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Guias e Dicas
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Artigo de publicação, Manuais, Projetos, Pesquisas de Relações Internacionais

Artigo de publicação sobre questões de meio ambiente e política internacional

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2011

Compartilhado em 30/06/2024

leandro-rangel-2
leandro-rangel-2 🇧🇷

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Baixe Artigo de publicação e outras Manuais, Projetos, Pesquisas em PDF para Relações Internacionais, somente na Docsity! Do direito internacional para a política internacional, e vice-versa: análise histórico-técnica da atuação dos sujeitos de direito em matéria de ecopolítica internacional1 Isabella Bretz2 Leandro Rangel3 Resumo O presente trabalho pretende discutir, tendo como fundamento a história da Ecopolítica Internacional contemporânea, a participação e a interação entre os principais sujeitos do direito internacional, a ver, Estados, Organizações Internacionais, Organizações Não-Governamentais e Indivíduos. A proposta é revelar a evolução da importância dos sujeitos não-plenos do direito, em relação aos sujeitos plenos, desde 1950, apresentando suas características técnicas e políticas e as interdependências entre as atuações de cada sujeito. Palavras-chave Relações Internacionais, Direito Internacional, Meio Ambiente, Ecopolítica Abstract This paper pretends to discuss, on the grounds of the history of contemporary International Ecopolitics, the participation and interaction among the main subjects of international law, such as States, International Organizations, Nongovernmental Organizations and Individuals. The proposal is to reveal the evolution of the importance of non-full subjects of law, in relation to full subjects, since 1950,  presenting  its technical and political characteristics and interdependencies between the performances of each subject. Key words International Relations, International Law, Environment, Ecopolitics "Todos os estados e todos os indivíduos, como requisito indispensável para o desenvolvimento 1 O presente texto é resultado de trabalho desenvolvido à luz da disciplina Ecopolítica Internacional, no ano de 2010, no curso de Relações Internacionais do Centro Universitário UniBH. 2 Especialista em Direito Internacional pelas Faculdades Milton Campos/CEDIN; Graduada em Relações Internacionais pelo Centro Universitário UniBH. 3 Coordenador e Professor do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário UniBH; Mestre em Direito Internacional pela PUCMinas. sustentável, devem cooperar" (...) (Princípio 5 da Declaração do Rio de Janeiro, 1992) Introdução O período atual é marcado, entre outros fatores, pela grande variedade de atores no sistema internacional e pela intensidade dos fluxos de informação. Sendo assim, temas que antes eram tocados unicamente pelos tomadores de decisão dos Estados, hoje alcançam outras esferas. Entretanto, essa participação ampliada ainda possui limitações. No Direito Internacional, os Estados são aqueles que possuem mais força e condições, pois possuem personalidade jurídica plena4. As Organizações Internacionais conquistaram também personalidade jurídica plena, essa derivada dos Estados5. Tal capacidade desses dois sujeitos pode ser confirmada diante da constituição das Convenções de Viena sobre Direito dos Tratados de 1969 e 19866. A limitação se encontra, então, nos sujeitos chamados tecnicamente de pessoas. As Organizações Não-Governamentais, as Empresas, e os Indivíduos não possuem plenitude em sua capacidade internacional. Quer seja por seus baixos graus de influência e suas frágeis participações na política internacional, pela necessidade da intermediação/representação estatal, ou pelos receios que Estados possuem em relação às liberdades individuais, tais sujeitos são tratados como não-plenos, com poucos ou nenhum direito (NGUYEN QUOC; DAILLIER; PELLET, 2003). Não obstante, observa-se que estes - que não possuem personalidade jurídica plena - têm ganhado força com o passar dos anos, principalmente em temáticas secundárias da agenda internacional. Isso acontece porque as interações entre o direito internacional e as relações 4 Segundo Brownlie (2008, p.57) "a subject of the law is an entity capable of possessing international rights and duties and having the capacity to maintain its rights by bringing international claims", Assim, toma-se como critérios, aqui, para a qualificação do sujeito como sujeito pleno ou não-pleno os seguintes itens: participação na produção normativa internacional; capacidade de reivindicação de respeito em relações de sujeitos; direito de recorrer a terceiros. Desta forma, estados preenchem os três requisitos ao poderem, por exemplo, discutir em fóruns internacionais, celebrar tratados e apresentar reclamações perante tribunais internacionais, entre outras diversas situações. 5 Suas limitações são, na verdade, apenas de caráter político, em virtude das especificidades temáticas das organizações internacionais. Na perspectiva jurídica/técnica, são entidades que também preenchem os itens citados na nota anterior. 6 Para mais sobre os debates recentes acerca do Direito dos Tratados, recomenda-se a leitura de CACHAPUZ DE MEDEIROS, Antônio Paulo. O Brasil e os Novos Desafios do Direito dos Tratados. In.:BRANT, Leonardo Nemer Caldeira. O Brasil e os Novos Desafios do Direito Internacional. Rio de Janeiro: Forense, 2003. Como protagonistas deste debate, e sendo a matéria “ecopolítica” algo essencialmente público, pode-se (e eventualmente, deve-se) problematizar sua ação ambiental à luz dos três elementos chave da ciência política: soberania, território e povo. O Tratado de Westphalia9, considerado por muitos como o marco para a existência dos Estados, define a soberania através de dois pressupostos: a) não há poder maior que o do Estado no seu território; b) todos os Estados são juridicamente iguais (NGUYEN QUOC; DAILLIER; PELLET, 2003). Apesar desse conceito rígido e clássico de soberania ser contemporaneamente contestado e relativizado – especialmente no pós-Segunda Guerra -, deve-se rememorar que nos anos 1950-1960 o ambiente internacional ainda era absurdamente controlado pelas entidades estatais: seu povo10, localizado em seu território11, era o ponto fulcral de suas preocupações, pois estes eram a fonte e o espaço do exercício de sua soberania. O Estado, mesmo lidando com uma temática com importância social, agia baseando-se apenas em seus interesses isolados. Neste sentido, Le Prestre (2000) apresenta os possíveis papéis de um sujeito deste tipo: o de dirigente, líder dos processos ambientalistas e das mudanças estruturais; o bloqueio, que contrabalança o dirigente, capitaneando o bloco que pretende a manutenção do status quo; o apoio, que colabora com alguns dos pólos, sem se apresentar como centro das discussões; e o pêndulo, que se altera de posição de acordo com os benefícios advindos da cooperação12. Apesar desta situação, pode-se assumir que ao menos na passagem da década de 1950 para 1960 se vislumbra uma visão mais holística, trazendo inter-relações entre os temas e entre os Estados. Segundo Le Prestre (2000, p.165), os anos 1960 viram uma conscientização progressiva das ameaças pendentes, particularmente no que se refere à comunidade científica, mas também por parte da opinião pública, impressionada pelos livros que dramatizavam as mudanças visíveis e os perigos iminentes, bem como catástrofe espetaculares. Em virtude desta situação, as Organizações Internacionais ganharam espaço nas discussões de meio ambiente, atuando técnica e politicamente, de forma indireta. Como 9 O Tratado de Westphalia pode é discutido mais profundamente em WATSON, Adam. A evolução da sociedade internacional: Uma análise histórica comparativa. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2004, 476 p. 10 O povo é formado pelo conjunto de pessoas que possuem vínculo jurídico com o Estado (DALLARI, 2010). 11 Este é composto da terra firme e águas interiores, subsolo, mar territorial e espaço aéreo (NGUYEN QUOC; DAILLIER; PELLET, 2003). 12 Faz-se necessário observar que em matéria ambiental, um país pode ser dirigente e bloqueio ao mesmo tempo: ele pode liderar, por possuir vantagens comparativas, mudanças em legislações climáticas, por exemplo, enquanto bloqueia discussões sobre fauna e flora. As avaliações devem ser feitas caso-a-caso. associações formais de Estados e outras OI’s, as organizações buscam objetivos específicos e, para tanto, desenvolvem estrutura própria. Lidam, de forma independente, com orçamento, políticas de ação, administração, entre outros. No âmbito político, elas promoveram a ampliação do espaço diplomático; influenciaram a hierarquia de temas na agenda; além de terem realizado mediações e bons ofícios em controvérsias internacionais de caráter ambiental. As OI's, não obstante, continuaram possuindo contido impacto decisório, tendo algum poder apenas nas situações em que se transformavam em fieis depositárias de tratados internacionais ambientais. O dilema, infelizmente, era a falta de foco da Organização das Nações Unidas para o tema. De acordo com Sands (2003), apenas em virtude da co-relação entre segurança e meio ambiente, inicialmente desenvolvida através das questões de alimento, que o tema foi verdadeiramente encampado pela ONU. Já no âmbito técnico as OI's colaboraram (e colaboram) com produções científicas, gerando e difundindo conhecimento; através de perícias, infra-estruturas, estímulos e com processos de clarificação e síntese na formulação de normas13. Ou seja, as Organizações Internacionais têm entre suas formas de ação a realização de sanções positivas e negativas, prestação direta de serviço (assistência técnica e financeira), catalisação, educação, produção de conhecimento e realização de política pública direta (LE PRESTRE, 2000). Assim, Estados começaram, ainda que timidamente, a recorrer às OI’s como fontes de informação e como gestoras do meio ambiente. Pari passu, ocorre a internacionalização de temáticas e os principais atores/sujeitos percebem que questões internas de uns podem afetar aos outros. O caso do navio petroleiro Torrey-Canyon14, que naufragou ao largo das costas da Cornualha e repercutiu internacionalmente, alcançando governos e a opinião pública, serve como modelo. Internamente desejava-se desacelerar a rápida destruição de ecossistemas e evitar o desaparecimento de espécies, garantindo as atividades recreativas e impedindo o desaparecimento das paisagens, do belo mundo conhecido. Esse fator exerceu grande influência, impulsionando 13 Salienta-se que esse papel das OI’s é desempenhado melhor com a realização posterior das grandes conferências sobre meio ambiente (especialmente em Estocolmo, 1972, Rio de Janeiro, 1992). 14 Primeiro caso de derramamento de óleo de grande importância, ocorreu em 1967, quando o petroleiro Torrey Canyon encalhou perto da Inglaterra, liberando 123.000 ton de óleo, atingindo áreas costeiras inglesas e francesas, causando mortandade de centenas de aves além de prejuízos à pesca e ao turismo. Disponível em <http://www.cetesb.sp.gov.br/emergencia/acidentes/vazamento/panorama/panorama.asp>, acessado em 30 de março de 2010, às 13:30h. movimentos conservacionistas e a cooperação internacional na temática ambiental. Daí em diante, com o aumento da mobilização nacional, o meio ambiente iria irromper de maneira espetacular na cena internacional. Foi justamente a 20 de maio de 1968, quando, em vários lugares, era posta em questão a ordem política, social e econômica estabelecida, que a Assembléia Geral da ONU decidiu organizar uma conferência mundial sobre o meio ambiente humano, a qual se realizaria em Estocolmo, em junho de 1972 (LE PRESTRE, 2000, p.166). As décadas de 1970-1980: o empoderamento das organizações não-governamentais e da sociedade civil Na mudança para a década de 70 observa-se uma visão menos romântica e mais politizada, a congregação de temas e realização da primeira grande conferência sobre meios ambiente, a Conferência de Estocolmo15. A preparação nos quatro anos anteriores foi uma ferramenta importante para a boa realização dessa conferência. Discutiu-se sobre poluição, recursos naturais, crescimento e desenvolvimento, cooperação, responsabilidade e soberania. Mesmo com a questão da segurança muito em voga (presencia-se a primeira escassez de recursos com os choques do petróleo de 1973 e 1979), inicia-se a discussão sobre humanização da ecopolítica. Apesar do sucesso ao apresentar a questão ambiental ao mundo, a conferência não trouxe documentos vinculantes. Ao menos as OI’s, ONU em especial, perceberam a importância de se incluir a sociedade civil nessa esfera, mesmo que ainda de forma tímida (SANDS, 2003). 15 A Conferência de Estocolmo ocorreu de 5 a 16 de junho de 1972, e foi denominada de Conferência sobre Meio Ambiente Humano. A participação no evento foi bastante significativa, especialmente por se tratar de uma conferência sobre meio ambiente, com mais de 100 países, e 400 OI’s e ONG’s (LAGO, 2007). Ao final do evento, foram produzidos três documentos não-vinculantes - Resolução sobre questões institucionais e financeiras, Declaração de Princípios, Plano de Ação -, e foram discutidos temas inovadores como a cooperação, a responsabilidade internacional, e a relações entre organizações internacionais. Ao fim da reunião, serviu como a 27ª sessão da Assembléia Geral da ONU, foi sugerida a criação do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente). primeira-ministra da Noruega, que, a partir de 1983 foi a presidente da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD). Essa Comissão era independente, embora possuísse alguma conexão com Estados e com as Nações Unidas (SANDS, 2003). No relatório apontou-se a pobreza como uma das principais causas e um dos principais efeitos dos problemas ambientais do mundo. O relatório criticou o modelo adotado pelos países desenvolvidos, por ser insustentável e impossível de ser copiado pelos países em desenvolvimento, sob pena de se esgotarem rapidamente os recursos naturais. Cunhou, desta forma, o conceito de desenvolvimento sustentável21 (TAYRA, s/d). Pelo caráter independente da Comissão, fundamental do período, pelo reduzido interesse estatal que acabou gerando um esvaziamento das conferências, pela tentativa de atrelamento dos debates ambientais aos econômicos e de direitos humanos e pela necessidade de se criar análises mais técnicas acerca do meio ambiente, a sociedade civil22 passou a ter participação mais ativa e voz mais preponderante no contexto. A realidade é que as questões ambientais não deixaram de se revelar, mesmo sem a atenção dos Estados. Portanto, no vazio criado nos grandes debates, emergiram as vozes desorganizadas da sociedade civil internacional. À luz desta problemática, deve-se, antes de mais nada, perguntar: existe uma sociedade civil internacional? Essa é uma questão comumente discutida principalmente nas Relações Internacionais. Pode-se encontrar definições e considerações sobre a sociedade civil recorrendo a diversos autores conceituados, como Tocqueville, Hegel, Habermas, Gramsci, Ferguson, Marx, Locke, Hobbes e Rousseau. Esses autores colaboram com idéias importantes, mesmo que não sob o título de “sociedade civil”, mas relacionadas a ela (RAMOS, 2009). A sociedade civil global, como Wapner define, é tudo que se encontra entre as 21 O Relatório Brundtland apresentou um conceito de desenvolvimento sustentável que visava atenção especial às necessidades do mundo pobre e da humanidade (presente e futura). Assim, quatro elementos podem ser listados: a equidade intergeracional - preservação em nome das futuras gerações, o uso sustentável - apropriação racional e prudente dos produtos, a equidade intrageracional - uso de um cidadão deve levar em conta necessidade do outro, e a integração - as questões ambientais devem ser estudadas à luz das questões econômicas e sociais. 22 Fala-se, nesse estudo, em sociedade civil e Organizações Não-Governamentais de forma separada. Isso se dá porque ao citar sociedade civil, refere-se a uma sociedade desorganizada, e não sob o modelo de associação estruturada, como uma ONG. A relação entre os dois institutos pode ser confirmada por Ahmed e Potter (2006: 30), quando eles colocam que "NGOs are an embodiment of civil society: they serve to fill in societal gaps and failures with respect to disparate issues ranging from environmental and sustainable development (,,,)". esferas pública e individual, ou seja, o que há abaixo do Estado e acima do indivíduo. A sua maior diferença com o conceito de sociedade internacional é o fato de ressaltar o papel de atores não-estatais, cada vez mais independentes da influência dos Estados. Mas quem é membro da sociedade civil global? A resposta, que todos nós somos, traz à tona a questão bem mais complexa da legitimidade de atores internacionais que se apresentam como os representantes da sociedade civil. Todavia, a sociedade civil global não foi construída por ninguém, ela se autoproclamou para contestar a ordem estabelecida. Ela é composta por grupos que formam coalizões mais ou menos estáveis, ou redes, para entrar na cena política (BARROS-PLATIAU, s/d). Evidencia-se, portanto, que esse ator não possui personalidade jurídica no Direito Internacional. Não possui, em termos práticos, mecanismos de decisão nos quais os atores não têm estatuto definido, seriam dificilmente concebíveis ou, pior, aleatórios. Certo é que os Estados são refratários à idéia de delegar qualquer tipo de poder a outros atores, principalmente se eles não forem identificados. Por isso o paradoxo de como incentivar a participação pública na elaboração de normas internacionais por meio do reconhecimento de atores que não são sujeitos de direito internacional? (BARROS-PLATIAU, s/d). Observa-se um problema no que diz respeito a esse ator. Mas, embora a participação e a existência da sociedade civil internacional não sejam consensuais entre os estudiosos da área, a tendência é a maior participação desta em matéria ambiental, e quem sabe ganhando mais espaço como sujeito do Direito Internacional (visto que em outras áreas, como Direitos Humanos, esse papel já é maior23). De acordo com Cassese (2005), de fato há estudiosos que entendem que o indivíduo e, portanto, a sociedade civil, são controlados pelo Estado, não sendo qualificáveis como sujeitos. Mesmo direitos à petições internacionais seriam apenas experiências de exceção, ligadas mais a procedimentos do que à substâncias. Porém, o autor entende: (…)the situation appears different today. At present, as a result of historical events and the spread of new ideologies, States have lost their exclusive monopoly over individuals (...). Individuals have gradually come to be regarded as holders of internationally material interests (...) (CASSESE, 2005, 144) De forma geral, portanto, pode-se dizer que nesse período, mesmo em meio às perdas econômicas do momento, houve uma preparação para o ambiente mais aberto e receptivo que estava por vir. A fase 1990-2000: a confirmação da interdependência dos atores 23 Especialmente em matéria de proteção e reivindicação de respeito. A década de 90, tendo como base os desenvolvimentos teóricos dos anos 1980, concentrados na sociedade civil e nas organizações sem fins-econômicos, tratou o meio ambiente de forma mais direta, focando nos problemas, aplicando os conceitos e o conhecimento produzido anteriormente. Os documentos buscavam a solução final, a forma de se realizar as políticas. Além, foram desenvolvidas políticas públicas em múltiplos níveis de ação, numa procura pela integração entre os sujeitos envolvidos, nesse momento tratados como atores do sistema internacional, ou seja, independente das condições legislativas e políticas de cada instituição. Já em 22 de dezembro de 1989, a Assembléia Geral, por meio da Resolução 44/22824, convocou os Estados para a realização de uma Conferência Mundial para discutir o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, a se realizar no Rio de Janeiro, Brasil, em 1992. A Resolução 44/228 convidava igualmente os Estados a promover a participação da sociedade civil, representada pela comunidade científica, pela indústria (Business Council for a Sustaintable Development, International Council on Metals and the Environment), pelos sindicatos e ONG's interessadas, e convidava as ONG's credenciadas pelo Ecosoc25 a contribuir ao processo de peparação. Foi a primeira vez que um número tão grande de ONG's foi associado aos preparativos de uma conferência, que contribuiu para ela e pôde participar dela diretamente (LE PRESTRE, 2000, p.209). A Conferência Rio-9226, no Brasil, colocou as discussões de meio ambiente definitivamente numa visão mais humanística e o tema do desenvolvimento sustentável vem com toda a força, servindo como alicerce dos debates. Seus objetivos, expostos na resolução 44/228, incluem: a) a proteção da atmosfera no que se refere à rarefação da camada de ozônio e às mudanças climáticas; b) a proteção das águas doces; c) a proteção dos oceanos e de todos os tipos 24 O documento pode ser lido na íntegra, em língua inglesa, em <http://www.un.org/documents/ga/res/44/ares44- 228.htm>. Acessado em 30 de março de 2010, às 13:30h. 25 A ECOSOC foi criada sob a Carta das Nações Unidas como o principal órgão para coordenar os trabalhos econômicos, sociais e afins das 14 agências especializadas da ONU, comissões técnicas e cinco comissões regionais. O Conselho também recebe relatórios a partir de 11 fundos e programas da ONU. O Conselho Econômico e Social (ECOSOC) serve como fórum para discutir questões econômicas e sociais e para a formulação de recomendações políticas dirigidas aos Estados-Membros e do sistema das Nações Unidas. Tradução livre. Disponível em <http://www.un.org/en/ecosoc/about/index.shtml>, acessado em 30 de março de 2010, às 18:45h. 26 O encontro contou com a inacreditável marca de mais de 170 países e milhares de ONG’s. Seus resultados, apesar de uma série de críticas (que podem ser lidas em Sands, 2003) são mais positivos que os da Conferência anterior, havendo documentos não-vinculantes, como a Declaração do Rio, os Princípios da Floresta, e a Agenda 21, além de tratados vinculantes, como a Convenção sobre Diversidade Biológica e a Convenção-Quadro sobre Mudanças Climáticas. Seus principais sucessos são a inter-relação meio ambiente-desenvolvimento, a transnacionalidade e participação da sociedade civil, e a confirmação dos princípios da responsabilidade ambiental, cooperação, planejamento para gerações futuras. político do Estado, através do voto, de acordo com seus interesses, pode, se possuir interesses novos ou contrários à prática nacional e internacional, realizar movimentos sociais de mudança das lideranças e das políticas. Assim, encerra-se um ciclo - um giro completo pelos quatro sujeitos em sua perspectiva de atuação política: Estados criam Organizações Internacionais, que podem se valer de Organizações Não-Governamentais para colocarem suas políticas em voga, que influenciam a sociedade civil ao aplicarem tais políticas. Entretanto, essa não é uma via de mão única; observa-se o caminho inverso, tão positivo, em potência, quanto o anterior. O Estado, fornecedor primário de políticas públicas à sociedade civil, a educa e gera ganhos de qualidade de vida. Quando tais ganhos se tornam uma prática constante, a sociedade passa a exigir mais qualificação e ganhos. É racional que o ser humano, em um ambiente que vive um ciclo virtuoso, deseje manter tal processo. Assim, tal sociedade, mais informada e crítica, que exige mais e amplia sua visão através da educação, passa a apontar novos problemas antes não percebidos e, destes, novas soluções. É essa nova sociedade mais politizada e consciente que se organiza em forma de Organizações Não-Governamentais e produz conteúdo, práticas e estudos, reverberando todo o conhecimento acumulado, mas aleatório, da sociedade civil. Acontece que, por sua vez, este conhecimento, quando tratado e absorvido, pode ser internacionalizado. Através do vínculo ONG/OI ocorre a exportação de tecnologias e experiências. As Organizações Internacionais contemporâneas buscam, constantemente, novas técnicas e políticas positivas para o desenvolvimento da cooperação internacional; porém, por serem tais OI's formadas pelos Estados, esses se tornam seus principais focos. Cabe ao Estado a absorção dessas novas informações - sim, essas que tiveram como ponto de partida a sociedade civil - e a geração de políticas públicas nelas baseadas. Esse processo pode ser clarificado através da seguinte ilustração29: 29 O presente gráfico foi desenvolvido pelos autores a partir de leituras e estudos. Porém, recomenda-se a visualização dos gráficos desenvolvidos por Willetts (2008), acerca das conexões completas (e complexas) entre os diversos atores das relações internacionais. Nesse diapasão, fica claro que, apesar da força do Estado, os atores têm considerável grau de interdependência. A soberania clássica não existe mais, como estabelecida em Westphalia. Observa-se que há a tendência de aumento da participação de atores não-estatais na contemporaneidade. Em relação ao meio ambiente tal fato é indubitável. Não se pretende ser, aqui, leviano e se afirmar que o poder de influência das pessoas internacionais se elevou de tal forma que decisões políticas são alteradas pelo simples e objetivo fato de serem refutadas por grupos organizados e/ou desorganizados internacionais e nacionais. Mas, que é clara a evolução da participação destes, é inegável. Além, que os canais de contato e as interdependências foram constituídos, também o é. A discussão ambiental tem ganhado o cenário internacional e tem caminhado verticalmente na agenda. Assim, atores como ONG’s e a sociedade civil podem se fortalecer nessa área e ganhar cada vez mais espaço, não só dentro dessa matéria, mas adquirindo confiança em outras. Esses processos são verificados na prática. A União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), criada em 1948, foi fundamental na preparação das bases para a negociação da Convenção Ramsar de 1971, a CITES de 1973 e para Convenção da Biodiversidade, em 1992. Juntamente com a UNEP, WWF, UNESCO e FAO, a IUCN atuou também como ferramenta importante na estruturação da World Conservation Strategy, de 1980, e da World Conservation Strategy II. Essa estratégia deu força para o termo “desenvolvimento sustentável” e serviu como guia para a preparação de estratégias de conservação nacionais e sub- nacionais em muitos Estados. Em outra via, influenciou desenvolvimento legal internacional, ou seja, produção de normas (SANDS, 2003). Observa-se uma situação em que Organizações Internacionais e Organizações Não- Governamentais trabalharam juntas na produção de convenções que causam impacto no comportamento dos Estados. Os Estados, sob essas novas regras, precisam reformular o padrão de comportamento interno, e assim a sociedade civil é alcançada. Organizações Não-Governamentais como WWF, Greenpeace e Friends of Earth desempenham também papel de grande relevância em convenções e tratados. Esses assistem a implementação dos compromissos adquiridos, junto com grupos como Oxfam e Action Aid. Esse tipo de organização freqüentemente participa de redes globais de discussão que focam em assuntos específicos. Na UNCED, uma grande quantidade de ONG’s preparou seus próprios projetos de tratado, por exemplo (SANDS, 2003). Outro exemplo ilustrativo dessa interdependência pode ser citado com relação à “moratória da soja”30, no Brasil. Para estudar os impactos da cessão da compra de soja de novos desflorestamentos na Amazônia, foi necessário, anteriormente, identificar precisamente quais eram os limites desse bioma. Para o alcance desse objetivo, foi feita a encomenda de um novo mapa da região ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esse tipo de demanda exigiu uma forte articulação entre os participantes da moratória – todos associados da Abiove31, mais uma série de ONG's – e o governo federal. Essa parceria foi garantida pelo apoio do Ministério da Casa Civil, ou seja, órgão governamental, que faz parte da estrutura do Estado. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais também teve participação, acelerando a disponibilização de imagens de áreas consideradas prioritárias pelo grupo responsável pelas ações de monitoramento32. Um eixo significativo do trabalho é a ação de conscientização junto a produtores, mostrando assim o alcance da sociedade civil. Além, a participação dos indivíduos, ainda que relativamente restrita (em comparação com a dos outros atores, principalmente os sujeitos completos de Direito Internacional), existe. A atuação individual no sistema pode ser exemplificada através de Jacques Cousteau33, Gro 30 Disponível em <http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=1130>, acessado em 27 de maio de 2010, às 15:46h. 31 Associação Brasileira de Óleos Vegetais. Para saber mais visite <www.abiove.com.br>. Acessado em 21 de maio de 2010, às 20:00h. 32 Disponível em <http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=1130>, acessado em 27 de maio de 2010, às 15:46h. ambiental é provavelmente aquela em que se encontra maior relação entre esses atores e maior participação de atores não-estatais. Referências bibliográficas AHMED, Shamina, POTTER, David. NGOs in International Politics. Bloomfield: Kumarian Press, 2006. AMORIM, Inês. A organização do trabalho da pesca, em finais do séc. XIX, na Povoa de Varzin. Disponível em < http://ler.letras.u p.pt/uploads/ficheiros/2827.pdf>, acessado em 18 de maio de 2010, às 15:30h. ANHEIER, Helmut. Nonprofit Organizations - theory, management, policy. 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