda,” quando receberam a forma mais acabada da organização feudal.) [8. O papel da violência (conquista) na história] O faro da conquista parece contradizer toda essa concepção da história. Até agora fez-se da violência, da guerra, da pilhagem, da rapinagem sangrenta etc. a força que move a história. Aqui só podemos nos timitar aos pontos principais, e pegamos por isso apenas o exemplo mais marcante, a destruição de uma velha ci- vilização por um povo bárbaro c a formação de uma nova estrutura de sociedade que dela parte. (Roma e os bárbaros, feudalidade e Gália, o império romano do Oriente e os Turcos."” [63] Para o povo bárbaro conquistador, a própria guerra já é, como já atrás referido, uma forma regular de intercâmbio, que é tanto mais ardentemente explorada quanto mais o crescimento da população cria a necessida- de de novos meios de produção no modo de produção rudimentar tradicional que é, para essa população, o único possível. Na Itália, ao contrário, por meio da concentração da propriedade fundiária (causada, não só pela compra e endividamento, mas também por herança, na medida em que, com a grande devassidão e os raros casamentos, as velhas gerações gradualmente se extinguiram e a sua propriedade veio à posse de uns poucos) e da transformação desta em pastagens (que foi causada, além das causas econômicas habituais e ainda hoje válidas, pela entrada de cereais roubados e pagos como tributo, e pela falta daqui resultante de consumidores para o cereal italiano), a população livre quase desaparecera e os próprios escravos morriam continuamente e tinham de ser sempre “7 A Inglarerra foi conquistada pelos normandos em 1066; Nápoles, em 1130. (NE) =» Na MEGA: marcante (fiappantô. (N.E) =» Império Romano do Oriem stado que em 395 se separou do império romano escravista, com centro em Constantinopla; posteriormente passou a chamar-se Bizâncio; existiu até 1453, ano em que foi conquistado pelos turcos. (N.E.) A IDEOLOGIA ALEMà valer ainda como um tipo subordinado de autoarividade, agora elas divergem tanto uma da outra que, de fato, a vida material surge como fim, e a produção dessa vida material, o trabalho (o qual é agora a única forma possível mas, como vemos, negativa de autoatividade), como meio. [10. A necessidade, as condições e as consequências da abolição da propriedade privada] Chegou-se agora, portanto, a um ponto tal que os indivíduos têm de apropriar-se da totalidade existente das forças produtivas, não só para alcançarem a sua autoatividade, mas principalmente para assegurarem a sua existência. Essa apropriação é requerida [bedingt), primeiro, pelo objeto a apropriar — as forças produtivas desenvolvidas até uma totalidade e apenas existentes no seio do intercâmbio universal. Essa apropriação tem, portanto, e desde logo por esse motivo, de ter um caráter universal, correspondente às forças produtivas e ao intercâmbio. A apropriação dessas forças nada mais é, ela mesma, do que o desenvolvimento das capaci- dades individuais correspondentes aos instrumentos da produção material, A apropriação de uma totalidade de instrumentos de produção é desde logo, por isso, o desenvolvimento de uma tota- lidade de capacidades nos próprios indivíduos. Essa apropriação é, além disso, requerida [bedingt] pelos indivíduos que apropriam. Só os prolerários do presente, completamente excluídos de toda a autoatividade, estão em condições de realizar a sua completa autoatividade, não mais limitada, a qual consiste na apropriação de uma totalidade de forças produtivas e no desenvolvimento, assim iniciado, de uma totalidade de capacidades. Todas as an- teriores apropriações revolucionárias foram limitadas: indivíduos cuja autoatividade era limitada por um instrumento de produção limitado e por um intercâmbio restrito apropriaram-se desse limi- tado instrumento [67] de produção e, por isso, apenas o levaram a uma nova limitação. O seu instrumento de produção tornou-se 108 Kart MARX propriedade sua, mas eles próprios continuaram subsumidos à divisão do trabalho e ao seu próprio instrumento de produção. Em todas as apropriações até hoje realizadas, uma massa de indivíduos continuou subsumida a um único instrumento de produção: no caso da apropriação dos proletários, uma massa de instrumentos de produção tem de ser subsumida a cada indivíduo e a propriedade tem de ser subsumida a todos. O intercâmbio universal moderno só pode ser subsumido aos indivíduos de uma maneira: sendo subsumido a todos os indivíduos. Além disso, a apropriação é condicionada pelo modo como tem de ser realizada. Só pode ser realizada por meio de uma união, a qual, pelo caráter do próprio proletariado, só pode ser, por sua vez, uma união universal, e por uma revolução em que, por um lado, é derrubado o poder do modo de produção e de intercâmbio e da organização social anteriores e, por outro lado, se desenvolvem o caráter universal do proletariado e a sua energia necessária para levar a cabo a apropriação, e em que, além disso, o proletariado deixa para trás tudo o que ainda lhe ficou da sua posição anterior na sociedade. Só nessa etapa a autoatividade coincide [zusammen] com a vida material, o que corresponde ao desenvolvimento dos indivíduos para indivíduos totais e ao deixar para trás toda a naturalida- de [Naturwiichsigkeit], e então correspondem-se uma à outra a transformação do trabalho em autoatividade e a transformação do requerido intercâmbio anterior no intercâmbio dos indivíduos enquanto tais. Com a apropriação das forças produtivas totais pelos indivíduos associados [vereinigten] cessa a propriedade privada. Enquanto, na história anterior, uma condição particular aparecia sempre como acidental, agora tornou-se acidental o isolamento dos próprios indivíduos, a própria remuneração privada [Privaterwer] particular de cada um. Os filósofos têm-se representado como ideal, sob o nome de “o Homem”, os indivíduos que já não estão subsumidos [68] à divisão À IDEOLOGIA ALEMà do trabalho, e têm tomado todo o processo por nós desenvolvido como o processo de desenvolvimento “do Homem”, pelo que até hoje, em todas as etapas históricas, “o Homem” foi substituído pelos indivíduos e apresentado como a força motora da história. Todo o processo foi assim tomado como processo de autoalienação “do Homem”, e isso essencialmente porque o indivíduo médio da etapa posterior [foi] sempre substituído à anterior, e a consciên- cia posterior aos indivíduos anteriores. Por meio dessa inversão, que desde o princípio abstrai das condições reais, foi possível transformar toda a história num processo de desenvolvimento da consciência, ek A sociedade civil' compreende todo o intercâmbio material dos indivíduos numa determinada etapa do desenvolvimento das forças produtivas. Compreende toda a vida comercial e industrial de uma etapa, e nessa medida transcende o Estado e a nação, embora, por outro lado, tenha de se fazer valer em relação ao exterior como nacionalidade e de se articular como Estado em relação ao interior. O termo sociedade civil [biirgerliche Gesellschafz) surgiu no século 18, quando as relações de propriedade já tinham se desembaraça- do da comunidade antiga e medieval. A sociedade civil como tal apenas se desenvolve com a burguesia; a organização social que se desenvolve a partir diretamente da produção e do intercâmbio, e que em todos os tempos forma a base do Estado e da restante superestrutura idealista [Idealistichen Superestruleturºs, continuou sempre, no entanto, a ser designada com o mesmo nome. & [Nota marginal de Marx) Autoalienação. &º Cf nora 42, p.41.(NE.B) 26 Isto é: ideal, ideológica. no Kari MARX [11] Relação do Estado e do direito com a propriedade A primeira forma da propriedade é, tanto no mundo antigo quanto na Idade Média, a propriedade tribal, condicionada entre os romanos principalmente pela guerra, entre os germanos pela criação de gado. Entre os povos antigos, porque numa cidade vivem juntas várias tribos, a propriedade tribal surge como pro- priedade do Estado, e o direito do indivíduo a ela como mera possessio [posse, tomada de posse — latim] a qual, no entanto, como a propriedade tribal em geral, se confina apenas à proprie- dade fundiária. A verdadeira propriedade privada começa, entre os antigos como entre os povos modernos, com a propriedade móvel. (Escravatura e comunidade [Gemeiwesen]) (dominium ex jure Quiritum [Trata-se da propriedade do antigo cidadão romano garantida por lei — latim]). Entre os povos que provêm da Idade Média, a propriedade tribal desenvolve-se, através de várias etapas — propriedade fundiária feudal, propriedade móvel corporativa, capital manufatureiro — até o capital moderno, re- querido pela grande indústria « pela concorrência universal, até a propriedade privada pura, que deixou para trás toda a aparência de uma comunidade e excluiu toda a intervenção do Estado sobre o desenvolvimento da propriedade. A essa propriedade privada moderna corresponde o Estado moderno, o qual, gradualmente, por meio dos impostos, foi adquirido pelos proprietários privados e, por meio das dívidas públicas, ficou completamente à mercê destes, e cuja existência, nas subidas e quedas dos papéis do Estado na Bolsa, ficou totalmente dependente do crédito comercial que os proprietários privados, os burgueses, lhe concedem. Porque é uma classe, e não mais um estamento, a burguesia é obrigada, desde cedo, a organizar-se nacionalmente, e já não localmente, e a dar ao seu interesse médio uma forma geral. Pela emancipação da propriedade privada em relação à comunidade, o Estado adquiriu uma existência particular a par, e fora, da sociedade civil; mas ele nada mais é do que a forma de organização que os burgueses m A DEOLOGIA ALEMà se dão, tanto externa quanto internamente, para garantia mútua da sua propriedade e dos seus interesses. A autonomia do Estado ocorre, hoje em dia, apenas em países em que os estamentos não se desenvolveram completamente em classes, em que os estamen- tos, eliminados nos países mais adiantados, ainda desempenham um certo papel e ainda existe uma mistura; países nos quais, por isso, nenhuma parte da população consegue o domínio sobre as restantes. É esse o caso nomeadamente na Alemanha. O exemplo mais acabado do Estado moderno é a América do Norte [70]. Os escritores franceses, ingleses e americanos mais recentes manifestam todos a opinião de que o Estado só existe por causa da propriedade privada, pelo que isso passou também à consciência geral. Como o Estado é a forma em que os indivíduos de uma classe dominante fazem valer os seus interesses comuns e se condensa toda a sociedade civil de uma época, segue-se que todas as instituições comuns [gemeinsamen] que adquirem uma forma política, são mediadas pelo Estado. Daí a ilusão de que a lei assentaria na vontade e, mais ainda, na vontade dissociada da sua base real, na vontade /ivre. Do mesmo modo o direito é, por sua vez, reduzido à lei. O direito privado desenvolve-se, simultaneamente com a propriedade privada, a partir da dissolução da comunidade natural. Entre os romanos, o desenvolvimento da propriedade privada e do direito privado não teve consequências industriais e comerciais posteriores, porque todo o seu modo de produção permaneceu o mesmo.'” Entre os povos modernos, onde a co- munidade feudal foi dissolvida pela indústria e pelo comércio, começou com o aparecimento da propriedade privada e do direito privado uma nova fase, capaz de desenvolvimento pos- terior. Logo a primeira cidade que na Idade Média realizou um [Nota marginal de Engels:] (Usura!) n2 KARL MARX extenso comércio marítimo, Amalfi, formou também o direito marítimo? Assim que, primeiro na Itália e mais tarde noutros países, a indústria e o comércio deram novo desenvolvimento à propriedade privada, foi logo retomado e elevado à autoridade o Direito privado romano, que já estava desenvolvido. Quando, mais tarde, a burguesia tinha alcançado tanto poder que os prín- cipes fizeram seus os interesses dela, para derrubarem, por meio da burguesia, a nobreza feudal, começou em todos os países — na França no século 16 — o verdadeiro desenvolvimento do Direito, que em todos os países [71], à exceção da Inglaterra, se processou com base no código romano. Também na Inglaterra tiveram de ser introduzidos princípios do Direito romano para um maior desenvolvimento do Direito privado (especialmente no caso da propriedade móvel). (Não esquecer que o Direito, como a religião, não tem uma história própria.) No Direito privado, as relações de propriedade vigentes são ditas [ausgesprochen] como resultado da vontade geral. O próprio jus utendi et abutendi [direito de usar e dispor arbitrariamente — latim] exprime, por um lado, o fato de que a propriedade se tornou completamente independente da comunidade, e, por outro lado, a ilusão de que a própria propriedade privada assentaria na mera vontade privada, na disposição arbitrária da coisa. Na prática, o abuti [o dispor arbitrariamente — latim] tem barreiras econômicas muito determinadas para o proprietário privado, se este não quiser ver a sua propriedade e, como ela, o seu jus abutendi passar para outras mãos, porque a verdade é que a coi- sa, considerada meramente em relação com a sua vontade, não é coisa nenhuma, mas só se torna uma coisa, propriedade real, no intercâmbio, e independentemente do Direito (uma relação a ss A cidade italiana de Amalf foi nos séculos 10-11 um próspero centro de cométcio. O Direito marítimo da cidade de Amalfi (Tabuia Amalphitana) vigorava em toda a Itália e teve uma ampla difusão nos países do Mediterrâneo, (N.E.) us KARL MARX 1. AD FEUERBACH (18454 1. O principal defeito de todo o materialismo existente até agora (o de Feuerbach incluído) é que o objeto /Gegenstandl), a realidade, o sensível, só é apreendido sob a forma do objeto [Objekr] ou da con- templação, mas não como atividade humana sensível, como práticas não subjetivamente. Daí o lado ativo, em oposição ao materialis- mo, [ter sido] abstratamente desenvolvido pelo idealismo — que, naturalmente, não conhece a arividade real, sensível, como tal. Feuerbach quer objetos sensíveis fsinnliche Objekte), efetivamente diferenciados dos objetos do pensamento: mas ele não apreende a própria atividade humana como atividade objetiva /gegenstindliche Tátigheit). Razão pela qual ele enxerga, n/à essência do cristianismo, apenas o comportamento teórico como o autenticamente humano, enquanto a prática é apreendida e fixada apenas em sua forma de manifestação judaica, suja. Ele não entende, por isso, o significado da atividade “revolucionária”, “prático-crítica”. 2. A questão de saber se ao pensamento humano cabe alguma verdade objetiva /gegenstândliche Wahrheit] não é uma questão da teoria, mas uma questão prática. Éna prática que o homem tem de » À presente tradução das teses “Ad Feuerbach” foi gentilmente cedida pela Boitempo Editorial. Elas são parte do livro Marx, Karl e Engels, Friedrich, A ideologia alemã, Boitempo editorial, São Paulo, 2007. Tradução de Rubens Enderie, Nélio Schneider e Luciano Cavini Martorano, pp. 533-539. (N.E.B.) À IDEOLOGIA ALEMà provar a verdade, isto é, a realidade e o poder, a natureza citerior [Diesseitigkeit] de seu pensamento. A disputa acerca da realidade ou não-realidade do pensamento — que é isolado da prática — é uma questão puramente escolástica. 3. A doutrina materialista sobre a modificação das circunstâncias e da educação esquece que as circunstâncias são modificadas pelos homens e que o próprio educador tem de ser educado. Ela tem, por isso, de dividir a sociedade em duas partes — a primeira das quais está colocada acima da sociedade. A coincidência entre a alteração) das circunstâncias e a ati- vidade ou automodificação humanas só pode ser apreendida e racionalmente entendida como prática revolucionária. 4. Feuerbach parte do fato da autoalienação /Selbstentfremdung] religiosa, da duplicação do mundo / Welt] num mundo religioso e num mundo mundano fweltliche). Seu trabalho consiste em dissolver o mundo religioso em seu fundamento mundano. Mas que o fundamento mundano se destaque de si mesmo e construa para si um reino autônomo nas nuvens pode ser esclarecido apenas a partir do autoesfacelamento e do contradizer-a-si-mesmo desse fundamento mundano. Ele mesmo, portanto, tem de ser tanto compreendido em sua contradição quanto revolucionado na prá- tica. Assim, por exemplo, depois que a terrena família é revelada como o mistério da sagrada família, é a primeira que tem, então, de ser teórica e praticamente eliminada. 5. Feuerbach, não satisfeito com o pensamento abstrato, quer a contemplação LAnschauung]; mas ele não compreende o sensível (die Sinnlichkeit] como atividade prática, humano-sensível. 120 Kant MARX 6. Feuerbach dissolve a essência religiosa na essência humana. Mas a essência humana não é uma abstração intrínseca ao indivíduo isolado. Em sua realidade, ela é o conjunto das relações sociais. Feuerbach, que não penetra na crítica dessa essência real, é forçado, por isso: 1a fazer abstração do curso da história, fixando o sentimen- to religioso para si mesmo, e a pressupor um indivíduo humano abstrato — isolado; 2 — por isso, a essência só pode ser apreendida como “gênero”, como generalidade interna, muda, que une muitos indivíduos de modo natural. 7. Feuerbach não vê, por isso, que o próprio “sentimento religio- so” é um produto social e que o indivíduo abstrato que ele analisa pertence a uma determinada forma de sociedade. 8. Toda vida social é essencialmente prática. Todos os mistérios que conduzem a teoria ao misticismo encontram sua solução ra- cional na prática humana e na compreensão dessa prática. 9. O máximo a que chega o materialismo contemplarivo, isto é, o materialismo que não concebe o sensível como atividade prá- tica, é a contemplação dos indivíduos singulares e da sociedade burguesa. 10. O ponto de vista do velho materialismo é a sociedade burguesa; o ponto de vista do novo é a sociedade humana, ou a humanidade socializada. 121 IL KARL MARX Os filósofos apenas interpretaram o mundo de diferentes ma- MARX SOBRE FEUERBACH (1845) neiras; o que importa é transformá-lo. ICOM ALTERAÇÕES DE ENGELS, 1888] 1. O principal defeito de todo o materialismo existente atéagora — o de Feuerbach incluído — é que o objeto /Gegenstand], a realidade, o sensível, só é apreendido sob a forma do objeto fObjekt] ou da con- templação; mas não como atividade humana sensível, como prática, não subjetivamente. Daí decorreu que o lado axivo, em oposição ao materialismo, foi desenvolvido pelo idealismo — mas apenas de modo abstrato, pois naturalmente o idealismo não conhece a atividade real, sensível, como tal. Feuerbach quer objetos sensíveis finnliche Objekte] efetivamente diferenciados dos objetos do pensamento; mas ele não apreende a própria atividade humana como atividade objetiva [eegenstindliche Tiátigheit], Razão pela qual ele enxerga, nº 4 essência do cristianismo, apenas o comportamento teórico como o autentica- mente humano, enquanto a prática é apreendida e fixada apenas em sua forma de manifestação judaica-suja. Ele não entende, por isso, o significado da atividade “revolucionária”, prático-crítica”. 2. A questão de saber se ao pensamento humano cabe alguma verdade objetiva /gegenstândliche Wahrheit] não é uma questão da teoria, mas uma questão prática. Na prática tem o homem de provar a verdade, isto é, a realidade e o poder, a natureza citerior [Diesseitigkeit] de seu pensamento. À disputa acerca da realidade
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