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Comportamento Amoroso de Homens e Chimpanzés: Análise de Emoções e Relações Sociais, Notas de aula de Inglês

Este artigo analisa as semelhanças e diferenças entre o comportamento amoroso de homens e chimpanzés, com ênfase na análise do comportamento sexual e relacionamentos entre mães e filhos, irmãos e amigos. A literatura recente distingue os chimpanzés bonobos, que apresentam diferentes proporções de membros inferiores e superiores, menor dimorfismo sexual e comportamentos significativamente diferentes, incluindo atividade sexual mais intensa, menor agressividade e grupos maiores. O artigo também discute a organização de grupos e a importância de relações afetivas e parentesco na formação de grupos.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

usuário desconhecido
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Baixe Comportamento Amoroso de Homens e Chimpanzés: Análise de Emoções e Relações Sociais e outras Notas de aula em PDF para Inglês, somente na Docsity! Chimpanzés também amam: a linguagem das emoções na ordem dos primatas Eunice Ribeiro Durham Professora aposentada do Departamento de Antropologia-USP Coordenadora do NUPES-USP RESUMO: O objetivo deste artigo é o de chamar a atenção dos antropólo- gos para novos desenvolvimentos das ciências biológicas como os da Neurobiologia, da Primatologia e da Etologia, assim como os estudos recen- tes referentes à evolução. O resultado destes trabalhos recentes devem pro- mover uma revisão das pressuposições antropológicas presentes na clássica oposição entre natureza e cultura. Este problema geral é analisado através de uma comparação entre homens e chimpanzés, a qual focaliza os componen- tes emocionais de comportamento dessas espécies, mais especificamente ain- da, o artigo privilegia a análise do comportamento “amoroso”, incluindo o sexual, e aquele presente nas relações entre mães e filhos, irmãos e amigos. Além disto, o trabalho também analisa a importância dos componentes emocionais para a constituição e preservação dos grupos sociais. Uma breve menção é feita quanto a hierarquia, agressão e alianças políticas. A compa- ração efetuada levanta questões referentes o incesto, à homossexualidade e o casamento, envolvendo um diálogo com a Psicanálise. PALAVRAS-CHAVE: chimpanzés; cultura humana e comportamento ani- mal; homem e outros primatas. Introdução O objetivo do trabalho é o de chamar a atenção para uma questão que foi abandonada pela antropologia recente e raramente considerada pela - 86 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM psicanálise: o fato de que, apesar da óbvia singularidade do compor- tamento humano, envolto como está numa espessa nuvem de símbolos e valores dentro da qual se move a consciência, o homem ainda é um animal, produto da evolução biológica, e compartilha com as demais estruturas e processos básicos sobre os quais e com os quais a cultura é construída. A comparação entre o homem e os outros animais, especialmente os que nos são evolutivamente mais próximos, é particularmente impor- tante, a meu ver, para estabelecer o contexto no qual podemos colocar de modo mais adequado as especificidades do comportamento humano. A questão da evolução do homem e dos fundamentos biológicos da cultura humana constituiu uma preocupação importante da antropolo- gia desde seu nascimento até meados do século passado, embora a au- sência de uma base sólida de conhecimentos genéticos tenha impedido um tratamento adequado do tema, especialmente no que diz respeito à relação entre raça, cultura e evolução. Apesar disso, a contribuição da antropologia do final desse período foi muito importante para o des- monte do darwinismo social e das explicações da diversidade cultural em termos raciais.1 No que tange a estruturas geneticamente herdadas, é verdade que, mais recentemente, Lévi-Strauss recorreu à hipótese de um inconscien- te humano universal, geneticamente determinado, uma máquina estru- turante responsável pela possibilidade do processo de construção de sis- temas simbólicos, como mitos e estruturas de parentesco. Mas, nessa concepção, o inconsciente é vazio, constituído apenas de mecanismos que organizam os conteúdos os mais variáveis. É uma capacidade do cérebro humano, um processo mental que transforma eventos em sím- bolos organizados em sistemas – a análise decorrente dessa postura é necessariamente formal, estando mais interessada no desvendamento dos REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 89 - Talvez por isso mesmo, os antropólogos tenham demonstrado um interesse episódico mas recorrente pela psicanálise, disciplina esta volta- da exatamente para as bases emocionais e instintivas do comportamento humano. Além disso, as normas culturais que organizam o comporta- mento humano raramente são produtos da consciência e raramente ope- ram através dela. Assim, as emoções bem como a questão do inconscien- te constituem limites da reflexão antropológica, os quais os antropólogos têm tentado transpor recorrendo à psicanálise. O próprio Lévi-Strauss não ficou imune a esse interesse (Lévi-Strauss, 1958). A aproximação maior e mais sistemática entre antropologia e psicanálise é, entretanto, mais antiga e ocorreu nos Estados Unidos, nas décadas de 1930 e 1940, com o tema da relação entre personalidade e cultura, o qual envolveu a estreita colaboração de antropólogos e psicanalistas e mesmo algumas conversões de um campo para outro. Mas, mesmo nesses estudos, o in- teresse dos antropólogos ainda estava centrado na flexibilidade do equi- pamento genético humano e a na capacidade da cultura de, por assim dizer, modelar personalidades diferentes nas diversas sociedades. Por outro lado, mesmo na psicanálise a questão das emoções e dos instintos é colocada de forma um tanto paradoxal, pois se ela funda- menta o desenvolvimento psíquico humano sobre a base instintiva fornecida pela sexualidade e se as emoções constituem a matéria-prima do trabalho clínico, há de fato, na tradição propriamente freudiana, muito pouco de uma teoria das emoções, que são em grande parte ex- plicadas como meras decorrências de repressões ou gratificações de pulsões sexuais. Por outro lado, especialmente no que diz respeito à vida instintiva, as indubitáveis semelhanças com outros animais raramente foram levadas em consideração, embora pudessem ajudar a esclarecer muitas questões teóricas relevantes. Freud, certamente, tinha consciência da importância das biociências para a psicanálise. É difícil encontrar um outro autor que busque de - 90 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM forma tão compulsiva quanto Freud uma integração teórica e uma base científica para suas descobertas empíricas no trabalho clínico. Por isso mesmo, e dado o fato de que ele foi levado a considerar a sexualidade como uma espécie de força motriz básica da psique humana, não podia ignorar o problema da conceituação do comportamento instintivo. Ele aborda a questão no seu célebre artigo “Os instintos e suas vicissitudes” (cuja primeira versão data de 1915), no qual estabelece uma distinção fundamental entre os instintos sexuais e os do ego. Nesse artigo encon- tramos um excelente exemplo do rigor intelectual de Freud, quando re- conhece que a ciência de sua época não oferece elementos suficientes para elucidar plenamente a questão. Tenho as maiores dúvidas de que se possa chegar a indicadores decisivos para a diferenciação e classificação dos instintos a partir (apenas) da elabo- ração do material psicológico. Esta própria elaboração parece exigir, até certo ponto, a aplicação de suposições definidas concernentes à vida ins- tintiva àquele material e seria desejável que estas suposições pudessem ser extraídas de algum outro ramo de conhecimento e levadas para a psicolo- gia. (Freud, 1914, p. 130) Tendo em vista essa posição de Freud, não deixa de ser estranho que os psicanalistas, tanto quanto os antropólogos, tenham se desinteressa- do de acompanhar a intensa produção científica sobre essa questão que marca o último meio século. De fato, nesse período, houve um extraordinário desenvolvimento de outras áreas de conhecimento que são diretamente relevantes para a compreensão das bases biológicas do comportamento animal e huma- no. Refiro-me às pesquisas mais recentes da psicologia experimental e do desenvolvimento e, inclusive, da psicologia cognitiva; às descobertas decorrentes do estudo dos hormônios e de sua influência nos processos REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 91 - orgânicos e psíquicos; ao desenvolvimento da neurobiologia e especial- mente dos estudos do cérebro; aos espantosos progressos na área da ge- nética molecular e sua influência na renovação da teoria da evolução; à primatologia e, especialmente, às pesquisas de etologia, particularmen- te no que diz respeito aos primatas. Parece-me que as demais disciplinas voltadas para o estudo do comportamento humano e, dentre estas, par- ticularmente a psicanálise e a antropologia, não podem continuar con- finadas dentro de seus estreitos limites disciplinares, mas precisam in- corporar o resultado desse recente progresso científico como parte do contexto mais amplo no qual ocorrem os fenômenos que estudam. Não se trata, obviamente, de defender um novo determinismo bio- lógico. Reconhecer semelhanças não implica ignorar diferenças. Mas, como seres humanos, não nos movemos exclusivamente no universo rarefeito da razão e dos sistemas simbólicos. Ao contrário, o comporta- mento humano brota de um espesso caldo emocional que permeia sua vida social e que, poderíamos argumentar, é responsável tanto pelas ati- tudes mais nobres como pelos problemas mais dolorosos enfrentados cotidianamente nas sociedades humanas. É por essa razão que, neste artigo, focalizei a questão geral dos laços genéticos e das semelhanças comportamentais que nos unem às demais espécies no problema das emoções. Restringi ainda mais a abordagem, centrando a reflexão nos sentimentos amorosos. Finalmente limitei a comparação e a reflexão sobre as semelhanças e diferenças tomando como base os chimpanzés. A escolha dos chimpanzés não é aleatória, pois são, genética e evolu- tivamente, nossos parentes mais próximos. Além disso, qualquer um que tenha assistido a documentários sobre esses animais, ou os tenha observa- do em jardins zoológicos, não pode ter deixado de ficar perturbado por sua semelhança conosco.3 Eles são, em si mesmos, uma provocação cons- tante à hubris humana que nos leva a desconsiderar nosso lado animal. - 94 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM organização do comportamento animal a uma mera competição entre genes. Nessa visão, que ignora a complexidade e a riqueza das concep- ções de Dawkins, o organismo, o grupo e a espécie se dissolveram e os genes, de fato, passaram a se assemelhar a indivíduos em competição constante. Ocorrem inclusive deslizes de linguagem através dos quais os genes parecem ser dotados de interesses e intenções. Essa concepção é de tal forma limitada e reducionista, especialmente quando aplicada ao homem que, compreensivelmente, contribuiu para justificar a suspeita generalizada das ciências humanas relativamente ao reconhecimento da importância do equipamento genético na modelagem do comportamen- to humano. Mas o evolucionismo contemporâneo não pode ser reduzi- do a essa generalização apressada e indevida. Se a tradição da psicologia e do evolucionismo biológico não foi su- ficientemente utilizada pelas ciências humanas, o impacto recente da neurobiologia e da abordagem sobre as emoções, que ela introduziu, começa a produzir uma nova inquietação. Prova disso é o grande suces- so da publicação do belo trabalho de divulgação científica de Daniel Goleman, Inteligência emocional. Igualmente significativa é a publica- ção em português de dois livros recentes do neurobiólogo António Damásio: O erro de Descartes: emoção, razão e o cérebro humano e O mis- tério da consciência. Do corpo e das emoções ao reconhecimento de si. A contribuição central de Damásio consiste em demonstrar a estreita interdependência entre razão e emoção. Ao mesmo tempo em que valo- riza uma abordagem evolutiva e, portanto, a importância das semelhan- ças entre o homem e os demais animais, reconhece que há muito de especificamente humano em nossa experiência das emoções: é o modo como se vinculam a idéias, valores, princípios e juízos complexos, isto é, sua manifestação como sentimentos e sua vinculação à consciência. Tam- bém reconhece que o aprendizado e a cultura interferem na expressão das emoções, reprimem algumas e estimulam outras e lhes conferem REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 95 - novos significados. Por isso mesmo, sua obra parece-me particularmen- te relevante para psicanalistas e antropólogos. As emoções “são processos determinados biologicamente e depen- dem de mecanismos estabelecidos de modo inato, assentados em uma longa história evolutiva (...) são parte de um conjunto de estruturas que regulam e representam estados corporais”, acionados automaticamente sem uma reflexão consciente, a qual, quando ocorre, é posterior. As emoções afetam o modo de operação de circuitos cerebrais e são res- ponsáveis por mudanças profundas no corpo e no cérebro. As emoções se situam, evolutivamente, numa posição intermediária entre os mecanismos básicos de sobrevivência (regulação do metabolismo, reflexos simples, bio- logia da dor e do prazer) e a emergência dos mecanismos responsáveis pelo raciocínio. Estão associadas aos primeiros na medida em que fazem parte do instrumental de regulação da vida e desempenham um papel impor- tantíssimo na relação dos organismos com o mundo externo; e ao segun- do, na medida em que constituem a base dos sentimentos elaborados pela consciência. (Damásio, 2000, p. 75-76) Emoções podem ser provocadas por estímulos internos ou externos. Especialmente no caso de mecanismos externos é preciso reconhecer, mesmo para os animais, sobretudo no caso dos mamíferos superiores, a existência de uma variação considerável nos tipos de estímulos que po- dem induzir uma emoção e a forma da ação que eles desencadeiam, a qual é selecionada em função da experiência individual ou social e, por- tanto, depende não apenas de condicionantes genéticos, mas também do aprendizado. A experiência influi nos mecanismos biologicamente pré-ajustados, tanto modelando o que constitui um indutor para de- terminadas emoções, como influindo na sua expressão. No caso dos se- res humanos, a variação é muito maior porque a cultura modela tanto o - 96 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM comportamento decorrente da emoção como o seu conhecimento-reco- nhecimento. Estamos longe, portanto, de um novo determinismo ge- nético. Mas a base inconsciente e geneticamente transmitida dos senti- mentos não pode ser eliminada; sentimentos e mesmo a consciência dependem do substrato emocional. A posição básica de Damásio que nos interessa particularmente aqui é a de que a (...) razão não pode ser tão pura como a maioria de nós pensa que é ou gostaria que fosse, e que emoções e sentimentos podem não ser de todo uns intrusos no bastião da razão, podendo encontrar-se, pelo contrário, enredados em suas teias, para o melhor e para o pior. É provável que as estratégias da razão humana não se tenham desenvolvido, quer em termos evolutivos, quer em termos de cada indivíduo em particular, sem a força orientadora dos mecanismos dos quais emoções e sentimentos são expres- sões notáveis. Além disso, mesmo depois de as estratégias de raciocínio se estabelecerem durante os anos de maturação, a atualização efetiva de suas potencialidades depende provavelmente, em larga medida, de um exercí- cio continuado da capacidade de sentir emoções. (Damásio, 1984) As observações acima, referentes às relações entre emoção e razão, certamente se aplicam com igual ou maior pertinência às dimensões sim- bólicas do comportamento. Mais importante ainda do que a neurobiologia, para uma reaproxi- mação da antropologia (e talvez da psicanálise) com as ciências biológi- cas, é o desenvolvimento da etologia, especialmente no que concerne às pesquisas baseadas na observação do comportamento dos primatas em seu ambiente natural. Esses estudos, aliás, são recentes. Embora a psico- logia experimental com primatas em geral e chimpanzés em particular tenha uma história bem mais longa (o trabalho pioneiro de Köhler foi REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 99 - Como palavra da linguagem comum o termo é, por isso mesmo, bastante impreciso, sendo utilizado em diferentes contextos, com signi- ficações variáveis. Mas a escolha do termo usado na nossa linguagem comum e favorecido na literatura tem a vantagem, para o antropólogo, de captar a amplitude de um amplo campo semântico que cobre uma grande variedade de relações emocionais positivamente carregadas que permeiam a vida social nas culturas ocidentais, campo este a partir do qual se elaboraram os conceitos científicos ou filosóficos. E, se é verda- de que, como todo antropólogo sabe, a palavra não é encontrada em todas as línguas e o campo semântico varia de uma cultura para outra, o termo amor é suficientemente amplo para dar conta da maioria das manifestações de laços afetivos reconhecidas em outras culturas. Um campo semântico implica a existência de um centro de signifi- cação que se espraia de modo variado por terrenos mais ou menos am- plos que variam não só conforme a língua, mas, dentro de um mesmo idioma, conforme o contexto. Tentemos procurar um núcleo de significação na tradição ocidental, de origem judaico-cristã, no qual se constituiu o nosso conceito de amor, para tentar verificar a possibilidade de que ele seja utilizado para com- preender a vida emocional do chimpanzé. É importante lembrar que, na herança mais próxima da tradição pro- priamente judaica, tal como se expressa na tradução dos Dez Manda- mentos para as línguas ocidentais, esse núcleo de significação aparece como injunção ou obrigação. A palavra amor, entretanto, é utilizada apenas em relação a Deus e aparece logo no primeiro mandamento: “amar a Deus sobre todas as coisas”. Relações entre pai e filho aparecem no terceiro mandamento, mas aqui não se diz que se deve amar pai e mãe, mas honrá-los. O amor sexual, por outro lado, aparece apenas numa proibição: “não cobiçar a mulher do próximo”. E aquilo que po- - 100 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM deríamos chamar de amor fraterno ampliado surge como injunção de perdoar as ofensas.8 A tradição propriamente cristã ampliou e valorizou o amor: assim, não só devemos amar a Deus, mas se insiste que Deus nos ama (embora não houvesse, da parte dele, esta obrigação); esposos também devem se amar; além disso, devemos amar ao próximo como a nós mesmos; o amor dos filhos para com os pais e mães também constitui uma obriga- ção, embora o amor materno e paterno apareça como algo tão espontâ- neo ou natural que não parece haver a necessidade de um mandamento explícito. Na medida em que essa tradição religiosa permeou as representações coletivas da cultura ocidental dominante até o século XIX, estabeleceu- se uma divisão muito nítida entre diferentes tipos de amor. De um lado, o amor exclusivamente espiritual, voltado para Deus, próprio e exclusi- vo dos seres humanos. No pólo oposto, o amor associado à atração se- xual, designado como amor carnal, manifestação por excelência de animalidade, permeado por isso mesmo pelo pecado e apenas aceito na medida em que o desejo sexual é redimido pela necessidade da procria- ção ou por sua associação ao amor espiritual que lhe é conferida pelo sacramento do matrimônio. No meio, localiza-se o amor entre pais e filhos e especialmente entre mãe e filho, com maior componente espiri- tual, pois não é concebido estando contaminado pela sexualidade, em- bora decorra dela. Finalmente, há campo um tanto mais indefinido, que tem como paradigma o amor fraterno e que inclui desde relações interindividuais de amizade até o amor inteiramente espiritual que deve abranger “o próximo” ou a humanidade de forma geral. Reconhece-se a existência do desejo sexual sem amor, que é por excelência a manifes- tação da carne que deve ser combatida. As formas particularmente pe- caminosas de amor são aquelas que confundem categorias que deveriam se manter separadas, contaminando-as com a sexualidade – o incesto, REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 101 - a homossexualidade, o adultério e a bestialidade – isto é, a sexualidade fora do casamento, impossível de ser sacramentada por ele e autônoma em relação à procriação. De fato, a oposição carne-espírito organizou a teologia do amor e, mesmo que seu rigor dogmático estivesse muito longe da prática cotidia- na e do senso comum, ela certamente influenciou as representações cole- tivas como uma teoria do amor, valorizando seu componente espiritual. Examinando essa tradição, podemos dizer que, na civilização ociden- tal, os principais núcleos de significados da palavra amor correspondem a um amor “espiritual”, que constitui claramente uma elaboração psico- cultural dependente da construção simbólica; ao amor relacionado ao sexo; ao amor entre mães, pais e filhos; e, finalmente, aquele associado à sociabilidade, que é própria dos animais sociais e que tem como para- digma a fraternidade. Não é preciso dizer que Freud praticamente destruiu essa teoria milenar. Em primeiro lugar, eliminou Deus; em seguida, praticamente subsumiu todas as demais consagradas manifestações do amor sob o domínio da sexualidade. Pior ainda, transformou o desejo do incesto, de uma anomalia quase impensável, na pedra fundamental da organiza- ção psíquica. Jung foi mais moderado: restabeleceu Deus, embora sob a forma de “idéia de Deus”, mantendo-o, entretanto, num domínio pró- prio, diferente do de Eros. Além disso, preservou-se, no núcleo do con- ceito de Eros, seu componente sexual, reconheceu esporadicamente um outro tipo de amor que denominou Libido de Parentesco. Finalmente, o componente sexual das relações pais-filhos, especialmente mãe-filho, não assumiu em Jung a dominância que Freud lhe atribuíra. Entretanto, apesar da grande influência da psicanálise e da con- tribuição junguiana, as teorias tradicionais, incorporadas no senso co- mum, persistem ainda e podem nos orientar na análise do amor entre os chimpanzés.9 - 104 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM antropóides não humanos. Gibões, por exemplo, vivem em pequenos grupos formados por um casal e seus filhos imaturos. Orangotangos são animais solitários, que se aproximam apenas durante o cio, para uma breve convivência; os pequenos grupos existentes consistem em uma fêmea com suas crias imaturas, raramente, aliás, mais de uma. Gorilas, por outro lado, apresentam variações na composição dos grupos: a maior parte deles inclui apenas um macho adulto com diversas fêmeas e os filhos imaturos, mas há também bandos que incluem até quatro ma- chos adultos.13 Dentro desse quadro geral podemos começar a analisar semelhanças e diferenças entre nós e os chimpanzés no que diz respeito ao compor- tamento amoroso, começando pela sexualidade a qual claramente pos- sui bases instintivas e envolve alta carga emocional. Sexualidade e promiscuidade Chimpanzés, especialmente os bonobos, são animais que demonstram tanto um enorme interesse pelo sexo como um grande espectro de ativi- dades eróticas, que incluem diferentes posições corporais na cópula, masturbação e carícias hetero e homoeróticas. Além disso, a freqüência de contatos sexuais é muito elevada. Duas características fundamentais organizam a sexualidade entre os chimpanzés e ambas diferem dos padrões humanos – são, por isso mes- mo, muito interessantes do ponto de vista comparativo. Em primeiro lugar, como em praticamente todos os animais se- xuados, com exceção do homem, o acasalamento é controlado por ci- clos periódicos de fertilidade e infertilidade das fêmeas, isto é, por perío- dos de cio de duração limitada. É basicamente durante esses períodos que as fêmeas são, simultaneamente, atraentes para os machos e recepti- REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 105 - vas às relações sexuais. Fora desses períodos, as relações entre machos e fêmeas são, em grande parte, assexuadas, embora as diferenças de gêne- ro permaneçam. Em muitas espécies animais, esses ciclos costumam ser anuais e regu- lados pelos períodos de maior abundância de alimentos. Quando isso ocorre, todas as fêmeas entram no cio mais ou menos ao mesmo tempo e a atividade sexual de machos e fêmeas fica restrita a um período muito breve do ano. Não é isso que ocorre com os chimpanzés e com diversos outros primatas. Não existe uma sazonalidade coletiva nos períodos de cio das fêmeas, que apresentam ciclos individuais de fertilidade, inter- rompidos pela gravidez e amamentação. Isso significa que, embora as fêmeas individualmente estejam freqüentemente indisponíveis para re- lações sexuais, a existência de múltiplas fêmeas num mesmo bando ga- rante que haja, com freqüência, alguma no cio, o que oferece, para os machos, múltiplas oportunidades de relacionamento sexual durante todo o ano. O cio das fêmeas é marcado por um inchaço muito visível da parte externa dos órgãos sexuais, que adquirem um colorido rosa in- tenso. Quanto maior o inchaço, que é mais pronunciado nas fêmeas plenamente adultas e férteis, maior a desejabilidade das fêmeas e maior o interesse dos machos por elas. O tipo de periodização do cio das fêmeas e os padrões de acesso dos machos às fêmeas no cio constituem, para os animais sociais, um ele- mento fundamental de organização dos grupos. Uma forte tendência ao monopólio de fêmeas por parte de um macho dominante impede a existência de grupos sociais amplos. Utilizando de forma metafórica con- ceitos que se aplicam mais propriamente a seres humanos, diríamos que esse monopólio impede a existência de “sociedades” e restringe o grupo a “famílias”. No caso dos gibões, por exemplo, entre os quais os grupos abrangem apenas um par adulto e sua prole imatura, a estrutura é se- melhante a uma “família monogâmica”. Nesse tipo de organização, a - 106 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM oportunidade de atividade sexual é muito restrita, tanto para machos como para fêmeas, pois é interrompida pelos longos períodos de gravi- dez e amamentação. Em muitas espécies de mamíferos, encontramos um outro tipo de organização que é freqüente também entre os gorilas: a formada por um único macho adulto dominante e diversas fêmeas, com as crias subadultas.14 Nesse caso, temos grupos maiores, semelhan- tes a uma única “família poligínica”, ocorrendo então oportunidades mais freqüentes de relações sexuais para os machos. A constituição de grupos grandes ou “sociedades” propriamente, com a coexistência de machos e fêmeas adultos de uma forma relativamente permanente, de- pende da quebra do monopólio de acesso sexual às fêmeas por um úni- co macho dominante. A “solução”, no caso da sociedade chimpanzé (como em algumas outras espécies de primatas sociais), fundamenta-se na promiscuidade, que oferece a todos os machos do grupo oportunidades freqüentes de exercício da sexualidade, uma vez que, em grupos grandes, é comum que pelo menos uma fêmea esteja no cio e disposta a copular com dife- rentes machos. A promiscuidade é certamente uma característica extremamente in- teressante da vida social dos chimpanzés e responsável pelo fato de que a sexualidade permeie de forma muito intensa toda a vida social. A pro- miscuidade, aliás, parece ser uma possibilidade sempre presente entre os antropóides; mesmo entre gibões e gorilas, em havendo oportunidade, fêmeas e machos podem eventualmente copular com adultos de outros grupos. E bandos de gorilas podem incluir mais de um macho, caso em que a promiscuidade se estabelece. Convém lembrar, entretanto, que a promiscuidade não é nem irres- trita nem igualitária. Em primeiro lugar, é em grande parte limitada aos membros do grupo. Relações sexuais fora do grupo, embora ocorram, são objetos de repressão, freqüentemente agressiva por parte dos mem- REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 109 - Há também, entre os chimpanzés imaturos, contatos eróticos fre- qüentes durante as brincadeiras, do tipo que Freud caracteriza, para os seres humanos, como perverso polimorfo. Nessa fase, parece que as di- ferenças entre machos e fêmeas não estão ainda consolidadas no plano instintivo e breves manipulações genitais, assim como tentativas de montar o parceiro, ocorrem indiscriminadamente, independentemente de sexo. Podemos certamente falar de um instinto sexual.15 Melhor seria, en- tretanto usar a palavra pulsão, que deriva da tradução francesa do termo Trieb utilizado por Freud.16 A palavra pulsão é mais adequada do que instinto porque admite uma variabilidade na forma através da qual a necessidade de satisfação do impulso se realiza. De fato, chimpanzés, como seres humanos, apresentam comportamentos sexuais bastante fle- xíveis. É importante lembrar também que, para Freud, a pulsão se colo- ca entre o propriamente físico e o psíquico. Mesmo nesse sentido, creio que o conceito pode ser aplicado aos chimpanzés e primatas em geral. Além dos aspectos já mencionados que demonstram a flexibilidade do comportamento sexual, é importante notar também que varia bas- tante o grau de entusiasmo por sexo, especialmente entre as fêmeas, e isto desde a adolescência. Enquanto algumas apresentam um compor- tamento que, na espécie humana, poderia ser caracterizado como ninfomaníaco, outras parecem recear os machos e cruzam com muito menos freqüência. Há também preferências sexuais que não impedem a promiscuidade, mas estabelecem relações mais próximas e mais dura- douras entre um par específico. O capítulo 7 (“A vida sexual de Flo”) do livro de Jane Goodall (1988) oferece uma descrição bastante vívida do comportamento sexual dos chimpanzés. Como entre muitos outros primatas, a masturbação também ocorre e é um tipo de comportamento particularmente freqüente entre os bonobos de ambos os sexos, mas especialmente entre as fêmeas. Entre - 110 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM os bonobos, aliás, relações homossexuais entre fêmeas também são co- muns: fêmeas no cio se abraçam e esfregam horizontalmente os genitais, parecendo obter grande satisfação com este ato. Também entre os bonobos, contatos genitais entre machos são freqüentes, como fricção mútua do pênis, mas parecem ser antes uma atividade de apaziguamen- to e solidariedade do que uma forma de obter satisfação sexual, porque são muito breves, não produzem ejaculação e ocorrem em situações de tensão grupal. Aliás, a forma mais comum de contato genital entre os machos consiste em esfregarem rapidamente os traseiros, sem contato entre os pênis (Waal, 1997). De um modo ou de outro, a observação do comportamento sexual dos chimpanzés parece não deixar dúvida de que, entre eles, o sexo é uma atividade altamente emocional, um interesse constante e desempe- nha uma importante função de relacionamento, tanto o promovendo como expressando outros tipos de relações afetivas. A apresentação do traseiro, por exemplo, que é característica das fêmeas no cio quando acei- tam ou convidam um macho para a atividade sexual, é usada também por machos e fêmeas, indistintamente, para demonstrar submissão pe- rante um macho dominante. Portanto, sexo ou, mais precisamente, con- tatos genitais não se restringem a uma atividade de procriação nem en- volvem necessariamente a cópula (Hashimoto e Furuichi, 1994). Um outro dado importante, sem dúvida nenhuma, é a deformação dos instintos sexuais que ocorre em cativeiro e, mais especialmente, em situações nas quais os animais são isolados e privados dos estímulos for- necidos pela vida grupal. Nessas circunstâncias, não só a masturbação se torna habitual e mesmo compulsiva, como se manifestam também ou- tras anomalias como impotência, frigidez, estupro e infanticídio ou re- jeição das crias pela mãe. Por isso mesmo, a reprodução em cativeiro é difícil e exige condições especiais de manejo ou interferência humana direta. Chimpanzés em cativeiro, como é o caso de muitos outros ani- REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 111 - mais, parecem, de fato, ter um comportamento sexual mais parecido com os dos seres humanos em termos de problemas sexuais e repro- dutivos do que aquele que é característico dos animais selvagens, o que parece comprovar que somos animais autodomesticados. Aliás, Erich Fromm faz uma indicação interessante na mesma linha quando observa que as condições de vida do homem assemelham-se mais a de animais em jardim zoológico do que a de animais vivendo em seu ambiente na- tural (1975, p. 252). Isso comprova que o instinto sexual é flexível em termos de sua manifestação e depende da experiência social tanto entre chimpanzés como entre seres humanos. A diferença mais importante reside no fato de que chimpanzés, como os animais em geral, não ela- boram julgamentos morais em relação à sexualidade. Convém, entretanto, fazer algumas reflexões adicionais sobre a promiscuidade. A promiscuidade está associada, como vimos, ao fato de que, entre os chimpanzés, relações sexuais não estabelecem parcerias permanentes, estáveis e muito menos exclusivas entre machos e fêmeas, apesar dos casos de preferências afetivas. Entre nós, ao contrário, o sexo e a repro- dução são organizados, em todas as sociedades conhecidas, de forma a estabelecer parcerias pelo menos relativamente permanentes entre ho- mens e mulheres, fortalecidas por uma divisão social do trabalho. É interessante, de fato, especular sobre em que medida as parcerias sexuais humanas estabelecidas por diferentes formas de casamento cons- tituem, com efeito, uma invenção cultural imposta sobre uma base ins- tintiva promíscua. Isso explicaria o fato de o adultério, apesar de conde- nado em todas as culturas, parecer constituir uma espécie de tentação permanente e passatempo favorito para homens e mulheres no conjun- to das sociedades humanas. Apesar de não se poder extrapolar os padrões sexuais de uma espécie para outra, especialmente no caso de antropóides, há algumas indica- - 114 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM Sobre este fenômeno que estou chamando de “paternidade difusa” convém citar um relato de Schaller, um dos primeiros pesquisadores a estudar sistematicamente os gorilas em seu ambiente natural. Embora o relato diga respeito aos gorilas e não aos chimpanzés, ilustra bastante bem o comportamento do macho dessas duas espécies de antropóides sociais em relação às crias das fêmeas de seu bando. Além disso, deixa transparecer a identificação emocional que o observador humano espon- taneamente demonstra em relação aos animais. Seguindo o rastro de um bando de gorilas que haviam encontrado pouco antes, Schaller e seu companheiro Doc tomaram a crista de um vale e avistaram o bando na elevação do lado oposto; o macho, após gestos ameaçadores iniciais, acabou se tranqüilizando e sentando-se ao lado de uma fêmea com fi- lhote, num montículo: O macho, que devia pesar quase 200 Kg, permaneceu no montículo, con- templando montanhas e planícies, verdadeiro senhor de seus domínios. Uma outra fêmea, com um bebê suavemente estreitado contra o corpo, aproximou-se. “Deve ser um recém-nascido” – sussurrei para Doc. “Ainda está molhado” – ele concordou. A fêmea se apoiou pesadamente contra as costas do macho. Seu braço peludo quase ocultava completamente seu bebê, que parecia uma aranha e cujos finos braços e pernas se agitavam ao acaso. O macho se inclinou e, com a mão, acariciou o bebê. Durante duas horas, embevecidos, contemplamos aquela cena de família. Schaller e seu companheiro tiveram finalmente que se afastar porque estava ficando tarde e tinham que retornar ao acampamento. Surpreso com o fato dos gorilas não terem se afastado como vinham fazendo en- tão, Schaller especula: “Talvez não tivessem querido se afastar por causa do nascimento iminente ou recente do filhote” (1964, p. 50-51).19 REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 115 - Apesar do interesse e às vezes do carinho demonstrado pelos machos em relação aos recém-nascidos, não tendo pais, no sentido humano do termo, os chimpanzés estão certamente livres do complexo de Édipo e do tabu do incesto. Apesar disso, surpreendentemente, relações inces- tuosas são raras, especialmente porque (ao contrário de muitas outras espécies de primatas nas quais os adolescentes de sexo masculino ten- dem a se dispersar) entre os chimpanzés são as fêmeas adolescentes que tendem a espontaneamente buscar outros grupos logo após a menarca. Esse afastamento costuma se dar no período do cio, no qual elas se tor- nam atraentes para machos de outros grupos, os quais facilitam sua in- trodução no novo bando, protegendo-as da agressividade das outras fê- meas. Verifica-se, portanto, a existência de algo parecido com “uma troca de mulheres” espontânea (ou natural). Essa tendência natural torna raro tanto o incesto entre pai e filha quanto entre irmão e irmã. Há, entre- tanto, casos em que as fêmeas permanecem no grupo, especialmente quando são filhas de mães dominantes. As cuidadosas observações de Jane Goodall indicam, entretanto, que, mesmo nesses casos, as relações sexuais entre irmãos são raras. Parece que a convivência estreita entre irmãos, que analisaremos mais tarde, amortece a atração sexual. As ob- servações relativas a incesto entre pai e filha são bem menos conclusivas, inclusive porque, na situação de promiscuidade e sem a introdução de testes genéticos sistemáticos para a população do grupo, nem os pesqui- sadores, nem os chimpanzés podem saber ao certo quem é o genitor. Podemos inferir que, nos casos relativamente raros nos quais a fêmea adolescente permanece no grupo, o incesto com o pai pode ocorrer, es- pecialmente quando o genitor era e permanece sendo o macho domi- nante. Essa condição, entretanto, não deve ser muito freqüente, porque a posição de dominância raramente dura os sete ou oito anos necessá- rios para uma fêmea iniciar o período reprodutivo. Além disso, fêmeas - 116 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM adolescentes raramente copulam com machos adultos – o acasalamento se dá preferencialmente com machos jovens. Os dados mais surpreendentes, porém, dizem respeito ao incesto entre mães e filhos, os quais normalmente convivem no mesmo grupo. Em mais de trinta anos de observação consecutiva, Jane Goodall e sua equipe afirmam não terem conseguido registrar um único caso de in- cesto desse tipo. E, em observações prolongadas, ao contrário do que acontece com o genitor masculino, a filiação materna de adultos jovens é conhecida dos pesquisadores e, ao que parece, reconhecida pelos fi- lhos. Também aqui o contato estreito e prolongado da cria com a mãe parece dificultar ou mesmo impedir a atração sexual. Nos demais estu- dos consultados, não encontrei informação específica sobre incesto, com exceção de uma breve referência de Dian Fossey sobre os gorilas: prosse- guindo o relato que citamos anteriormente sobre a amplitude de ativi- dades sexuais, afirma que as únicas parcerias que nunca foram observa- das incluem machos imaturos montando machos adultos e machos montando suas mães (Fossey, 1983, p. 75). Certamente esses dados não permitem concluir que o mesmo ocorra necessariamente entre os seres humanos e que as relações entre mãe e filho e entre irmãos inibam a atração sexual, mesmo porque o compor- tamento sexual, como já vimos, pode apresentar grandes variações de uma espécie para outra, mesmo em se tratando de espécies próximas. Entretanto, parece que os dados referentes aos chimpanzés devem, pelo menos, promover um reexame da questão do tabu do incesto e do com- plexo de Édipo tanto por parte dos antropólogos como dos psicanalis- tas, cujas concepções estão assentadas na certeza da existência de um forte desejo sexual entre mães e filhos e entre irmãos. No caso da antro- pologia, especificamente, podemos reanalisar a questão da troca de mu- lheres e do tabu do incesto que a estabelece e perguntar se, em lugar de uma ruptura radical entre natureza e cultura, não se trata antes de uma REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 119 - sociedade chimpanzé, e a este relacionamento caberia, a meu ver, a quali- ficação de amoroso e está amplamente documentado na bibliografia. A adaptação evolutiva a esse grau de dependência é dupla. Em pri- meiro lugar, chimpanzés têm um filhote de cada vez. Encontrei um úni- co caso documentado de nascimento de gêmeos entre chimpanzés selva- gens, mas as crias não sobreviveram ao primeiro ano de vida. A segunda adaptação consiste no espaçamento entre as gestações. Dado o alto in- vestimento físico das mães para assegurar a sobrevivência das crias, essas adaptações parecem de fato ser essenciais para assegurar o sucesso da procriação. Como vimos, fêmeas raramente retomam o cio antes de três anos após o parto (com exceção dos bonobos, entre os quais este perío- do pode ser reduzido a um ano) e, mesmo entre os bonobos, raramente são férteis antes dos 3 ou 4 anos. Considerando-se uma gestação de 7,5 meses, o espaçamento médio entre as crias é em média de 4 a 6 anos. Durante esse tempo, a cria permanece em estreito contato físico com a mãe. Além disso, o nascimento de uma nova cria não interrompe o con- tato estreito com a cria anterior. É comum observar uma fêmea com uma cria no colo e outra maior, a seu lado. Em casos de perigo ou de uma travessia particularmente difícil, a mãe carrega também a cria mais velha montada em suas costas. Mesmo após a adolescência, chimpanzés continuam a manter contatos estreitos com as mães, defendendo-as ou sendo defendidos por elas em caso de perigo (Goodall, 1988). Convém analisar melhor a questão do complexo comportamental associado ao contato físico tão estreito que decorre da amamentação e da locomoção. Em primeiro lugar, é importante considerar as observa- ções experimentais sobre reflexos dos neonatos. Mason observa que os reflexos primários ou primitivos, que ocorrem nos recém-nascidos, obe- decem a um padrão muito semelhante entre macacos, antropóides e se- res humanos. Na revisão do material disponível na bibliografia sobre esses diferentes primatas Mason afirma: - 120 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM Entre os primeiros comportamentos coordenados a aparecer após o parto são aqueles que servem para manter contato corporal com a mãe e permi- tir a amamentação, a saber: movimentação da cabeça (que permite encon- trar a teta), agarrar-se e mamar (incluindo sugar e engolir). Os três são encontrados entre seres humanos, inclusive o de agarrrar-se (grasp reflex).20 (...) Embora estas respostas possam ser analisadas individualmente, elas estão funcionalmente inter-relacionadas não apenas nos neonatos, mas durante toda a infância. Assim a coordenação entre os reflexos de sugar e engolir durante a amamentação pode ser perturbada se os macaquinhos não estiverem firmemente agarrados. A ação de se agarrar é intensificada durante a amamentação, mesmo quando o infante está firmemente segu- ro. Observa-se também que filhotes de macacos, chimpanzés e seres hu- manos abrem e fecham as mãos ou apresentam outras formas de movi- mentação dos dedos quando estão amamentando ou mesmo bebendo de uma xícara. (Mason, 1965, p. 517-19) Aliás, no que diz respeito à necessidade de contato corporal, Mason reproduz uma extensa observação de Alfred Russel Wallace sobre suas experiências relativas a um bebê orangotango capturado, que é interes- sante não apenas pela importância do observador como pela objetivida- de do relato e pela época em que foi escrito: 1869. Durante os primeiros dias, ele se agarrava desesperadamente com as qua- tro mãos a qualquer coisa que conseguisse alcançar, e eu tinha que tomar cuidado para manter minha barba afastada, pois seus dedos se agarravam a superfícies peludas mais do que a qualquer outra coisa e era impossível eu me libertar sem ajuda. Quando inquieto, ele movia os braços e as mãos no ar, tentando encontrar alguma coisa à qual pudesse se agarrar... Por falta de outra coisa, ele agarrava freqüentemente seus próprios pés e depois de REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 121 - algum tempo, cruzava os braços e agarrava, com as mãos, os longos pêlos que cresciam no ombro oposto. (Wallace, apud Mason, 1965, p. 520) Finalmente, Wallace providenciou um embrulho de pele de búfalo, que pareceu satisfazê-lo até descobrir que não havia tetas nele. As múlti- plas observações desse tipo de comportamento entre os chimpanzés in- dicam que não estamos lidando com meros reflexos automáticos, mas com intensas manifestações emocionais. Devemos enfatizar que a amamentação e as sensações corporais que derivam do contato com o corpo da mãe formam um complexo o qual inclui, além das sensações de maciez e dureza, também calor, cheiro, ritmo, gosto e ruídos (como os grunhidos carinhosos das mães chim- panzés ou mesmo as batidas do coração). A importância do contato corporal contínuo com o corpo da mãe foi repetidamente comprovada em experiências de laboratório. Hinde demonstrou a existência de um padrão muito claro de reação de filhotes rhesus temporariamente separados de suas mães. Mesmo quando ali- mentados e deixados em seu ambiente habitual, podia-se comprovar uma seqüência constante de comportamentos que passavam de protes- to e procura pela mãe para desespero e eram seguidos de apatia ou depressão profunda (Hinde, 1971). Estudos com bebês humanos in- ternados em clínicas ou hospitais, separados das mães, revelaram o mes- mo padrão.21 As observações de campo com chimpanzés comprovam essa seqüên- cia. Bebês órfãos, mesmo quando podem se alimentar sozinhos e são objeto de cuidados especiais por parte de um irmão, irmã ou mesmo um macho adulto, raramente sobrevivem e parecem, literalmente, mor- rer de tristeza. Jane Goodall descreve cuidadosamente três casos desse tipo, em seu livro In the shadow of man. Diane Fossey faz observações equivalentes para órfãos de gorilas (1983). - 124 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM A segunda, Balint encontra numa passagem de A interpretação dos so- nhos, a qual cita: Num momento em que as primeiras satisfações sexuais ainda estão ligadas à ingestão de alimentos, a pulsão sexual tem um objeto sexual fora do próprio corpo da criança, sob a forma do seio da mãe. Só mais tarde é que a pulsão perde este objeto, talvez exatamente no momento em que a criança se tor- na capaz de formar uma idéia total da pessoa a quem pertence o órgão que lhe está fornecendo satisfação. Como regra, então, a pulsão sexual se torna auto-erótica, e, somente após ter passado o período da latência, é restaura- da a relação original. Estas são, pois, boas razões do mamar da criança no seio materno tornar-se o protótipo de toda relação de amor. (Freud apud Balint, 1968, p. 31) A terceira hipótese diz respeito às reflexões sobre o narcisismo primá- rio, nas quais afirma: A forma mais primitiva de relação do indivíduo e seu entorno é o auto- erotismo, seguido pelo estágio narcísico, a partir do qual então se desen- volvem as relações objetais. (Idem)22 De qualquer forma, os inúmeros estudos posteriores sobre recém- nascidos se orientam numa outra direção: contato corporal e alimenta- ção parecem fazer parte de um complexo integrado que une mãe e filho de tal modo que os prazeres (eróticos ou não) dos bebês chimpanzés dificilmente se enquadrariam na concepção freudiana de auto-erotismo que perduraria até a fase edípica. O reexame da hipótese do auto-erotis- mo levaria a rever também a questão do narcisismo primário e o concei- to de relações anaclíticas. REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 125 - Melanie Klein, a partir de algumas colocações do próprio Freud, deu um grande passo na análise das experiências e emoções infantis com a atenção que dedicou ao seio e à amamentação como base para o estabe- lecimento de relações primitivas com objetos externos. Embora reconheça ocasionalmente outros aspectos da relação mãe- bebê, como o contato corporal, a teoria kleniana ficou de fato excessiva- mente centrada na amamentação. Ainda que posteriormente o conceito de “seio” tenha se ampliado, a própria preservação deste termo como conceito básico cria dificuldades semânticas para a compreensão mais ampla da relação mãe-bebê. A excessiva atenção à amamentação infantil e ao seio materno parece reduzir o psiquismo ou pelo menos o erotismo infantil à oralidade.23 Psicanalistas britânicos e húngaros, posteriormente, orientaram-se no sentido de ampliar a contribuição de Melanie Klein e rever de forma mais profunda o desenvolvimento infantil nas fases pré-genitais (oral e anal). A relação de objeto passa definitivamente a ter início nas fases pré-edípicas e envolve as múltiplas formas de contato com a mãe. É muito significativa, nessa orientação, a formulação, por Winnicott, do conceito de holding (que pode significar abraço ou sustentação) o qual, como na linguagem comum, tem uma dupla referência, física e psicológica, e engloba a multiplicidade dos aspectos presentes na rela- ção mãe-bebê (Winnicott, 1992, p. 263-71). Essa distinção teórica, efetuada por Balint, encontra comprovação empírica nos trabalhos experimentais. Particularmente relevante, sobre esse aspecto, é a experiência efetuada pelo casal Kellog, que criou um filhote de chimpanzé com o próprio filho. Até os dois anos, o desenvolvi- mento mental e afetivo da criança e do chimpanzé demonstrou ser estri- tamente semelhante, com algumas vantagens para o chimpanzé quanto ao desenvolvimento motor. A partir, entretanto, do momento em que a criança começou a falar, o desenvolvimento deixou de ser comparável.24 - 126 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM A conclusão a que podemos chegar é a de que o processo de desen- volvimento dos seres humanos e dos chimpanzés segue praticamente o mesmo caminho até os 2 anos. Embora se diferencie posteriormente com a constituição da linguagem, estabelece estruturas psíquicas básicas que perduram durante a vida, testemunhando continuamente a proxi- midade do parentesco entre essas duas espécies. Da perspectiva comparativa e evolutiva e na tradição psicanalítica, mais relevante ainda que a obra de Balint, é a de John Bowlby que alia a psiquiatria e a prática psiquiátrica à etologia evolucionista e à psicolo- gia experimental. Central na teoria de Bowlby é o conceito de attachment ou apego. A riqueza do conceito está em sua polissemia, incluindo aspectos físicos e psíquicos. Attachment, em inglês, designa de um lado a ação física de unir, fixar ou juntar partes de um conjunto; corresponde, portanto, a conexão, ligação, fixação. De outro, attachment corresponde a atração, simpatia, afeto ou amor. De fato, o conceito de Bowlby é explicitamente utilizado teoricamente para costurar essas duas dimensões. É semelhante ao conceito de holding, criado por Winnicott, e se aproxima do amor primário, proposto por Balint.25 De fato, partindo da relação mãe-bebê, a elaboração do conceito de attachment efetuada por Bowlby praticamente cobre a área que estamos analisando com o termo amor e se encaminha na mesma direção. Entre as características do attachment, Bowlby inclui: a especificidade, isto é, o fato de o comportamento de ligação ser dirigido para indivíduos espe- cíficos; a duração, isto é, o fato de a ligação persistir, por grande parte do ciclo vital, embora possa ser atenuada e eventualmente substituída por outras. Para as finalidades deste trabalho, entretanto, a característica mais importante é o envolvimento emocional: REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 129 - diz respeito à amamentação, convém lembrar que fórmulas seguras de aleitamento artificial datam de apenas um século (o que é menos que um segundo na história evolutiva) e, para a quase totalidade da huma- nidade, a privação do leite materno sempre significou altíssimos índices de mortalidade infantil. Nas sociedades humanas, a mãe pode ser subs- tituída por uma ama de leite, prática relativamente restrita aos casos de morte da mãe, de insuficiência na produção de leite ou, após o início da civilização, como prática habitual nas classes dominantes. Esse procedi- mento, entretanto, até o século passado, tendeu a ser emergencial ou confinado às classes abastadas e nunca generalizado para a humanidade no seu conjunto. Mesmo hoje, na grande maioria da humanidade que habita os países subdesenvolvidos, o aleitamento materno continua a ser essencial para a sobrevivência dos filhos. Por outro lado, como já vimos, a relação de attachment da mãe para com a criança, em seus múl- tiplos aspectos, é essencial não só ao desenvolvimento físico mas tam- bém mental e emocional dos bebês. Por isso mesmo, parece-me estranho que as disciplinas analíticas e a Antropologia tenham, na verdade, dedicado muito pouca atenção às implicações da possível existência de uma pulsão ou instinto materno. Não que a mãe tenha sido desconsiderada. A dependência, não só física, mas afetiva do bebê em relação à mãe, é plenamente reconhecida como fundante do desenvolvimento psíquico humano, conforme vimos ante- riormente. Mas tanto na elaboração freudiana do complexo de Édipo, como nos conceitos junguianos de complexo e de arquétipo maternos, o fato psicológico fundamental é a experiência da criança. O que me parece negligenciado é a importância que a manifestação do instinto materno assume como elemento fundamental no desenvolvimento da psique feminina ou da feminilidade. Na abordagem junguiana, o con- ceito do arquétipo materno que, como todos os arquétipos, é pensado como estando baseado em estruturas psíquicas hereditárias, é difícil de - 130 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM ser compreendido se não estiver associado a pulsões maternas inatas. Dessa perspectiva, o complexo ou arquétipo deveria ser pensado como resultante da confluência entre a necessidade infantil de cuidados ma- ternos e a pulsão ou “instinto materno” que se concretiza na gestação e na relação com a prole. Novamente precisamos considerar a contribuição, na psicanálise, de Winnicott, com o conceito de “mãe suficientemente boa” e a ênfase na totalidade mãe-bebê que caracteriza a fase inicial do desenvolvimento humano.28 De fato, Winnicott é o autor que dedica maior atenção ao fato de que a relação do bebê com a mãe implica, reciprocamente, uma relação da mãe com o bebê. Para enfatizar esse fato, chegou mesmo uma vez a afirmar que o bebê não existe – o que realmente existe é o comple- xo mãe-bebê, no qual um não existe sem o outro. O reconhecimento da existência de uma pulsão materna hereditaria- mente constituída não significa, obviamente, que sua manifestação ade- quada seja automática e independente da experiência individual ou so- cial. Entre os primatas como entre os seres humanos e muitos outros mamíferos, o grau de dedicação materna varia bastante de uma fêmea para outra e as primíparas são freqüentemente mães pouco competen- tes, do que decorre uma elevada mortalidade entre os primogênitos. Entre os chimpanzés em cativeiro, como vimos, a inexistência de expe- riência e estímulos promovidos pela vida em grupo não só diminui ou inibe totalmente a fertilidade, como promove o infanticídio direto ou indireto, através do abandono.29 No ambiente natural, está amplamen- te documentado, além do infanticídio promovido por machos de ou- tros grupos quando assumem a chefia de um grupo já constituído, tam- bém o assassinato da cria de uma fêmea por outra não aparentada (Goodall, 1988). Deve-se ainda considerar que a ligação entre mãe e cria, ou instinto materno, não se limita a manifestações de amor, mas inclui, e não só REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 131 - entre mamíferos, a agressividade contra qualquer outro animal que re- presente ou possa representar perigo para sobrevivência da prole. A existência de um instinto parece estar também evidenciada no inte- resse extremamente precoce das fêmeas por bebês. Jovens chimpanzés fêmeas que mal desmamaram ficam fascinadas pelo nascimento de uma nova cria e procuram, por todos os meios, tirá-las da mãe para carregá- las no colo e brincar com elas. Esse comportamento é particularmente visível quando se trata de um irmão ou irmã mais novos, mas não se res- tringe a eles. Como no caso do sexo, o interesse pelos bebês manifesta-se precocemente, embora só se desenvolva plenamente com a gestação e o parto. Aliás, é importante observar que machos jovens e adultos também se interessam por bebês, embora muito menos que as fêmeas e, como vimos, são extremamente tolerantes e até mesmo brincam com eles, numa atitude que chamei de paternidade difusa (Mason, 1965, p. 527). Há ainda outra observação que deve ser feita em relação a um possí- vel instinto materno, que talvez explique a raridade de relações inces- tuosas: é a separação que existe, tão claramente nos mamíferos, entre a pulsão sexual e a maternal. Em condições naturais, épocas de acasala- mento e de cuidado com os filhotes estão claramente separadas: elas se sucedem mas não se misturam. A gravidez, o parto, o aleitamento e os cuidados com a prole impli- cam a interrupção da sexualidade feminina. Embora, entre os chimpan- zés, como indicamos, as fêmeas possam retomar o ciclo de receptividade sexual antes do final do aleitamento, não o fazem antes de três anos após o parto, em média; a fertilidade só é restabelecida, como vimos, depois de cerca de quatro a cinco anos após o parto, coincidindo com o desma- me. As fêmeas experimentam assim prolongados períodos de suspensão do interesse e da atividade sexual durante pelo menos parte da gestação e durante todo período crucial de três a quatro anos em que estão mais intensamente envolvidas com o aleitamento e o cuidado com bebês. - 134 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM aliás acontece com seres humanos. É novamente Jane Goodall quem apresenta as descrições mais sensíveis e detalhadas sobre essa fase do de- senvolvimento infantil entre os chimpanzés. Claramente, é a permanên- cia da cria mais velha junto à mãe que promove a formação da relação triádica. Para a maioria dos demais mamíferos, os filhos do parto ante- rior são desmamados e se dispersam antes do nascimento da cria seguin- te. A psicanálise certamente não ignorou, mas talvez não tenha prestado suficiente atenção a esse fenômeno e à importância crucial da relação entre siblings, como decorrente da criação de relações triádicas poten- cialmente conflitivas. A antropologia, por outro lado, mostra como as relações entre siblings recebem elaborações culturais extremamente complexas. Embora essas elaborações sejam fundamentais nas teorias do parentesco, seu significado emocional não tem sido muito considerado pelos antropólogos. Mas aqui também podemos nos perguntar se não estamos lidando com elaborações simbólicas de um padrão “natural” e não com uma criação inteiramente autônoma da cultura. Sociabilidade e amor ao próximo Para concluir este ensaio, que já está um tanto longo, precisamos ainda voltar a examinar a questão da sociabilidade. Afirmar que o homem é um animal social é, para todos nós, um truísmo. Para os antropólogos, a obviedade da questão reside no fato de que o homem, tal como o conhecemos, não sobrevive sem a cultura, a qual exige a vida social. Dessa forma, as indagações antropológicas rara- mente se dirigiram no sentido de perguntar quais as origens da sociabi- lidade, mas se concentraram nas origens e na evolução do comporta- mento cultural que nos distingue dos demais animais. Mas, se não podemos imaginar o surgimento da cultura sem a existência prévia de REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 135 - alguma forma de vida coletiva, parece-me interessante indagar qual os fundamentos da sociabilidade dos grupos proto-humanos, dos quais descendemos e os quais antecedem a evolução cultural. Não somos, certamente, os únicos mamíferos sociais. Os evolucio- nistas têm enfatizado o fato de que a emergência da vida social está as- sociada à sua importância como mecanismos de proteção contra preda- dores. Mas a vida em grupo não emerge esporadicamente na natureza como decorrência de um cálculo de custo-benefício que leve alguns animais de uma espécie a se associarem espontaneamente e outros não. A vida em grupo aparece sempre como característica de uma espécie em seu conjunto e é própria de algumas e não de outras. Trata-se portanto de um padrão geneticamente estabelecido – as espécies sociais são gene- ticamente programadas para a vida em grupo e devemos então nos per- guntar em que medida este tipo de programação continua atuante no Homo sapiens. Dois mecanismos me parecem essenciais nessa progra- mação: os que evitam a dispersão dos indivíduos e os que promovem vínculos entre os membros do grupo. Obviamente não podemos incluir o raciocínio e a razão entre esses mecanismos – mas as emoções certa- mente estão envolvidas. A comparação com os chimpanzés parece-me importante para encaminhar essa questão. O problema dos fundamentos da base genética do comportamento social dos chimpanzés já foi muito bem colocado por Köhler, em 1925: Não constitui exagero afirmar que um chimpanzé mantido em isolamento não é um chimpanzé de verdade. Que certas características da espécie ape- nas surjam quando estão em grupo, deve-se simplesmente ao fato de que o comportamento dos companheiros constitui, para cada indivíduo, o único incentivo adequado para suscitar uma grande variedade de formas essen- ciais de comportamento. (Köhler, 1957, p. 239) - 136 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM É dessa forma que potenciais hereditários, aprendizado e vida social se integram uma vez que, entre chimpanzés, os estímulos não provo- cam necessariamente reações automáticas, mas permitem respostas fle- xíveis, influenciadas pela experiência individual e social. De fato, chimpanzés possuem uma vida social particularmente in- tensa e complexa. Chimpanzés não são como insetos nos quais a vida social é totalmente programada geneticamente. Ao contrário, o com- portamento grupal não elimina a imprevisibilidade e a incerteza. Chim- panzés também não são animais pacíficos e altruístas, nem o grupo é uma realidade que implique a negação da individualidade e da variabili- dade. Chimpanzés são, simultânea ou alternadamente, amáveis, carinho- sos, afetivos, agressivos, egoístas e mesmo calculistas. Nenhum é igual aos demais e a vida social é construída tanto sobre a solidariedade quan- to sobre a rivalidade e há uma complexa luta pelo poder. Em tudo isso, parecem muito semelhantes a nós. O desdobramento da constatação de Köhler nos leva a analisar a gran- de complexidade nos mecanismos que atuam na organização da vida grupal dos chimpanzés, dando particular atenção aos vínculos afetivos. Já analisamos anteriormente alguns deles: a hierarquia, a sexualidade, a promiscuidade, as relações entre mães e filhos e a consangüinidade. Cabe agora mencionar a sociabilidade em geral. Robin Durban chama a atenção para um aspecto fundamental da personalidade chimpanzé que parece constituir uma das bases do com- portamento social: é o intenso interesse e curiosidade que demonstram em relação uns aos outros, estando permanentemente atentos a quem está fazendo o quê, onde e com quem. Nisso, diz ele, são extremamente semelhantes a nós. Nas pesquisas que realizou com seus alunos sobre o que acontece nas reuniões sociais em bares, restaurantes, festas e inclusi- ve em reuniões departamentais na universidade, chegou à conclusão de que mais de dois terços das conversas é dedicada à discussão de senti- REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 139 - sozinhos; e à busca frenética com a qual se empenham em juntar-se ao grupo. Nas experiências de laboratório, um animal isolado demonstra muito mais ansiedade do que quando há outro chimpanzé presente. A companhia de outros chimpanzés parece constituir um elemento essen- cial para o sentimento de segurança individual e uma extensão dos vín- culos que demonstramos serem tão importantes entre mães e bebês. A importância da proximidade com outros indivíduos, além da mãe, começa muito cedo. Entre os mamíferos que normalmente têm partos múltiplos, os irmãos da mesma ninhada brincam uns com os outros. O brinquedo constitui de fato uma das características mais interessantes dos mamíferos. Chimpanzés que dão à luz um filhote de cada vez não possuem irmãos da mesma idade. Mas mães com filhos pequenos cos- tumam procurar a companhia umas das outras, o que promove a forma- ção de grupos de brincadeira. Pequenos chimpanzés costumam brincar em grupos de 4 a 5 horas por dia. As brincadeiras envolvem muito conta- to físico e incluem exploração do ambiente, lutas e perseguições acrobá- ticas através das árvores. Como acontece com crianças humanas, a com- panhia de parceiros parece estimular aventuras mais ousadas. Além disso, conforme vimos, adolescentes e mesmo adultos também brincam com filhotes especialmente se forem filhos de sua mãe. Adolescentes tam- bém brincam uns com os outros e formam grupos de convivência. A sociabilidade entre os chimpanzés não é entretanto indiscriminada. Chimpanzés, especialmente fêmeas, mantêm relações preferenciais de longa duração com indivíduos específicos, procurando a companhia do parceiro. Creio que não constitui um antropoformismo afirmar que chimpanzés desenvolvem amizades. Esse fenômeno está documentado em praticamente todas as observações de campo e as realizadas em colô- nias artificialmente criadas em cativeiro. As relações de amizade se exteriorizam numa convivência mais fre- qüente e como apoio contra agressões por parte de outros membros do - 140 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM grupo ou em caso de perigo externo e desempenham papel fundamen- tal nas coalizões que são tão importantes nas disputas por posições na hierarquia. Mesmo que um chimpanzé não socorra um companheiro que esteja, por exemplo, sendo atacado por um macho dominante (o medo do macho é maior do que a solidariedade), nem por isto a solida- riedade deixa de se manifestar através de grande desassossego e gritos de protestos. Assim que o ataque termina, o companheiro se aproxima da vítima para confortá-la. A teoria do attachment de Bowlby, a qual nos referimos anteriormen- te, parece ser, como ele mostra, muito adequada para explicar os víncu- los interindividuais que os chimpanzés estabelecem entre si. De fato, chimpanzés, como seres humanos, parecem estar geneticamente equi- pados para desenvolver esse tipo de relações afetivas. Os vínculos afetivos, como as demais relações, apóiam-se sobre um complexo sistema de comunicação. Em primeiro lugar, há que indicar a importância das vocalizações que constituem um modo fundamental de comunicação. Chimpanzé, como a grande maioria dos primatas so- ciais, são extremamente barulhentos e os diferentes tipos de gritos e gru- nhidos são capazes de expressar mensagens diferenciais: perigo e pedidos de socorro, alegria, raiva, queixas, solicitações e solidariedade. Igualmen- te importantes são as expressões corporais e faciais as quais parecem abranger uma amplitude de significados pelo menos tão grande quanto as vocalizações. É por essa razão que eles são tão bons figurantes em documentários e em filmes de ficção. Melhor do que qualquer descri- ção que eu possa fazer é a observação de um desses filmes com os quais, tenho certeza, os leitores já tiveram algum contato. Particularmente importante para a comunicação, a criação e consoli- dação de relações interindividuais, especialmente as de cunho afetivo, é o contato corporal. Já apontamos a importância do contato com o cor- po materno na relação mãe-bebê. Essa importância do contato corporal REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 141 - permeia toda a sociabilidade adulta e constitui inclusive um mecanismo fundamental de pacificação, após um conflito, e de restabelecimento de relações amistosas. A alegria ao encontrar um companheiro se expressa, por exemplo, através de abraços e “beijos”. A aproximação com intenções amistosas se manifesta na mão estendida, com a palma para cima, que é tocada ou “beijada” pelo parceiro. Machos derrotados numa disputa manifestam intensa perturbação através de gritos e só se acalmam quando o vence- dor os toca com a mão, em palmadinhas carinhosas. Mas na expressão e consolidação dos laços afetivos, na pacificação de indivíduos raivosos e no consolo de companheiros frustrados ou derro- tados, há uma forma de contato corporal extremamente importante, que consiste no tipo de comportamento designado em inglês como groom- ing, que envolve a minuciosa inspeção da pele e do pêlo para remoção de sujeiras e parasitas. O grooming se assemelha ao cafuné brasileiro quando este inclui (como era comum no passado) o despiolhamento. Esse tipo de cafuné é uma atividade absorvente nos primatas em geral e chega a ocupar um quarto do tempo em que estão acordados. É freqüente observar esse cuidado com o pêlo envolvendo mães e seus filhos: ocorre entre adultos, tanto machos como fêmeas; independente- mente de sexo. Machos adultos passam grande parte do tempo, quando não estão buscando alimentos, catando-se uns aos outros, o que parece consolidar a solidariedade grupal e a formação de coalizões de machos na disputa pelo poder. Esse comportamento é também freqüente entre machos e fêmeas no cio e constitui, de fato, uma atividade extrema- mente absorvente para todos os chimpanzés. Os antropólogos não se preocuparam em registrar essa prática em outras sociedades humanas. Mas Malinowski inclui em A vida sexual dos selvagens uma fotografia, a de nº. 25, que mostra um homem agachado e uma mulher ajoelhada atrás dele, com as mãos na sua cabeça, com a observação de que o - 144 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM deiro, mas na surpreendente descoberta de que eles podem prever o nosso, interpretar corretamente nossas intenções e se comunicar conos- co. Mas, ainda, as relações afetivas que pesquisadores estabelecem com os chimpanzés têm como contrapartida as relações afetivas que eles de- senvolvem em relação aos seres humanos. Escolhi, para ilustrar as relações afetivas, um relato de Köhler, que foi um dos primeiros a realizar observações sistemáticas e controladas com chimpanzés vivendo em grupo: Uma noite, quando chovia a cântaros, ouvi dois animais, que eram manti- dos isolados num cercado especial, reclamando amargamente. Corri até lá e descobri que o tratador os havia deixado ao relento, tendo quebrado a chave do abrigo onde podiam se esconder da chuva. Forcei a fechadura e consegui abrir a porta, ficando de lado para que os chimpanzés pudessem correr rapidamente para seu abrigo quente e seco. Mas, embora a chuva fria escorresse de todos os lados sobre os corpos trêmulos de frio dos chim- panzés, embora eles tivessem demonstrado a maior infelicidade e impaciên- cia e eu próprio permanecesse no meio da chuva pesada, antes de correrem para o abrigo eles se viraram e me abraçaram, um em torno da cintura, outro ao redor do joelho, numa alegria frenética. Apenas depois disso é que mergulharam na palha seca e quente do abrigo. (Köhler, 1957, p. 250) Se podemos ter alguma dúvida quanto ao fato de sermos semelhan- tes aos chimpanzés, desconfiando do antropomorfismo, eles próprios parecem ter certeza de serem semelhantes a nós, de poderem ser enten- didos por nós, de se comunicarem conosco, de nos compreenderem e, inclusive (pelo menos até certo ponto), de nos amarem. REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 145 - Notas 1 Os americanos, é verdade, mantiveram durante mais tempo uma preocupação com os aspectos universais da cultura e sua base biológica. Pode-se ver isso claramente nos clássicos manuais de antropologia das décadas de 1930, 1940 e 1950, como os de Linton e Herskovits. Mas a antropologia americana recente deixou inteiramen- te de lado essas preocupações. 2 Na verdade, a obra de Lévi-Strauss contém também alguns pequenos primorosos trabalhos sobre a influência emocional, especialmente “A eficácia simbólica” e “O feiticeiro e sua magia”, além de passagens de O pensamento selvagem (1962), nas quais se salienta o caráter simultaneamente intelectual e afetivo da “lógica do con- creto” (Cap. II, p. 50 ss.) 3 Os documentários que se popularizaram recentemente, especialmente os que di- zem respeito aos chimpanzés, apresentam, entretanto, distorções perigosas. Pelo fato de geralmente focalizarem um ou outro aspecto específico da vida dos animais observados, eliminam a complexidade e diversidade da sua vida social. Assim, bonobos são retratados como ginecocraciais e chimpanzés, ora como caçadores san- guinários, ora como idílicos pacifistas. 4 Para uma abordagem recente dessa questão, ver Ekman e Friesen (1998). 5 São particularmente relevantes, para este trabalho, as observações de Köhler relati- vas à expressão e comunicação das emoções entre os chimpanzés, especialmente o anexo intitulado “Algumas contribuições para a psicologia dos chimpanzés” (Köhler, 1957). Ver também Yerkes e Yerkes (1929). 6 Para uma súmula dos estudos de campo sobre antropóides, ver Itami (1998). 7 Wallman (1982) apresenta uma excelente análise crítica do conjunto desses trabalhos. 8 O Velho Testamento, entretanto, descreve muitas outras relações às quais aplicaría- mos o termo amor. Deus mesmo manifesta preferências afetivas muito marcadas. Por exemplo, amava mais Abel que Caim, e Jacó em oposição a Esaú. Além do - 146 - EUNICE R. DURHAM. CHIMPANZÉS TAMBÉM AMAM mais, o Velho Testamento celebra a paixão de Jacó por Raquel, a de Salomão por Sulamita e condena a paixão de Davi por Betsabá. A preferência do pai por um de seus filhos tem um lugar de destaque, como o caso do amor de Israel por José. 9 Haveria ainda que notar a superposição de significados entre as palavras amar e gostar. Esta última é mais independente de conotações sexuais. 10 Para um conhecimento mais detalhado dos bonobos, além das coletâneas citadas a seguir, é particularmente informativo o livro de Waal: Bonobo, The forgotten apes (1997). A preferência pelos chimpanzés neste trabalho se deve ao fato de que os estudos são muito mais abundantes e os trabalhos de campo, tanto como as expe- riências de laboratório, mais antigos e abrangentes, incluindo observação conti- nuada de diversas gerações. 11 Utilizamos o conceito de grupo e não de sociedade para designar um conjunto de indivíduos que se reconhecem mutuamente e se contrapõem a outros indivíduos ou agrupamentos da mesma espécie. A identificação recíproca dos membros do grupo é a referência central do conceito. 12 Além dos trabalhos de campo, é particularmente importante o trabalho de Waal com a colônia do zoológico de Arnhem, Chimpanzee politics, de 1989, e o já cita- do trabalho de Dunbar (1998, p. 19). 13 Para informações mais detalhadas sobre esses antropóides consultar especialmente as coletâneas publicadas por McGrew et al. (1996) e Devore (1965). Para os gori- las, em especial, ver Schaller (1963 e 1967), Fossey (1983), Watts (1996) e Tutin (1996). Sobre os chimpanzés, a bibliografia final contém as referências aos traba- lhos utlizados que incluem Goodall (1965 e 1998), Hashimoto e Furuichi (1994), Köhler (1957), Mason (1965), McGrew (1992), McGrew et al. (1996), Magnew (1992), Reynolds e Reynolds (1965), Waal (1989 e 1997) e Wragham (1994). 14 No caso dos gorilas, os grupos podem também envolver mais de um macho adulto. 15 A palavra “instinto” está muito desacreditada na biologia e na psicologia. Entre- tanto, está constantemente presente no senso comum e reemerge freqüentemente REVISTA DE ANTROPOLOGIA, SÃO PAULO, USP, 2003, V. 46 Nº 1. - 149 - Referências bibliográficas BALINT, M. 1968 The Basic Fault. London, Tavistock. BOWLBY, J. 1958 “The nature of child’s tie to his mother”. International Journal of Psychoana- lysis, 39(5). 2001 Formação e rompimento dos laços afetivos. São Paulo, Martins Fontes. DAMÁSIO, A. R. 1984 Descartes’ error. Emotion, reason and the human brain. 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