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Guias e Dicas
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Comunicação: Conceitos, Fundamentos e História - Sousa e Outros, Notas de aula de Comunicação

Uma revisão do processo de comunicação, enfatizando conceitos básicos, fundamentos científicos e a história da comunicação. A pesquisa bibliográfica aborda diferentes perspectivas sobre o processo de comunicação e os meios de comunicação de massa, concluindo a existência de uma transição socio-tecnológica da informação. Palavras-chave: processo de comunicação, linguagem, cultura, tecnologia.

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Pamela87
Pamela87 🇧🇷

4.5

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Baixe Comunicação: Conceitos, Fundamentos e História - Sousa e Outros e outras Notas de aula em PDF para Comunicação, somente na Docsity! Comunicação: conceitos, fundamentos e história João Batista Perles∗ Índice Introdução 1 1 Fundamentos científicos 2 2 Do grunhido à Internet 4 3 Efeitos convergentes 11 Considerações finais 14 Referências bibliográficas 15 Resumo Visando colaborar prioritariamente para com as disciplinas de Teorias da Comunicação e História da Comunicação, o presente trabalho faz uma releitura do processo de comunicação, focando-se nos marcos conceituais, nos fundamentos científicos e na história da comunicação. Para tanto, toma como elementos essenciais a tríade linguagem, cultura e tecnologia. Recorrendo à pesquisa bibliográfica o texto reúne dife- rentes visões relacionadas ao processo de comunicação e a história dos meios de co- municação de massa e conclui pressupondo a existência de uma transição de modelo sócio-tecnológico da informação. Palavras-chave: processo de comunica- ção, linguagem, cultura, tecnologia. ∗Professor de Teorias da Comunicação na Facul- dade de Selvíria (FAS)-MS; Professor de Jornalismo Especializado nas Faculdades Integradas de Três La- goas (AEMS)-MS. Introdução Comecemos por falar brevemente sobre o nosso objeto de estudo: o processo de co- municação. Ele representa um dos fenô- menos mais importantes da espécie humana. Compreendê-lo, implica voltar no tempo, buscar as origens da fala, o desenvolvimento das linguagens e verificar como e por que ele se modificou ao longo da história. A linguagem, a cultura e a tecnologia são elementos indissociáveis do processo de co- municação. Quanto à primeira, Tattersall (2006, p. 73) afirma categoricamente que “[...] se estamos procurando um único fator de liberação cultural que abriu caminho para a cognição simbólica, a invenção da lingua- gem é a candidata mais óbvia.” Quanto aos outros dois, nos parece pertinente concordar com Mayr (2006, p. 95) ao propor que “Uma pessoa do século XXI vê o mundo de ma- neira bem diferente daquela de um cidadão da era vitoriana” e que “Essa mudança teve fontes múltiplas, em particular os incríveis avanços da tecnologia.” Souza Brasil (1973, p 76), mais incisivo, enxerga a cultura como subordinada às formas de comunicação Ora, se a existência da cultura está su- bordinada a forma de comunicação do tipo humano, isto é, comunicação simbó- lica, temos que admitir que os fundamen- tos da comunicação precisam ser bus- 2 João Batista Perles cados nos caracteres biológicos do ho- mem, pois cultura e comunicação sim- bólica surgiram na terra simultaneamente como o próprio gênero humano. Assim, cultura e comunicação são conceitos su- plementares, não se constituindo, nem um nem outro, fundamento mas condição necessária para compreensão e existência de cada um. Sendo assim, a linguagem, a cultura e a tecnologia constituem a tríade de fatores que alicerçam o presente trabalho. Para tanto, re- corremos à pesquisa bibliográfica, tomando a antropologia, a história, a sociologia, a lingüística e as teorias da informação como campos de conhecimentos principais, mas não exclusivos. Ao explorarmos o vastíssimo campo da comunicação em seus variados aspectos te- mos por objetivo geral contribuir para com as Teorias da Comunicação e a História da Co- municação. Além disso, consideramos que o presente trabalho serve como contraponto à histórica dos meios de comunicação, intro- duzindo alguns vieses, incluindo nomes de pessoas e seus papéis tantas vezes esqueci- dos por aqueles que contam a história dos mass media. 1 Fundamentos científicos De imediato, podemos classificar a comuni- cação conforme propõem os dicionários, as- sim o termo seria apenas mais um substan- tivo feminino: “1. ato de comunicar; infor- mação, aviso; 2. passagem, caminho, liga- ção”. (Rocha 1997, p.154). Mas tal classi- ficação, além de insuficiente para descrever o fenômeno, se serve do longo processo de desenvolvimento da linguagem para simpli- ficar um dos fenômenos mais importante da socialização, cujos limites sempre estão por vir, conforme ressalta Baitello Júnior (1998, p.11): Hoje o homem tenta lançar pontes (ainda que hipotéticas) não apenas sobre a ori- gem do universo, sobre o chamado big bang, mas também sobre as raízes remo- tas dos códigos da comunicação humana. Constata que a capacidade comunicativa não é privilégio dos seres humanos; está presente e é bastante complexa em mui- tos outros momentos da vida animal, nas aves, nos peixes, nos mamíferos, nos in- setos e muitos outros. Resgatando o termo em sua etimologia Marques de Melo (1975, p. 14) lembra que “comunicação vem do latim ‘commu- nis’, comum. O que introduz a idéia de co- munhão, comunidade” (grifos do autor). Mas, se falamos em “processo de comu- nicação”, cabe também uma rápida inspeção no termo “processo”. Berlo (1991, p. 33) assim descreve sua aceitação do termo: Um dicionário, pelo menos, define “pro- cesso” como “qualquer fenômeno que apresente contínua mudança no tempo”, ou “qualquer operação ou tratamento contínuo”. Quinhentos anos do nasci- mento de Cristo, Heráclito destacou a im- portância do conceito de processo, ao de- clarar que um homem não pode entrar duas vezes no mesmo rio; o homem será diferente e assim também o rio. [...] Se aceitarmos o conceito de processo, ve- remos os acontecimentos e as relações como dinâmicos, em evolução, sempre www.bocc.ubi.pt Comunicação: conceitos, fundamentos e história 5 primeiros artefatos líticos (ou seja, de pe- dra) datados com segurança foram recolhi- dos em Gona, na região do Hadar, país dos Afaris (Etiópia) e contam com uns 2,5 mi- lhões de anos de antiguidade”. No que con- cerne à emissão de mensagens, ou seja, ao processo de comunicação, só muito tempo depois é que o homem se serviu de algum ar- tefato a fim de quebrar a barreira do espaço e do tempo. Para que a comunicação hu- mana alcançasse o estágio atual, tanto em vo- lume e formatos, quanto em velocidade, fo- ram necessárias diversas transformações fisi- ológicas e processos tecnológicos revolucio- nários. Algumas mudanças aconteceram há tanto tempo que quase nunca são menciona- dos ou percebidos pelo homem, mas os seus traços se conservam e, vez ou outra, se fazem presentes nos gestos, expressões e ruídos que emitimos. 2.2 Linguagem e comunicação Até hoje os estudiosos ainda buscam chegar a uma conclusão definitiva sobre como os homens primitivos começaram a se comuni- car entre si, se por gritos ou grunhidos, por gestos, ou pela combinação desses elemen- tos. De qualquer modo, o homem chegou à as- sociação dos sons e gestos para designar um objeto, dando origem ao signo, conforme nos fala Bordenave (1982, p.24) Qualquer que seja o caso, o que a histó- ria mostra é que os homens encontraram a forma de associar um determinado som ou gesto a um certo objeto ou ação. As- sim nasceram os signos, isto é, qualquer coisa que faz referência a outra coisa ou idéia, e a significação, que consiste no uso social dos signos. A invenção de uma certa quantidade de signos levou o homem a criar um processo de organização para combiná-los entre si, caso contrário, a utilização dos signos desordena- damente dificultaria a comunicação. Foi essa combinação que deu origem à linguagem se- gundo Bordenave (idem, p. 25) quando diz que “de posse de repertórios de signos, e de regras para combiná-los, o homem criou a linguagem”. Certamente a afirmação de Bor- denave refere-se à linguagem verbal (oral ou escrita) bem articulada e não à linguagem em sua acepção mais genérica que inclui a pos- sibilidade do homem emitir sons guturais a fim de expressar sensações. Não por acaso, Tattersall (idem, p. 72) nos faz recordar que “os humanos tinham um trato vocal capaz de produzir os sons de fala articulada mais de meio milhão de anos antes que surgisse evi- dência de linguagem.” É quase de domínio popular o fato de que o processo de comunicação visual sur- giu muito antes da escrita. Não por acaso, conforme nos adverte Peltzer (1991, p. 98), “muito antes de qualquer escrita, os que habitaram as grutas de Altamira comunica- ram com seus semelhantes (e poder-se-ia di- zer que continuam a comunicar)” uma vez que “quem visita hoje essas grutas recebe as mensagens cujos emissores são nossos ante- passados [...]”. Esse fato, por si, torna desne- cessário discorrer mais amplamente acerca da importância da expressão visual para o homem. Entretanto, parece-nos interessante acolher alguns pressupostos teóricos formu- lados por Santaella e Nöth (1998, p. 13), para quem a imagem faz parte da expressão humana “desde as pinturas pré-históricas” e www.bocc.ubi.pt 6 João Batista Perles “hoje, na idade do vídeo e infográfica, nossa vida cotidiana—desde a publicidade televi- siva no café da manhã até as últimas notícias no telejornal da meia-noite—está permeada de mensagens visuais [...]”. Inicialmente o homem comunicava os acontecimentos na mesma ordem em que eles se davam, ou seja, um caçador descre- via sua rotina na mesma seqüência dos fa- tos. Se pegava uma arma, enfrentava um ani- mal, matava-o e comia-o, assim desenhava nos pictogramas (desenhos ou símbolos) e ideogramas (sinal que exprime a idéia e não os sons da palavra, em oposição à fonográ- fica). Há cerca de 3.000 anos antes de Cristo, os egípcios representavam aspectos de sua cul- tura por meio de desenhos e gravuras colo- cados nas casas, edifícios e câmaras mortuá- rias. Os signos sonoros e visuais, como o tantã, o berrante, o gongo e os sinais de fumaça, fo- ram os primeiros a serem utilizados pelo ho- mem a fim de vencer a distância. A utiliza- ção desses artefatos caracteriza a tecnologia da comunicação em seus primórdios, já que, através deles a mensagem humana vence o âmbito familiar e grupal. Mas somente com a invenção da escrita, por volta do século IV antes de Cristo, é que o homem encontrou uma solução mais definitiva para o problema do alcance, já que a mensagem escrita pode ser levada de um para outro lugar. Mais do que isso, a escrita inaugura o início da histó- ria, uma vez que, sem ela, “poucos especia- listas ousam fazer assertivas, e a maior parte das interpretações é tão genérica e cautelosa que quase nada revela sobre a vida na pré- história (Gontijo, 2004, p. 48).” 2.3 A escrita e a tradição oral O homem descobriu que as palavras ou no- mes de objetos eram compostos por unida- des menores de som, descobrindo, portanto, os fonemas e, conseqüentemente, a possibili- dade de representar os objetos e as coisas por meio destas unidades. Esta descoberta per- mitiu o surgimento da escrita chamada fono- gráfica, na qual os signos representam sons. A combinação dos sons em seqüências de diversos comprimentos pode, além de des- crever objetos, representar idéias. A possi- bilidade dos signos gráficos serem represen- tados por unidades de sons menores que as palavras deu nascimento ao conceito de le- tras. Com elas, o homem formou os alfabe- tos. Antes que o alfabeto tomasse a forma que o conhecemos atualmente, passou por inúmeras transformações. Primeiro surgiram os silabários, que consistiam num conjunto de sinais específicos para representar cada sí- laba chegando muito tempo depois ao alfa- beto greco-latino (Gontijo, idem, p. 48-166). Mas, ainda assim, por séculos, a cultura continuou sendo transmitida oral e visual- mente. Durante a Idade Média o povo não tinha acesso à linguagem escrita, que era res- trita aos monges e às pessoas letradas. Enquanto a linguagem se desenvolvia, os suportes e meios de comunicação também iam se aperfeiçoando. O surgimento do pa- pel, inventado pelos chineses, substituiu as superfícies de pedra, os papiros e os perga- minhos de couro, então utilizados para a es- crita. A história da escrita tem muito de fascí- nio. Antes que a tecnologia ocidental de im- pressão surgisse para disseminar os textos, as cópias manuscritas circulavam entre os pou- cos que decifravam seus códigos. Briggs e www.bocc.ubi.pt Comunicação: conceitos, fundamentos e história 7 Burke (2004, p. 19) contam que “nas expe- dições que fazia, Alexandre, o Grande, car- regava consigo um porta-jóias com a Ilíada de Homero,” e que, “além disso, uma grande biblioteca com cerca de meio milhão de ma- nuscritos foi erguida na cidade que levou seu nome, Alexandria”. 2.4 Prensa, tecnologia e comunicação de massa Entre 1438 e 1440, o alemão Johann Gens- fleish Gutenberg aperfeiçoou os tipos mó- veis criados pelos chineses que foram os primeiros a imprimir livros. O sistema de prensa tipográfica criado por Gutenberg, as- sociado às possibilidades oferecidas pelo al- fabeto romano, composto de pouquíssimas letras quando comparado aos inúmeros ide- ogramas chineses, não somente possibilitou a produção de livros em grande escala, como propiciou o surgimento do jornal. Dava-se então o primeiro passo para a democratiza- ção da escrita e, conseqüentemente, do saber, conforme ressalta Gontijo (idem, p. 167) di- zendo que “quando foi possível mecanizar esse processo através da prensa e reproduzir em série, o livro tornou-se portátil e o saber extrapolou os limites dos mosteiros, feudos e nações.” O surgimento do sistema tipográfico gu- tenberguiano é considerado a origem da co- municação de massas por constituir o pri- meiro método viável de disseminação de idéias e informações a partir de uma única fonte. Ao surgimento da imprensa Fernando Sá (2002, orelha) ressalta um outro importante marco histórico O aparecimento e difusão da imprensa também estará diretamente vinculada ao desenvolvimento comercial e industrial das principais cidades da Europa. É com a imprensa que a cultura sai dos claus- tros e vai para as ruas, permitindo o sur- gimento do público leitor. Quando uma parte importante desses leitores passa a se interessar pelas publicações políticas e decide se envolver com os assuntos pú- blicos, teremos chegado ao nascimento do público político. Porém, o jornal não foi o primeiro pro- duto a ser impresso por meio da tecnologia dos tipos móveis. Antes, Gutenberg produ- ziu cerca de 300 exemplares da Bíblia divi- didos em dois volumes. O clero, que via na impressão uma ame- aça ao seu domínio, rendeu-se à tecnologia tipográfica e passou a utilizar o invento para imprimir as indulgências, textos teológicos e manuais de instrução para a condução de in- quisições, aumentando a influência da Igreja. Bacelar, (2002, p.2) descreve como a pro- dução de textos foi fundamental para a que- bra do papel da Igreja como guardiã da ver- dade espiritual. Segundo ele Cópias impressas das teses de Lutero fo- ram rapidamente divulgadas e distribuí- das, desencadeando as discussões que vi- riam iniciar a oposição à ideia do papel da Igreja como único guardião da ver- dade espiritual. Bíblias impressas em linguagem vernáculas, em alternativa ao latim, alimentaram as asserções da Re- forma Protestante que questionavam a necessidade da Igreja para interpretar as Escrituras — uma relação com Deus po- dia ser, pelo menos em teoria, directa e pesssoal. www.bocc.ubi.pt 10 João Batista Perles negação de ‘estesia’, em que os sentidos e sensações são bloqueados.” Partindo de tais princípios, nos parece que as experiências estéticas encontram-se relacionadas ao nú- mero de sentidos que as mensagens e os meios de comunicação são capazes de aci- onar no homem. A tecnologia que propiciou a imagem em movimento e adicionou a ela o elemento sonoro, rompeu com as experiên- cias estéticas até então vivenciadas por meio da técnica de impressão. O cinema antecedeu a televisão enquanto tecnologia que possibilitou a visualização da imagem em movimento. Assim como o rádio, a televisão também nasceu de um conjunto de descobertas inici- adas em 1817 quando o químico sueco Tons Jacob Berzelius descobriu o selênio, que pro- duzia uma corrente de elétrons sempre que atingido por um feixe de luz. Em 1923, o russo naturalizado americano, Vladimir Zworykin, inventou o iconoscó- pio que, aperfeiçoado, iria se converter no atual tubo de imagem dos televisores, tam- bém chamado de cinescópio. De acordo com Gotijo (idem, p. 404) Os primeiros passos para a televisão co- mercial foram dados pela RCA, com a tecnologia desenvolvida pelo russo natu- ralizado americano Wladimir Zworykin. Foi o seu sistema, completamente eletrô- nico, que permitiu a primeira demonstra- ção pública, em Nova York, de transmis- são das imagens produzidas nos estúdios da RCA. As primeiras experiências de transmis- são iniciadas na década de 1930 na Europa e nos Estados Unidos foram interrompidas pela Segunda Guerra Mundial, somente re- tornando após o conflito. Já na década de 1950 existiam diversos modelos de recepto- res. Estava, portanto, concretizado o invento que uniu o som e a imagem em movimento. O Brasil foi o quinto país do mundo a pos- suir emissora de televisão, depois dos Esta- dos Unidos, Grã-Bretanha, Países Baixos e França. A primeira emissora brasileira foi a PRF3-TV, futura Rede Tupi de São Paulo, inaugurada em 18 de setembro de 1950. O incremento na comunicação viveu uma nova fase com a invenção dos satélites. Os primeiros geoestacionários do tipo Syncom foram colocados no espaço nos anos de 1963 e 1964, servindo simultaneamente a diversas estações terrestres de localidades ou países diferentes. Mas o processo de integração dos meios de comunicação iria sofrer o mais profundo impacto com o advento da rede mundial de computadores, denominada Internet. A rede planetária surgiu de experiências e pesqui- sas realizadas para fins militares no final da década de 1950 e, dela, deriva o debate entre apocalípticos e integrados, permeados por um terceiro grupo denominado “técnico- realístico” citado por Lemos (1998, p. 46): O imaginário da cibercultura é perme- ado por uma polarização que persegue a questão da técnica desde tempos ime- moriais: medo e fascinação. O que ve- mos hoje, com o desenvolvimento da ci- bercultura (Internet, realidade virtual, cy- borgs, hipertexto, etc.), é o acirramento da querela entre o que Umberto Eco cha- mou de apocalípticos e integrados (Eco, 1979).[...] um grupo de americanos criou, em março de 1998, uma corrente de pensamento e posicionamento em re- lação à tecnologia batizada de “técnico- realismo”. www.bocc.ubi.pt Comunicação: conceitos, fundamentos e história 11 Mais recentemente, Briggs e Burk (idem, p. 310) aludindo à Internet afirmam ser dela a responsabilidade por uma nova psicologia Em um período de aceleração da tec- nologia, a Internet desafiou as previsões [...]. Rapidamente deixou para trás a fí- sica e desenvolveu uma psicologia pró- pria, como havia sido feito o desbrava- mento da fronteira, e o que veio a ser chamado de sua “ecologia”, palavra nova nos estudos da comunicação [...]. Assim, nos parece que a Internet conso- lida uma era estetizada pela imagem, mas não a supera, conforme se poderia deduzir de modo simplista. 3 Efeitos convergentes Sentado em uma poltrona, acompanhado ou não por outras pessoas, no silêncio de um cô- modo tomado pela penumbra ou num am- biente de extrema iluminação e sacudido pela algazarra de vozes e sons, o homem aponta o controle remoto para a televisão e, utilizando-se de suas múltiplas funções, “na- vega” por diferentes canais, aumenta e dimi- nui o volume do som, controla as cores e a intensidade de luz da imagem etc. Tudo isso, envolvido na simplicidade das coisas e go- zando do conforto das condições que a vida moderna pode oferecer, dependendo, eviden- temente, do poder aquisitivo de cada um. Se voltarmos no tempo, em plena era do vapor, vamos nos deparar com um texto de Willian Shockley, escrito em 1927, retra- tando uma época em que a mecânica tinha lá os seus deslumbramentos. (Burke apud Shockley, 2004, p. 26): Nossa era é eminentemente mecânica. Viajamos de um lugar a outro a velocida- des relativamente monstruosas, falamos uns com os outros a grandes distâncias e lutamos contra nossos inimigos com surpreendente eficiência — tudo com a ajuda de artifícios mecânicos. Vinte anos depois (1947), o próprio Shoc- kley, em parceria com Jhon Bardeen e Walter Brattain, seria responsável pela invenção do transistor, dispositivo eletrônico que levou ao surgimento do circuito integrado, como bem lembra Burke. (idem, p. 27). Shockley dividiria um prêmio Nobel de física, em 1956, quando a miniaturização de circuitos elétricos estava começando a transformar todos os aspectos de projeto e uso tecnológicos. [...] Todavia, a de- manda por transistores ainda engatinhava e só aumentou acentuadamente após o advento do circuito integrado. Utilizamos esta introdução apenas para descrever como a tecnologia, na ponta de consumo, opera a sensação de linearidade. Ao chegar no homem-consumidor, apare- lhos, equipamentos, acessórios e proces- sos promovem o bem-estar social resumido numa comodidade inimaginável há algumas décadas. O produto acabado esconde, em sua fetichização, uma cadeia de produção vertiginosa que vai desde o trabalho mais “simples” do operário que regula e controla as máquinas na linha de produção aos téc- nicos que operam os complexos equipamen- tos dos laboratórios de nanotecnologia, pas- sando pelos inúmeros pesquisadores encar- regados de planejar as formas e os conteúdos dos produtos que serão lançados como novas www.bocc.ubi.pt 12 João Batista Perles vedetes nos mais variados segmentos do con- sumo. Eis, pois, aqui, o termo mágico pelo qual tudo se move: consumo. Esse aspecto é tratado por Jambeiro (1998, p. 3) quando lembra que a concepção de serviços e pro- dutos se destina à apropriação das estruturas econômico-financeiras da sociedade. Não importa a natureza da informação, a tecnologia necessária para transformá- la, editá-la, transportá-la ou armazená- la é a mesma, embora em certa medida persistam métodos e qualificações dife- renciados para os processos de concep- ção e produção de serviços e produtos. Serviços e produtos estes que passaram a submeter-se aos processos de apropri- ação típicos das estruturas econômico- financeiras da sociedade. O cenário atual é caracterizado forte- mente pelas ocorrências de arranjos técnicos que produzem ininterruptas convergências. Trata-se do equacionamento de conteúdos no formato de arquivos digitais, infra-estrutura de transmissão e plataforma de visualização. De acordo com Briggs (idem, p. 270), desde 1990 o termo convergência é aplicado ao de- senvolvimento tecnológico digital, “à inte- gração de texto, números, imagens, sons e a diversos elementos na mídia”. Para entendermos minimamente as vicis- situdes da convergência precisamos retomar a história do desenvolvimento tecnológico da informação. O inventário desse processo his- tórico, evidentemente, está além do que pre- tende este trabalho, mas é imprescindível ci- tar ao menos os fatos mais relevantes. A co- meçar pelo computador que, no início, fun- cionava mecanicamente. Seu protótipo foi exposto na Galeria de Instrumentos Cientí- ficos no King’s College, em Strand (Grã- Bretanha), por seu inventor, o economista britânico Charles Baggage. Sem o computa- dor não haveria como lançar os satélites geo- estacinários e, nem tampouco, possibilidades de interligar as pessoas por meio da Internet. Quando em outubro de 1957 a ex-União Soviética colocou o Sputnik no ar, seu lança- mento chamou mais a atenção do que o pró- prio computador — equipamento imprescin- dível para a ocorrência daquele ato — des- pertando, segundo Briggs (idem, p.293), o governo norte-americano para uma corrida tecnológica. Por um breve período na história mun- dial, os satélites de comunicações, os “comsats”, impossíveis de serem lança- dos sem os computadores, atraíam mais a atenção do que os próprios computa- dores. Os satélites eram as mais fasci- nantes (alguns diriam até “sexy”) expres- sões de tecnologia depois do lançamento do Sputinik pela União Soviética em ou- tubro de 1957, o surpreendente “acon- tecimento” que levou o governo norte- americano a encontrar uma resposta o mais rápido possível. As primeiras transmissões de programas de televisão via satélite foram enviadas em 11 de julho de 1962. Futuramente o satélite teria sua utilização ampliada para a telefonia. Foi o lançamento do Sputinik que levou o governo norte-americano a investir no desen- volvimento da rede de computadores. A Ad- ministração dos Projetos de Pesquisa Avan- çada do Departamento de Defesa dos Esta- dos Unidos foi fundada em 1957 e recebeu grande injeção de verbas entre os anos de 1968 e 1969, como resposta aos soviéticos. www.bocc.ubi.pt Comunicação: conceitos, fundamentos e história 15 municação humana passa por uma explosão similar, compreendendo que apenas uma vi- são transdisciplinar poderá enxergar o objeto plurifacetado que é o processo comunicativo do homem. [...] A conseqüência mais imedi- ata é que o instrumental de que a ciência dis- punha para a investigação dos processos co- municativos seguramente não consegue mais dar conta da complexidade do objeto. Uma das conseqüências do fenômeno da rápida transformação pode se traduzir no sentimento de incerteza, marcada por inten- sas alterações históricas, como bem lembra Santaella (2003, p. 16) Nas últimas décadas, tem havido uma constatação constante de que estamos atra- vessando um período de mudanças par- ticularmente rápidas e intensas. Tem sido freqüentemente lembrado que o último quarto do século XX não teve precedente na escala, finalidade e velocidade de sua trans- formação histórica. A única certeza para o futuro é que ele será bem diferente do que é hoje e que assim será de maneira muito mais rápida do que nunca. A razão disso tudo, quase todos afirmam, está na revolução tec- nológica, uma idéia que se tornou rotineira e lugar comum, nestes tempos de tecnocultura [...]. Além disso, cada vez mais, a sociedade da informação se delimita pela fetichização do tempo. Citando Ramonet, Sylvia Mo- retzshon (2004, p.4) lembra que “não é mais possível analisar a imprensa fora da lógica do ‘tempo real’, que submete todas as for- mas e meios através das quais se pratica o jornalismo”. Finalizamos este trabalho sugerindo que um novo tempo tecnológico vem se forjando, pressupomos uma transição do modelo da sociedade da informação ou tecnológica para o da sociedade da nanoinformação ou da na- notecnologia. Não se trata de cunhar novas palavras, nem tampouco de exercitar a futu- rologia. Afora o neologismo, e considerando aquilo que já falamos sobre aspectos estéti- cos enquanto mecanismo associado aos sen- tidos, nos parece evidente a transição para um modelo social em que o processo de co- municação vivencie novas experiências sen- soriais. Referências bibliográficas ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NOR- MAS TÉCNICAS. NBR 14724. In- formação e documentação – trabalhos acadêmicos: apresentação. Rio de Ja- neiro, 2002. ARSUAGA, Juan Luis. 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