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A TEORIA DE KARL MARX, Esquemas de História

INTRODUÇÃO. Karl Marx nasceu em 1818, em Treves, na Alemanha, no seio de uma família judia. No aspecto filosófico, Marx foi influenciado por Hegel, ...

Tipologia: Esquemas

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Barros32
Barros32 🇧🇷

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Baixe A TEORIA DE KARL MARX e outras Esquemas em PDF para História, somente na Docsity! A TEORIA DE KARL MARX ARLINDO ALEGRE DONÁRIO RICARDO BORGES DOS SANTOS Universidade Autónoma de Lisboa CARS – Centro de Análise Económica de Regulação Social Maio de 2016 A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 2 A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 5 cada indivíduo tem uma atitude positiva em relação à orientação da sua “ideologia”, a qual se pode alterar com o conhecimento e a experiência da vida. A equação pessoal influencia, determinantemente, o comportamento do indivíduo, variando espacial e diacronicamente. Ela é dinâmica, o que implica que novos conhecimentos, crenças e valores incutidos no indivíduo alteram o seu comportamento…. A cultura é crucial para entender o comportamento humano. Os indivíduos adquirem crenças e valores através das relações de alteridade, com os outros com quem contactam, de forma directa ou indirecta, pelo que se deve ter em consideração esta realidade. As ideias culturalmente adquiridas são importantes para explicar uma vasta gama do comportamento humano – opiniões, crenças, atitudes, hábitos de pensamento, estilos artísticos, tecnologia, bem como, regras sociais e instituições políticas.”4. 4 Donário, Arlindo; Ricardo Borges dos Santos (2014:5) - Reflexões em economia. Conceitos fundamentais - Centro de Análise Económica de Regulação Social (CARS), Universidade Autónoma de Lisboa. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 6 O MATERIALISMO DIALÉCTICO Quanto ao materialismo dialéctico, diz Marx: “A mistificação que a dialéctica sofre nas mãos de Hegel não impede, de modo algum, que ele tenha sido o primeiro a expor as suas formas gerais de movimento, de maneira ampla e consciente. É necessário invertê-la, para descobrir o cerne racional dentro do invólucro místico…. O movimento, repleno de contradições, da sociedade capitalista faz-se sentir ao burguês prático de modo mais contundente nos vaivéns do ciclo periódico que a indústria moderna percorre e em seu ponto culminante — a crise geral.”5. Hegel considerava que a Ideia, a Razão, é a substância de toda a vida natural e espiritual. Logo, todo o real é racional e, por conseguinte, também a História se desenha racionalmente, desenvolvendo-se com uma lógica racional, com um sentido. Os vários aspectos da realidade fazem parte de um todo continuamente em evolução dinâmica. Esta evolução faz-se através do conflito de elementos opostos, o que se traduz na dialéctica. Vejamos em que consiste o método dialéctico no sentido Hegeliano. O espírito começa por formular uma afirmação que constitui a tese. A esta tese, o espírito começa a desenvolver um conjunto de objecções, chegando a uma afirmação contrária da primeira, que constitui a antítese. Do confronto entre a tese e a antítese, o espírito desenvolve um esforço no sentido para encontrar uma nova afirmação que constitui a síntese. Esta síntese passa a constituir uma nova tese, a qual se começam a levantar novas objecções, e assim por diante. Marx, sendo hegeliano de formação, aplica o seu método não ao mundo das ideias mas à realidade material. Marx é materialista, contrariamente a Hegel que é idealista. No materialismo foi inspirado por Feuerbach, para quem só a 5 Marx, K. (1873:140-141) - Posfácio da Segunda Edição de O Capital (1873). A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 7 matéria existia. Ao materialismo, Marx aplica a dialéctica e com base no materialismo dialéctico constrói o seu modelo de desenvolvimento. Segundo Engels: “É pois da história da natureza e da sociedade humana que as leis da dialéctica são abstraídas. Elas não são outra coisa que as leis mais gerais das duas fases do desenvolvimento histórico assim como o próprio pensamento. Elas reduzem- se, no essencial, às três seguintes leis: • a lei da passagem da quantidade à qualidade e inversamente; • a lei da interpenetração dos contrários; • a lei da negação da negação.”6. A concepção do materialismo de Marx pode ser analisada na sua obra em co-autoria com Engels, A Ideologia Alemã, onde é referido: “Podemos observar a história de dois pontos de vista e dividi-la na história da natureza e na história da humanidade. Os dois pontos de vista são, contudo, inseparáveis; a história da natureza e a história dos humanos são dependentes uma da outra desde que a humanidade existe.”7. 6 Engels - Dialectique de la nature - Paris, Editions sociales, 1971, pp. 69-71. 7 Marx; Engels (1845/1846) – L'Ideologie Allemande – “L'histoire peut être examinée sous deux aspects. On peut la scinder en histoire de la nature et histoire des hommes. Les deux aspects cependant ne sont pas séparables ; aussi longtemps qu’existent des hommes, leur histoire et celle de la nature se conditionnent réciproquement..”. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 10 De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações convertem- se em obstáculos a elas. E abre-se, assim, uma época de revolução social. Ao mudar a base económica, revoluciona-se, mais ou menos rapidamente, toda a imensa superestrutura erigida sobre ela.”11. Marx entendia que as forças produtivas da sociedade evoluem mais rapidamente que as relações de produção, entrando em conflito com as relações de produção pelo que, a partir de certo ponto, o sistema encontra-se bloqueado. Abre-se então, diz Marx, "uma época de revolução social" que tem por função fazer desaparecer as antigas relações de produção e permitir o aparecimento de novas relações de produção mais conformes com o nível de desenvolvimento atingido pelas forças produtivas, as quais evoluem dinamicamente e a ritmos diferentes nas várias sociedades. Um modo de produção não se confunde com uma sociedade determinada, com apenas um modelo abstracto que permite analisar as suas características fundamentais dessa sociedade. É através da luta de classes (traduzindo o processo dialéctico) no entender de Marx, que a sociedade evolui, conforme refere no “Manifesto Comunista" (1848)12, utilizando na sua análise o materialismo dialéctico. A sociedade, como realidade material que é, contém em si contradições internas, que se manifestam no modo diferente de evolução da base material (infra-estrutura) e da superestrutura, levando a transformações qualitativas desta superestrutura no sentido de se adequar ao nível de desenvolvimento das forças produtivas. A compreensão do funcionamento de uma sociedade repousa, para Marx, sobre a análise da sua estrutura económica (a infra-estrutura da sociedade). É esta que determina, em última instância, a superestrutura constituída pelas formas jurídicas, politicas, artísticas ou filosóficas, próprias de uma determinada sociedade, num determinado período histórico, variando diacronicamente. Para Marx, a lei e a política traduzem a implementação do que a estrutura económica requer e a estrutura económica representa o que é requerido pelas forças produtivas. 11 Idem – Tradução nossa. 12 Marx, Karl (1848 :161) – Le Manifeste Communiste - Oeuvres - Bibliothèque de la Peiade. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 11 Marx, no livro primeiro de O Capital, começa por analisar a o conceito de mercadoria: “À primeira vista, a mercadoria parece uma coisa trivial, evidente. Analisando-a, vê-se que ela é uma coisa muito complicada, cheia de subtileza metafísica e manhas teológicas. Como valor de uso, não há nada misterioso nela, quer eu a observe sob o ponto de vista de que satisfaz necessidades humanas pelas suas propriedades, ou que ela apenas recebe essas propriedades como produto do trabalho humano. É evidente que o homem por meio de sua actividade modifica as formas das matérias naturais de um modo que lhe é útil.”13. 13 Marx, Karl [(1867:197)1996] - O Capital - Editora Nova Cultural - Volume I. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 12 A TEORIA DO VALOR A teoria do valor foi desenvolvida por Adam Smith e por David Ricardo, tendo Marx aprofundado essa teoria e tirado da mesma, determinadas ilações que não foram retiradas por aqueles autores. Tal como Smith e Ricardo, Marx diz que a utilidade de um objecto constitui o seu valor de uso, que é independente da quantidade de trabalho requerida para o produzir, o que já foi referido por Aristóteles. O valor de troca, diz Marx, é constituído pela quantidade de trabalho abstracto, socialmente necessário para a sua produção. Se se abstrai do valor de uso das mercadorias, estas têm apenas uma propriedade em comum, a de serem produtos do trabalho humano, independentemente da forma de trabalho concreto. Nisto consiste o trabalho abstracto, que se consubstancia numa actividade do ser humano, independentemente da sua forma. Em certo sentido, Marx combina Aristóteles e Adam Smith quanto à questão de valor de uso e de valor de troca, considerando que o trabalho abstracto é a substância do valor de troca. Todas as mercadorias são transaccionáveis porque são o produto do trabalho humano, ou seja, o trabalho humano actual, materializado nas mercadorias, é o que torna as mercadorias comercializáveis. Os capitalistas compram a força de trabalho ou a capacidade de trabalho dos trabalhadores (ou capital humano), a qual é uma mercadoria, cujo valor é determinado como a de qualquer outra mercadoria. Deste modo, a força de trabalho, ao actualizar-se através do trabalho concreto, cristaliza-se no produto resultante desse trabalho, ultrapassando a questão já colocada por Aristóteles quanto à comparabilidade de duas mercadorias diferentes. Marx resolve esta questão colocada por Aristóteles, dizendo que é o trabalho humano cristalizado nas mercadorias que as torna comparáveis, expressando o seu valor de troca. Por outro lado, seguindo Smith, Marx refere que é o tempo de trabalho abstracto que determina a magnitude do seu valor. O valor de uma mercadoria é somente expresso ou revelado quando é trocado por outra mercadoria ou quando é vendido através da moeda. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 15 Marx, contrariamente a Adam Smith, considerava que o salário de subsistência (o salário natural para Smith e Ricardo) evoluía ao longo da história, o que Ricardo também considerava. Marx enfatizou, também, que o salário real dos trabalhadores poderia ser aumentado através da sua luta: “Ele (o trabalhador) não tem outro recurso senão tentar impor, em alguns casos, um aumento dos salários, ainda que seja apenas para compensar a baixa em outros casos. Se espontaneamente se resignasse a acatar a vontade, os ditames do capitalista, como uma lei económica permanente compartilharia de toda a miséria do escravo, sem compartilhar, em troca, da segurança deste…. Falar da luta pelos salários independentemente de todas as circunstâncias; não senão a variação dos salários; não ter em conta as outras variações das quais ela resulta, é partir de premissas falsas para chegar a conclusões falsas.”14. Esta posição de Marx contrasta com a posição de Lassalle, que ficou conhecida por lei de bronze dos salários, segundo a qual os salários deviam cair, inevitavelmente, para o nível mínimo de subsistência física dos trabalhadores. Também segundo a tese do “fundo de salários” defendida por John Stuart Mill, segundo a qual, em cada situação dada, existe um fundo pré-fixado para os salários, pelo que seria inútil tentar alterá-lo e obter maiores salários reais por meio do aumento dos salários nominais. Estas posições de Lassalle e de Stuart Mill são determinísticas levando, se aceites, a que os trabalhadores se conformem com a situação em cada momento, permitindo uma sobre-exploração, quer através da criação de mais-valia extensiva – com o prolongamento do horário de trabalho mantendo os mesmos salários – quer com a criação da mais-valia relativa, traduzida numa maior intensidade de trabalho dentro do mesmo horário de trabalho. 14 Marx (1865:526-527) – Salaire, Prix et Plus-value, in Oeuvres. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 16 De acordo com Marx, a luta dos trabalhadores pode levar a um aumento dos salários reais, dentro do sistema capitalista, nomeadamente, de forma a manter a repartição relativa do rendimento entre os trabalhadores e os capitalistas. TEORIA DA MAIS-VALIA Com base na teoria do valor-trabalho que, como já referido, foi desenvolvida por Adam Smith e David Ricardo, e que já vem de Aristóteles, Marx desenvolveu a teoria da mais-valia. Para compreender esta teoria é necessário que se tenha em conta que o valor criado no processo produtivo é superior ao valor da força de trabalho, dividindo-se em duas partes: a) Uma que corresponde ao valor da força de trabalho, como mercadoria, que se traduz, em termos concretos, no salário, e que constitui o custo de produção da força de trabalho na óptica do capitalista (e que constitui rendimento para o trabalhador); b) Outra parte do valor criado no processo produtivo que excede o valor da força de trabalho e que é propriedade do capitalista. A este excedente do valor criado pelo trabalhador sobre o valor recebido chama Marx a mais-valia e que, através da sua realização (venda das mercadorias) se transforma em lucro em sentido lato, tomando as formas de lucro em sentido restrito, de juros e de rendas. Por realização da mais-valia, sua transformação em lucro, entende-se a venda dos bens e serviços produzidos. Sem realização da mais-valia não existe lucro, o que explica a busca de mercados para as mercadorias por parte das empresas. Por exemplo, se o custo de produção de um trabalhador for equivalente a 5 horas de trabalho diário (traduzidos nos salários) e este trabalhador trabalhar 8 horas por dia, o valor criado é de 8 horas de trabalho, que corresponde a um determinado valor monetário superior ao salário recebido pelo trabalhador. A diferença entre o valor criado - 8 horas de trabalho - e o valor recebido pelo trabalhador (na forma de salário) – 5 horas de trabalho - é a mais-valia, que no A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 17 exemplo dado é de 3 horas de trabalho, que, através da realização (venda das mercadorias) se transforma em lucro. Deste modo, a mais-valia é a fonte do lucro, em sentido lato (englobando o lucro em sentido restrito, os juros e as rendas). Com efeito, o valor da força de trabalho, que tendencialmente é expressa pelo preço de mercado, corresponde apenas ao nível de subsistência cultural e historicamente determinado. Dado que o trabalhador é capaz de produzir o valor da sua subsistência em menos tempo do que o da jornada de trabalho, o restante valor criado sobre o recebido constitui a mais-valia, que é criada pelo trabalhador e apropriada pelo capitalista. Por outras palavras, a mais-valia é a diferença entre o valor criado pela força de trabalho e o valor dessa força de trabalho, ou seja, o valor total criado no processo produtivo (VC) é constituído pelo equivalente do valor pago pelo capitalista ao trabalhador sob a forma de salário que, na terminologia de Marx, é o capital variável (v) e pela mais valia (s), pelo que a mais–valia é dada pela seguinte expressão: s = VC – v, sendo v o que Marx denominou como capital variável, consubstanciando o valor da força de trabalho e que se expressa no salário pago, em termos monetários. A mais-valia é a origem do lucro. Contudo, o lucro apenas surge pela realização da mais-valia, ou seja, quando as mercadorias são vendidas. Pode verificar-se que nem toda a mais-valia gerada se transforme em lucro, desde que as mercadorias não sejam vendidas, ou seja, nem toda a mais-valia, por vezes, é realizada. Podemos fazer uma ligação entre a realização da mais-valia e a conceito de procura efectiva desenvolvido por Keynes, na Teoria Geral do Emprego, do Juro e do Dinheiro, obra publicada em 1936. Com efeito, Keynes, contrariando os clássicos que referiam que a economia tenderia a estar ao nível do pleno emprego, se fosse deixada actuar livremente, com o mínimo de intervenção do Estado, pois a oferta criaria a sua própria procura – segundo o que ficou conhecido por lei de Say - evidenciou que a economia tenderia a estar em equilíbrio abaixo do pleno emprego devido à deficiência da procura efectiva, que levaria a que parte da produção (cujo valor se traduz na massa de lucros e na massa de salários, constituindo o valor A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 20 Quanto ao conceito de capital Marx distinguiu entre o conceito de capital constante e o conceito de capital variável. O capital constante representa trabalho morto, cristalizado e acumulado nos meios e instrumentos de produção, nomeadamente, nas matérias-primas e nas amortizações do capital fixo. Este capital, que constitui o trabalho cristalizado nas mercadorias em processos produtivos passados, é utilizado no processo produtivo actual, apenas transmite o seu valor às novas mercadorias, mas não cria novo valor. Diz Marx: “A parte do capital que se converte em meios de produção, isto é, em matéria- prima, matérias auxiliares e meios de trabalho, não altera sua grandeza de valor no processo de produção. Eu chamo-a, por isso, a parte constante do capital, ou mais concisamente: capital constante.”17. O capital variável representa o valor da força de trabalho, a qual, como já foi referido, cria, no processo produtivo, uma quantidade de valor superior ao seu próprio valor, pelo que, o capital variável é trabalho vivo, porque varia durante esse processo produtivo, levando a que o capital total se valorize através da criação de mais-valia. Segundo Marx: “A parte do capital convertida em força de trabalho em contraposição muda o seu valor no processo de produção. Ela reproduz seu próprio equivalente e, além disso, produz um excedente, uma mais-valia que ela mesma pode variar, ser maior ou menor. Essa parte do capital transforma-se continuamente de grandeza constante em grandeza variável. Eu chamo-a, por isso, parte variável do capital, ou mais concisamente: capital variável.”18. O capital necessário à produção de uma mercadoria (C) decompõe-se em duas partes: capita constante (c) e capital variável (v). C = c + v. 17 Marx, Karl [(1867:325)1996] - O Capital - Editora Nova Cultural - Vol. I:325. 18 Idem [(1867:325)1996] - Vol. I. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 21 O capital constante é definido como a porção do valor da maquinaria (amortização) e materiais (matérias-primas) que são usados na produção e que integram o valor do produto. Apenas o valor da porção do capital constante (depreciação, matérias- primas e outros materiais auxiliares) que é usado no processo produtivo é transferido para o valor da mercadoria. O capital variável é o valor da força de trabalho, corresponde aos salários pagos. O tempo necessário para produzir o valor da força de trabalho é chamado tempo de trabalho socialmente necessário. CAPITAL FIXO E CAPITAL CIRCULANTE Uma outra distinção efectuada por Marx relativamente ao capital constante foi a sua divisão entre o conceito de capital fixo e capital circulante. O capital fixo é a parte do capital constante utilizado em vários processos produtivos, em várias rotações. Note-se que o valor do capital constante utilizado por Marx para a consideração da composição orgânica de capital (analisada mais à frente) e para a taxa de lucro, traduz-se, apenas, no valor do capital constante transmitido às mercadorias que, aproximadamente, se traduz no conceito actual do valor das amortizações e depreciações que integra o custo de produção das mesmas. O capital circulante é a parte do capital constante cujo valor é transmitido integralmente para o valor das mercadorias numa única rotação produtiva, nomeadamente, o valor das matérias-primas. COMPONENTES DO VALOR DE UMA MERCADORIA Uma vez definidos os conceitos de capital constante (c), capital variável (v) e mais- valia (s) pode concluir-se que o valor de uma mercadoria (VM) é igual à soma destes A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 22 três componentes: o capital constante, o capital variável e a mais-valia ou, traduzido numa fórmula: VM = c + v + s. O valor criado ou valor acrescentado (VA) no processo produtivo é igual ao capital variável adicionando a mais-valia, ou seja: VA= v+s. Por sua vez, o valor de uma mercadoria (VM) é superior ao valor criado ou valor acrescentado (VA) no processo produtivo (v + s), pois integra o valor do capital constante (fixo e circulante) que já foi criado noutros ciclos produtivos: VM>VC, ou c+v+s > v+s. Segundo Marx: “Ainda que o valor de uma mercadoria seja determinado pelo quantum de trabalho contido nela, esse próprio quantum é socialmente determinado. Se muda o tempo de trabalho socialmente necessário para sua produção — e o mesmo quantum de algodão, por exemplo, representa maior quantum de trabalho em colheitas desfavoráveis do que em favoráveis — há um efeito retroactivo sobre a mercadoria antiga, que sempre vale como exemplo isolado de sua espécie, cujo valor sempre se mede pelo trabalho socialmente necessário, isto é, sempre pelo trabalho necessário nas condições sociais presentes.”19. Quando as condições sociais - integrando o conhecimento e a tecnologia - se alteram, levando a que menos tempo de trabalho seja socialmente necessário para a produção de uma mercadoria, o seu valor diminui e, por conseguinte, também o seu preço tenderá a diminuir. Daí a importância, no mundo cada vez mais globalizado, do conhecimento e da investigação científica por estes factores permitirem aumentar a produtividade, ou seja, produzir mais em menos tempo e de 19 Marx, Karl [(1867:326)1996] - O Capital - Editora Nova Cultural - Vol. I. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 25 se pois sobre a lei do intercâmbio de mercadorias. Ele, como todo comprador, procura tirar o maior proveito do valor de uso de sua mercadoria.”20. COMPOSIÇÃO ORGÂNICA DO CAPITAL Há que distinguir a composição orgânica do capital da composição técnica, pois esta diz apenas respeito às características físicas do capital, enquanto a composição orgânica do capital tem em consideração o valor. Em qualquer caso, todo progresso no capitalismo suscita antagonismos. A elevação do salário real não raramente vem acompanhada de fenómenos como o desgaste mais acentuado das energias físicas e/ou psíquicas, maior insegurança de manutenção do emprego, crescimento do número de desempregados e dilatação dos períodos intermitentes de desocupação, o que aumenta a carga sobre os operários momentaneamente empregados. O capital constante (c) e a tecnologia fazem aumentar a produtividade do trabalho, tornando-se um poderoso meio de acumulação. A acumulação de capital constante é uma necessidade do sistema capitalista, impulsionada pela concorrência entre os capitalistas. À medida que a acumulação se vai alargando, a proporção do capital constante para o capital variável aumenta, o que significa que haverá uma tendência para o aumento de desemprego se a taxa de crescimento económico não for suficiente para a absorção de todos os trabalhadores disponíveis para integrarem o processo produtivo. A esta relação entre o capital constante e o capital variável chama Marx a composição orgânica do capital (k): k =   . A substituição de homens por capital leva a que a composição orgânica aumente o que, segundo Marx, leva a uma tendência de sobreprodução relativa e consequente desemprego, criando o que Marx chamava “exército industrial de reserva”, que leva a que os salários gravitem em torno do valor da força de trabalho. 20 Marx, Karl [(1867:347)1996] - O Capital - Editora Nova Cultural - Vol. I. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 26 É de notar como a explicação de Marx é diferente da explicação dada pelos clássicos relativamente a este ponto. Marx retém a teoria do salário de subsistência sem aderir à teoria da população de Malthus, aceite por Ricardo. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 27 A TENDÊNCIA DECRESCENTE DA TAXA DE LUCRO A acumulação do capital tem como efeito o crescimento económico que é inerente ao capitalismo. A taxa de lucro (g) para Marx, sendo diferente da taxa de mais-valia, é dada pela razão entre a mais-valia e o capital total (C = c + v): g =   . Devido à acumulação capitalista a taxa de lucro tem uma tendência a diminuir porque a mais-valia (s) apenas pode ser derivada do capital variável (v). A proporção de c para v aumenta, mesmo que em termos absolutos v aumente. Podemos analisar a tendência decrescente da taxa de lucro fazendo uma simples transformação. Dividamos todos os termos do segundo membro da equação da taxa de lucro por v, que é o capital variável, obter-se-á a seguinte equação: g =   , sendo: e - a taxa de mais valia; K – a composição orgânica do capital. Assim, se a composição orgânica do capital (K) crescer mais do que a taxa de mais- valia (e), a taxa de lucro (g) tenderá a descer. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 30 Ora, devido à concentração do rendimento, o poder de compra é limitado, pois os trabalhadores recebem apenas uma parte do rendimento criado e tendem a consumi-lo, enquanto os capitalistas nem sempre investem a parte do seu rendimento que poupam. Esta situação gera uma sobreprodução relativa, devida ao subconsumo, que se consubstancia nas crises generalizadas periódicas. Segundo Marx, a última causa das crises é a inabilidade da sociedade para consumir tudo o que produz. Por conseguinte, as crises desenvolvem-se porque o mercado se expande menos do que a produção. A questão do subconsumo irá ser retomada por John Maynard Keynes, e a sua ligação às crises. Como veremos noutra parte, segundo Keynes, no curto prazo é a procura efectiva que determina o nível de actividade económica, ou seja, o nível de produto e de emprego, levando este autor a considerar que a intervenção do Estado é necessária para a estabilização da economia. Ao excesso da oferta da força de trabalho sobre a procura, o que traduz um excesso relativo do trabalho em relação ao capital, Marx chamava exército industrial de reserva. É a sua existência que permite que os salários se mantenham baixos, ao redor do salário de subsistência e tendendo a que os lucros aumentem. Uma outra causa para manter os salários baixos, mantendo um determinado nível de taxa de desemprego, consiste na entrada no país de trabalhadores migrantes, tanto mais eficaz quanto maior for a mobilidade internacional de mão-de-obra. Uma forma alternativa de manter os salários baixos consiste na deslocalização de empresas dos países com salários mais altos para os países com maior abundância de força de trabalho, o que gera dois efeitos: um que permite obter maior mais-valia na produção de bens e serviços localizada nos países de elevada quantidade de mão-de-obra (força de trabalho) e, outro, essa deslocalização do capital permite que a procura de mão-de-obra seja menor nos países com salários mais elevados levando a que, em consequência, a procura de força de trabalho diminua com efeitos na diminuição dos salários e, consequentemente, na manutenção de elevadas taxas de lucro, o que é possível com a globalização do mercado de bens e serviços. A Teoria de Karl Marx Arlindo Alegre Donário; Ricardo Borges dos Santos 31 Quanto às crises, dizia Marx: ”…são sempre apenas soluções momentaneamente violentas das contradições existentes, irrupções violentas que restabelecem momentaneamente o equilíbrio perturbado.”21. Deduz-se, desta passagem de Marx, que as crises capitalistas são necessárias para manter o próprio capitalismo. Os clássicos (e neoclássicos) consideravam que as crises generalizadas de sobreprodução relativa não se verificariam. Keynes, considerando que a economia capitalista estava sujeita a crises endogenamente determinadas, tal como Marx, considerava que as mesmas poderiam ser, de certa forma controladas ou, pelo menos, minimizadas. As crises, segundo Marx, são acontecimentos que fazem parte do processo de acumulação capitalista, inerentes ao mesmo. As crises têm uma função essencial, necessária para que a reprodução capitalista se alargue, restaurando as taxas de lucro, como contrapartida da desvalorização do capital. Embora as crises tornem o capitalismo mais fraco, permitem, por outro lado, a criação de oportunidades para novo investimento e novos lucros, permitindo, também, a concentração de capital em grandes empresas e grupos económicos. 21 Marx, Karl [(1867:189)1996] - O Capital - Editora Nova Cultural – Vol. III, Capítulo XV.
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