Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

IUDÍCIBUS, MARTINS e CARVALHO-Evolução da Contabilidade, Notas de estudo de Economia

IUDÍCIBUS, MARTINS e CARVALHO_Evolução da Contabilidade

Tipologia: Notas de estudo

2013

Compartilhado em 12/02/2013

derick-ventura-2
derick-ventura-2 🇧🇷

3 documentos

1 / 13

Toggle sidebar

Documentos relacionados


Pré-visualização parcial do texto

Baixe IUDÍCIBUS, MARTINS e CARVALHO-Evolução da Contabilidade e outras Notas de estudo em PDF para Economia, somente na Docsity! 7 CONTABILIDADE: ASPECTOS RELEVANTES DA EPOPÉIA DE SUA EVOLUÇÃO R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, n. 38, p. 7 – 19, Maio/Ago. 2005 CONTABILIDADE: ASPECTOS RELEVANTES DA EPOPÉIA DE SUA EVOLUÇÃO RESUMO Trata o presente ensaio, como objetivo princi- pal, de aspectos relevantes da epopéia da evolução da Contabilidade, através das várias fases históricas de seu desenvolvimento, desde o estado de simples método de escrituração baseado nas partidas do- bradas até sua maturação como ciência social apli- cada de forte fundo econômico. Ao longo do traba- lho são analisados os vários enfoques, abordagens e teorias, bem como circunstâncias históricas e ou- tras que possam explicar a Contabilidade enquanto ciência genuinamente social. Na interpretação mais atualizada dessa disci- plina, a cientifi cidade contábil deve ser procurada, preferencialmente, numa série de características como, por exemplo: no entendimento e mensura- ção aplicados aos elementos do patrimônio; na preponderância do valor econômico em lugar de simples custos ou preços; no caráter preditivo das demonstrações contábeis; na introdução do fator risco e do conceito do valor do dinheiro no tempo nas avaliações contábeis, bem como na conside- ração de custos imputados e de oportunidade etc. A Contabilidade pontifi ca pela observação das ca- racterísticas anteriormente vistas e pela incorpora- ção, em seu arcabouço conceitual, da premissa da prevalência da essência sobre a forma, no campo do conhecimento social aplicado, de natureza eco- nômico-fi nanceira, com ramifi cações nas áreas de produtividade, ambiental e social e com evidentes conotações quantitativas quanto à sua mecânica patrimonial. ABSTRACT As a main objective, this paper aims at discus- sing relevant aspects in the epopee of accounting evolution through several historical stages, from a simple method of bookkeeping based on double en- try until its ripening as a social science with a strong economic basis. Some views and approaches to the concept of accounting will be revisited, as well as theories and the historical circumstances and other factors that may explain accounting as a genuine social science. In the more advanced interpretation of our dis- cipline, the scientifi c quality of accounting should be searched preferentially in a series of characteristics, such as, for example: the understanding and mea- suring of equity elements; the preponderant applica- tion of economic value rather than simple costs or prices; the predictive power of fi nancial statements; the introduction of the risk factor and time value of money in accounting evaluations, as well as the consideration of imputed costs and of opportunity costs. The relevance of accounting stems from the observation of the above-mentioned key issues as well as by the incorporation of the prevalence of essence over form into its conceptual framework, in the fi eld of socially applied knowledge area of an economic-fi nancial nature, with ramifi cations in the areas of productivity, environment protection and social responsibility, with necessary quantitative features as to its mechanics of functioning. It is evident that, for research purposes and to enhance certain dimensions, accounting may be SÉRGIO DE IUDÍCIBUS Professor Emérito da FEA/USP E-mail: siudicibus@osite.com.br ELISEU MARTINS Professor Titular do Depto. de Contabilidade e Atuária – FEA/USP E-mail: emartins@usp.br L. NELSON CARVALHO Professor Doutor do Depto. de Contabilidade e Atuária – FEA/USP E-mail: lnelson@usp.br Recebido em 07.03.05 • Aceito em 04.04.05 • 2ª versão aceita em 06.06.05 RC-USP_pg007-019.indd 7 7/22/aaaa 09:49:28 8 Sérgio de Iudícibus • Eliseu Martins • L. Nelson Carvalho R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, n. 38, p. 7 – 19, Maio/Ago. 2005 É claro que, para efeito de pesquisa e para re- alçar certas dimensões, a Contabilidade pode ser estudada sob as mais variadas ênfases, como a ética, a macroeconômica, a institucional e social, a comportamental, a sistêmica e a histórica, entre ou- tras, só que a Contabilidade é muito mais que qual- quer dessas suas abordagens individualmente to- madas. No fundo, um dos objetivos deste trabalho é, também, subsidiariamente, o de ajudar a respon- der, pelo menos em parte, à pergunta cuja resposta se apresenta quase como um enigma: afi nal, o que é a Contabilidade? Palavras-chave: Contabilidade; Epopéia; Evo- lução Histórica; Abordagens; Cientifi cidade; Teorias; Valor. 1 INTRODUÇÃO A Contabilidade, campo de conhecimento es- sencial para a formação dos agentes decisórios dos mais variados níveis, é fruto concebido da relação entre o desenrolar dos fatos econômico-fi nanceiros e sua captação e processamento segundo os pa- radigmas de uma metodologia própria e potencia- lizada pela racionalidade científi ca. Logo, a pedra fundamental que apóia e sustenta o edifício contábil pode ser defi nida como “a contabilidade seguindo, relatando e respeitando a essência dos eventos econômicos que captura e mede”. A capacidade de capturar, primeiro, a ocorrên- cia dos eventos econômicos que impactam em um determinado estado de riqueza, depois a de preci- fi cá-lo e, por último, de comunicar seus efeitos, é o desafi o a que a Contabilidade está, não apenas preferencialmente, mas de fato unicamente, habili- tada a enfrentar, apoiando-se sempre em discipli- nas afi ns dentre as quais o Direito, a Economia, os Métodos Quantitativos e a Ciência da Informação. A doutrina contábil é a face científi ca desse encontro fértil entre a realidade e o modelo para acolhê-la e descrevê-la. Do lento, mas maravilhoso crescimento multiforme, nascem, primeiramente, a escrituração e, mais tarde, a ciência contábil e, por- tanto, sua doutrina. O irromper das questões práticas, que devem ser resolvidas a fi m de a Contabilidade ter sua fun- ção na vida real das organizações e das entidades, de forma alguma pode perturbar, mas sim poten- cializar, as especulações teóricas enquanto ciência. Não se pode esquecer que a Contabilidade, genu- ína e amplamente explicada por teorias de caráter científi co, tem sua faceta prática, extremamente importante, que é a de servir como instrumento de accountability, de avaliação da entidade e de seus gestores, da prestação de contas destes e como in- sumo básico para a tomada de decisões dos agen- tes econômicos, tanto internos quanto externos à entidade. Talvez, seu caráter científi co, na verdade, repouse exatamente no entrelaçamento harmônico e conceitual de seus objetivos, acima delineados, e não em visionárias concepções fundadas no vazio de uma lógica formal fria, infértil e privada de con- seqüências. A urgência na procura de modelos que sirvam para a solução de problemas reais só pode acelerar o desenvolvimento da Contabilidade. Na verdade, as técnicas são os braços, no mundo real, das dou- trinas, da mesma forma que o desenvolvimento tec- nológico é a conseqüência da pesquisa pura. Há os que se comprazem em fazer recair suas concepções teóricas num mundo abstrato e distan- te da realidade, de uma ciência que a si se basta, sem se lembrarem que essa disciplina nasceu das necessidades prementes de gestores, comercian- tes, banqueiros, agentes econômicos de maneira geral, à procura de um modelo descritivo, primei- ramente, e, com sua evolução, previsional, para o mundo dos negócios. E sem se lembrar que a vali- dação de qualquer teoria contábil se dá única e ex- clusivamente pela sua utilidade gerada perante os usuários no mundo prático. Hendriksen e Van Breda (1999:39) pontifi cam: [...] A contabilidade é um produto do Renasci- mento Italiano. As forças que conduziram a essa renovação do espírito humano foram as mesmas que criaram a contabilidade [...] Na verdade, os autores acima se referem à Contabilidade como hoje a conhecemos (como studied under a variety of approaches, such as the ethical, the macroeconomic, the institutional and social, the behavioral, the systemic and the his- torical, among others, but accounting is much more than any of its particular approaches. Finally, one subsidiary objective of this paper is to help trying to answer, at least partially, on the question which addresses to almost an enigma: after all, what is accounting? Keywords: Accounting; Epopee; Historical Evolution; Approaches; Scientifi c Quality; Theories; Value. RC-USP_pg007-019.indd 8 7/22/aaaa 09:49:30 11 CONTABILIDADE: ASPECTOS RELEVANTES DA EPOPÉIA DE SUA EVOLUÇÃO R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, n. 38, p. 7 – 19, Maio/Ago. 2005 vo admitido – computar a base de arrecadação – res- vale ferindo objetivos que não lhe são próprios, como a medição do desempenho empresarial na ótica do sócio ou do credor. O ramo tributário do leque de especializações contábeis não deve ter o direito de conspurcar outros ramos, como o da Contabilidade dita Financeira ou Societária, por exemplo. À medida que foram aparecendo, como con- seqüência da evolução dos tempos e das organi- zações, os outros “players”, a Contabilidade foi se transformando, aos poucos, de um engenhoso sis- tema de escrituração e demonstrações contábeis simplifi cadas, num complexo sistema de informa- ção e avaliação, com características científi cas, ins- titucionais e sociais de grande relevo e tendo, como objetivo central, suprir a necessidade informacional de seus usuários internos e externos à entidade a que se refere. Um dos motivos que provocaram mudança substancial no escopo e complexidade da contabi- lidade foi, sem dúvida, o surgimento do gestor ou gerente como agente separado do proprietário, principalmente a partir de fi nal do século XVIII, avo- lumando-se essa tendência no século XX, com as grandes sociedades por ações. A dicotomia de interesses e objetivos de pro- prietários e gerentes (esses últimos também perten- cem a outro subgrupo, o dos funcionários da en- tidade), embora, por defi nição, os administradores devessem gerir por conta e em benefício dos donos do capital, levou a evoluções extraordinárias, na Contabilidade. Uma delas, o (re)nascimento da Con- tabilidade Gerencial como subárea específi ca de in- teresse e de estudo. Apesar de a Contabilidade ter nascido gerencial quanto ao interesse do proprietá- rio (pois dono e gerente eram a mesma pessoa), foi somente a partir da separação que a Contabilidade Gerencial, fi lha extraída de uma costela da Conta- bilidade Geral, se expande, se desvincula dos rígi- dos parâmetros da Financeira (voltada aos usuários externos e, entre nós, conhecida por Societária) e cria vida própria, principalmente a partir da segunda metade do século XX, sendo o trabalho de Anthony (1966) um dos precursores no gênero. A dicotomia de interesses aparece porque ge- rentes e proprietários, no pressuposto da teoria do comportamento racional dos agentes econômicos, procuram maximizar suas satisfações. Embora os gerentes, em princípio, trabalhem para os proprie- tários, eles acabam criando suas motivações pes- soais, seus objetivos de maximização de satisfação que nem sempre coincidem com os dos proprietá- rios. Para modelar essa dicotomia de interesses e objetivos, tentando a convergência possível, surge, na terceira parte do século XX, a Teoria da Agência. Em Economia (hoje em seu ramo denominado de Institucional), Jensen e Meckling (1976), no que se refere à proposta para reduzir custos contratuais, escrevem trabalho pioneiro. No que se refere a essa teoria, especifi camen- te o aspecto da assimetria informacional é apenas um dos resultantes da dicotomia entre proprietários e gerentes e parte da premissa de que, internamen- te à empresa, os gerentes (chamados de agentes na Teoria) dispõem de muito mais informação do que os proprietários (chamados de Principais). Da mesma forma, como a sociedade em geral é uma rede de contratos de agência, se for considerada a empresa em relação ao mercado, esse tem menos informações do que aquela. Diminuir ou conter a as- simetria informacional é uma das tarefas mais impor- tantes da moderna Contabilidade, agora sim, nesse aspecto (e em outros, como se verá mais adiante), já atingindo a estatura de ciência. Com relação aos as- pectos do surgimento da Teoria Positiva, com os tra- balhos pioneiros de Ball e Brown (1968), de Beaver (1968) e muitos outros, constituem linhagem distinta de pesquisa, diferente da Teoria da Agência a qual, embora em sua modelagem mais avançada seja ex- pressa em formulações quantitativas, é um mode- lo analítico e não um teste de hipóteses, uma das premissas da pura teoria positiva. Voltar-se-á a dis- correr sobre essa última, brevemente, mais adiante. No que se refere à Teoria da Agência, em sua apre- sentação mais formal, não se podem esquecer as contribuições de Jennergren (1980), Wilson (1968), Ross (1973), Demski (1976) e muitos outros. Vê-se, assim, uma plêiade de outros inovadores a ousar e se arriscar nessa epopéica evolução. Finalizando este tópico, depreende-se que o que se informa, em Contabilidade, e como, é algo extremamente importante. Assim, quando uma em- presa, sem levar em conta seus aspectos operacio- nais intrínsecos, simplesmente adota, no cálculo da depreciação, uma taxa linear de 10% ao ano (a taxa fi scalmente admitida para fi ns de dedutibilidade), e assim informa ao mercado, sendo que, por suas características operacionais, a taxa correta deve- ria ser outra, estará, simplesmente, aumentando a assimetria informacional do mercado em relação à empresa. Sob a fácil égide da padronização fi scal, pode-se estar levando os agentes a uma visualiza- ção errônea da situação da empresa. (Ver IUDÍCI- BUS e BROEDEL, 2002). 4 OBJETO E OBJETIVOS Até o item anterior, discutiram-se vários aspec- tos da evolução histórica e da genética contábil. O entrelaçamento entre o que se pretende alcançar RC-USP_pg007-019.indd 11 7/22/aaaa 09:49:31 12 Sérgio de Iudícibus • Eliseu Martins • L. Nelson Carvalho R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, n. 38, p. 7 – 19, Maio/Ago. 2005 em Contabilidade e o contexto patrimonial dentro do qual se desenvolvem os efeitos dos eventos que são registrados deixa não muito clara, às vezes, a dife- rença entre objeto e objetivos da Contabilidade. Na visão destes ensaístas, os objetivos têm um alcance e uma hierarquia muito mais amplos do que o objeto. Objetivo é onde se quer chegar e quem se quer encontrar; objeto representa o con- texto formal da estrutura patrimonial que se altera à medida que os eventos são captados e registrados pela técnica contábil. Suponha-se, assim, que o objetivo da Con- tabilidade seja o de transmitir, de forma inteligível e inteligente, informação estruturada de natureza econômico-fi nanceira, física, de produtividade e social aos vários grupos de usuários da informação contábil, para sua avaliação e decisões informadas, conforme a defi nição da Estrutura Conceitual Bási- ca da Contabilidade da CVM1, ligeiramente adap- tada: conquanto se possam discutir variantes, no que se refere aos objetivos, poucos contestarão a defi nição. Surge, agora, a questão: será que a forma como a Contabilidade, em sua função de sistema receptor, processador e transmissor dos resultados de eventos e transações, obtém essas informações seria a única viável ou possível? Parece que não, pois se poderia, através de outro sistema ou até mediante outra técnica que não a contábil, trans- mitir aos usuários informações de natureza tal que, de alguma forma, suprissem as necessidades dos usuários. Apresentando outro exemplo e analogia, suponha-se que o objetivo seja o de se chegar a um determinado destino: poder-se-ia chegar de avião, de automóvel ou até andando. Variarão o tempo, o custo, o conforto, a segurança, mas o objetivo fi nal poderá ser alcançado por qualquer forma. Objetivo e objeto, todavia, estão intimamente ligados em Contabilidade. A natureza única e dis- tinta da Contabilidade, como técnica e ciência, é a ligação entre objetivos (o quê fazer, aonde chegar) e o objeto (a estrutura viária (patrimonial) que levará a alcançar o objetivo). Por estranho que possa parecer, talvez o fato de os objetivos poderem ser atingidos, pelo menos em parte, através de outro campo de conhecimen- to, que não o estritamente contábil, realce a força do modelo contábil e da integração entre objeto e objetivo. Só a Contabilidade consegue atingir os objetivos propostos, de forma sistemática e com uma relação custo/benefício favorável, através de sua técnica formal de captação, registro, acumu- lação e comunicação de informações contábeis. Assim, o objeto da Contabilidade, ou seja, o patri- mônio e suas variações quantitativas e qualitativas, é a resposta ou a forma mais inteligente, conforme a aceitação da própria sociedade (pois, se assim não fora, ela teria se casado com outro parceiro), de se atingirem os objetivos. Note-se, todavia, que, antes de se atingirem os objetivos, é preciso um processo de comunicação claro no qual o usuário perceba com nitidez o que a linguagem contábil quer transmitir. Essa última parte do processo está longe, ainda, de ter sido resolvida efi cientemente, pois envolve transmissor e receptor, ruídos de in- formação, capacidades distintas de absorção do signifi cado da informação transmitida etc. Está a desenvolver-se, nos últimos decênios, o estudo da Semiótica Contábil, parte aplicada da Teoria da Comunicação, com resultados prometedores, mas ainda incipientes. Por outro lado, não existem pes- quisas conclusivas apontando que efeito se teria na qualidade das decisões por parte dos usuários, se, em vez da Contabilidade, outra fosse a fonte de in- formação econômico-fi nanceira sistemática. Note- se, todavia, que os usuários não se utilizam apenas da informação contábil para suas avaliações e deci- sões, atualmente. O objetivo nasce da necessidade dos usuá- rios. O objeto, o patrimônio, é a grande resposta contábil. O núcleo através do qual, se o contador for além da mera equação patrimonial histórica, se contemplar os desafi os do valor em lugar do cus- to, introduzindo as noções de custos imputados e econômicos, de custo de oportunidade, de valor do dinheiro no tempo, aprofundando a análise dos elementos patrimoniais pelo seu Value at Risk e pela pluralidade dos resultados possíveis em face da va- riabilidade das premissas subjetivas inerentes, terá construído um modelo de validade científi ca com- provada, único, como avaliador do desempenho de uma entidade. Note-se que alguns autores, como Broedel Lopes (2002), consideram que o patrimônio não pode ser o tecido científi co da Contabilidade, pois quem defi ne patrimônio é a própria contabili- dade. Isso faria recair o campo dos eventos a serem estudados pela ciência contábil, efetivamente, no estudo da informação, ligado aos objetivos, e não no patrimônio, propriamente. Na verdade, como foi visto, o patrimônio é a forma primária (o acompa- nhamento de sua evolução no tempo) que a Conta- bilidade escolheu para iniciar o processo de geração de informações úteis para os usuários. 1 Deliberação CVM no 29/86, que aprovou esse Pronunciamento do IBRACON – Instituto dos Auditores Independentes do Brasil e o tornou obrigatório no âmbito das companhias abertas brasileiras. RC-USP_pg007-019.indd 12 7/22/aaaa 09:49:31 13 CONTABILIDADE: ASPECTOS RELEVANTES DA EPOPÉIA DE SUA EVOLUÇÃO R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, n. 38, p. 7 – 19, Maio/Ago. 2005 5 BIOLOGIA, EMBRIOLOGIA E MORFOLOGIA DA CONTABILIDADE A Contabilidade pode ser estudada em analo- gia com o estudo dos seres vivos. Em seus aspec- tos biológicos, estudam-se as manifestações vitais da Contabilidade, bem como seu relacionamento com o mundo que a cerca. Em seus aspectos em- briológicos, estuda-se o fenômeno da transforma- ção de um estado para outro. E, em sua morfologia, analisam-se as medidas classifi catórias e os indi- cadores extraídos das demonstrações contábeis. O todo deve servir como uma explicação para a teoria da evolução dessa disciplina. Usualmente, os estu- diosos da matéria limitam-se aos aspectos morfoló- gicos. Mas, a observação interligada dos três esta- dos é extremamente importante para caracterizar a evolução da espécie contábil. As demonstrações da vivência e existência da Contabilidade e seus relacionamentos com o mun- do que a cerca podem ser inferidas de várias for- mas: a mais importante é a paleontologia contá- bil, ou seja, o estudo dos arquivos históricos e dos signos pictóricos e numéricos deixados pelos con- tadores de antanho, de várias civilizações, para se avaliar como atuava e como se relacionava em cada época histórica. Sua evidenciação atual, também, é extremamente importante, mas deve ser encarada como um estágio da evolução, nunca como fi nal. Percebe-se que a Contabilidade esteve presente na vida das sociedades, das mais variadas formas, desde as mais remotas eras, que remontam, apro- ximadamente, às civilizações: mesopotâmica, egíp- cia, fenícia, grega, romana e de todos os povos da Antiguidade, evoluindo continuamente, passando pela fase da Renascença, pela Revolução Industrial, até chegar à Era do Conhecimento e da Informação. Como já se viu, em tópico anterior, a Contabilida- de, à semelhança dos seres vivos, evolui lenta mas seguramente através dos séculos (às vezes com saltos heróicos, como em todas as ciências), pas- sando pela fase embrionária, de 6.000 anos antes de Cristo até, aproximadamente, 2.000 anos antes de Cristo, em que era um rudimentar instrumento pictográfi co e numérico para inventariar bens, di- reitos e obrigações. Com as civilizações clássicas já em plena maturidade, como a Egípcia e outras, mais tarde a Grega e a Romana, de 800 a.C. até o século XIII, passando pela longa noite da Idade Média, continua aperfeiçoando sua evolução, atra- vés de documentos contábeis estáticos, de posição patrimonial cada vez mais avançada, até se chegar à invenção do método das partidas dobradas e da Contabilidade como técnica completa de escritu- ração e de emissão de demonstrações contábeis, como já se analisou, por volta do século XIII, até a sistematização defi nitiva por Pacioli. A embriologia contábil é muito importante no contexto evolutivo, pois explica como certas espé- cies contábeis evoluem, aparentemente, para ou- tras, guardando, porém, algumas características do embrião inicial. Assim, a Contabilidade, que nasceu para fi nalidade gerencial, mas sob a forma de Con- tabilidade Financeira, apresenta uma mutação e se transforma, mais tarde, em Contabilidade Geren- cial, entre outras espécies derivadas. Na verdade, a essência da Contabilidade Financeira faz parte da genética inicial da Contabilidade Gerencial. Por isso que uma verdadeira teoria da contabilidade não poderia deixar de tratar da contabilidade geren- cial. Grande parte dos autores não atacou de frente esse problema pelo receio de amarrar a gerencial à fogueira punitiva e implacável dos princípios funda- mentais de Contabilidade, aparentemente inibido- res. Não se concorda com essa visão pois, se os princípios de fato existirem e se forem defi nidos de forma mais ampla, com aceitação de valor em lugar de preços, de custos imputados, de oportunidade etc., é perfeitamente possível enquadrar as práticas da Contabilidade Gerencial sob um amplo guarda- chuva conceitual teórico. A morfologia contábil estabelece as medidas e classifi cações das espécies e sub-espécies. As- sim, as sub-espécies poderiam ser a Contabilida- de Gerencial, a de Custos, a Estratégica (essa, por sua vez, uma sub-espécie da gerencial), a Auditoria, as revisões e as perícias etc. Dentro de cada sub- espécie existem classifi cações específi cas, bem como medidas e indicadores especiais que se atêm às características da sub-espécie, embora alguns indicadores sejam comuns a todas, como Lucro sobre Patrimônio Líquido, Lucro Operacional sobre Ativo Total e poucos outros. A morfologia contábil é importante no processo evolutivo pois caracteriza e monitora a evolução das espécies contábeis dan- do condições aos pesquisadores de proteger as em extinção, se necessário. 6 AS VÁRIAS ABORDAGENS À CONTABILIDADE A Contabilidade pode ser visualizada conforme várias abordagens, enfoques, o “approach” dos po- vos de língua inglesa. Conquanto nenhuma das vá- rias abordagens seja sufi cientemente ampla e den- sa para explicar toda a prática contábil, elas lançam luzes e fazem vislumbrar aspectos interessantes e peculiares. Não se tratará, neste trabalho, de todas as principais abordagens, nem mesmo da maior par- RC-USP_pg007-019.indd 13 7/22/aaaa 09:49:31 16 Sérgio de Iudícibus • Eliseu Martins • L. Nelson Carvalho R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, n. 38, p. 7 – 19, Maio/Ago. 2005 nham o “status” de Teorias. Evidentemente, qual- quer abordagem, as analisadas no tópico anterior e outras, (veja IUDÍCIBUS, 2004), pode, no futuro, atingir a dimensão de teoria. A teoria normativa, apoiada, preferencialmente, no método dedutivo, faz hipóteses sobre o universo contábil e deriva prescrições de como a Contabili- dade deveria proceder para maximizar a utilidade da informação para os variados tipos de usuários. A teoria positiva foca aspectos mais restritos da fe- nomenologia contábil, estabelece hipóteses e tes- ta, muitas vezes através de métodos quantitativos, mas nem sempre, tais hipóteses. Procura entender o mundo contábil como ele é, porque é assim e não como deveria ser. Já se tratou bastante, em livros, artigos e palestras, das diferenças entre as duas teorias e não se vai aprofundar o assunto aqui. Apenas se destaca que as duas formas de enca- rar a Contabilidade se transformaram em teorias, a primeira pela sua abrangência e pela lógica de sua derivação e a segunda (a positiva) pelas evidências, totalmente insuspeitadas algumas, que revela, após as hipóteses terem sido testadas. É claro que a metodologia de preferência da te- oria positiva é a indutiva. Os autores que preferem a abordagem (teoria) positiva são bastante críticos com relação à normativa. Os seguidores dessa úl- tima, usualmente, são mais ávidos em conhecer as vantagens do positivismo do que em criticá-lo. Tal- vez por ser uma abordagem (teoria) que somente ini- ciou seu desenvolvimento na década de 60, sendo, ainda, relativamente recente, o positivismo contábil (não confundir com o positivismo de A. Comte, fi ló- sofo) ainda se constitui em algo “excêntrico”, para a maior parte dos pensadores contábeis, no Brasil. O grande defeito da abordagem (teoria) nor- mativa é que é preciso muito tempo e experimen- tação para verifi car se as prescrições deram certo, no mundo real da Contabilidade. O risco é muito grande, pois depende das premissas serem válidas e das normas vencerem o teste da realidade. A limitação da abordagem (teoria) positiva é a difi culdade que se tem em traçar um elo entre as várias pesquisas e testes de hipóteses, no sentido evolutivo. Na primeira vez que se lê um texto positi- vo, tem-se a impressão de que se trata de uma série de pesquisas, sem poder se estabelecer uma ordem e uma seqüência lógicas. Evidentemente, classifi ca- ções dos tipos de pesquisa podem ser feitas, como: pesquisas de mercado de capitais, pesquisas de value-relevance, pesquisas de gerenciamento de re- sultados etc., mas, ainda assim, para o pesquisador iniciante, é difícil estabelecer uma visão de conjunto. Pensa-se que, com a evolução e aprimora- mento da teoria positiva e sua experimentação, num período não muito longo de tempo surgirá uma for- ma de entender melhor o entrelaçamento entre as pesquisas e de formar uma teoria geral. De qualquer maneira, fi nalmente começa a se notar no Brasil a tendência do incremento do número de pesquisas, trabalhos e dissertações e teses que utilizam me- todologias empíricas, em contraste com a absoluta predominância de trabalhos descritivos, que carac- terizou a produção literária contábil até recentemen- te. Para um maior aprofundamento no estudo da epistemologia contábil, veja-se Theóphilo (2004). 8 DO CUSTO HISTÓRICO AO VALOR: A DIFÍCIL TRAVESSIA Quando se cristalizou a excelência do “méto- do” contábil para registro, fi cou visível a viabilida- de de ele permitir relatos ou relatórios a partir dos quais análises de desempenho fi cariam mais robus- tas – entenda-se aqui tais análises tanto do passado quanto prospectivas. Essa a gênese da Contabilida- de, como meio de informação, e sua característica de disciplina utilitária: primeiro, aos interessados em desempenhos pretéritos (autoridades tributárias para arrecadar, acionistas para esperar dividendos) a Contabilidade acudia e acode com métricas inteli- gíveis. Aos demais, ela se presta a mostrar como foi o passado eminentemente como base para es- timar como será o futuro. O caráter preditivo da Contabilidade alcançou tal relevância que no mun- do dos mercados de capitais, é pacífi co o enten- dimento de que demonstrações contábeis servem, primária e fundamentalmente, para auxiliar a prever fl uxos futuros de caixa. É o ato de conhecer a “cau- sa mortis” destinando-se a pesquisar remédios que a evitem no futuro. Nesse contexto, ao evoluir a Contabilidade vestiu, desde sua origem, as sandálias da humilda- de e, tendo em vista que o modelo contábil trata, preferencialmente, de transações realizadas e seu efeito no patrimônio, o valor de transação tem sido o paradigma central para a mensuração. A Conta- bilidade é um excelente meio para se apurar o re- sultado e efeitos no patrimônio da entidade de suas operações com o mundo exterior. Apesar dos avan- ços da Contabilidade Gerencial e de Custos, ainda há difi culdades para alocar tal resultado às divisões internas da entidade, mesmo as operacionais. Mais ainda para as de serviços. Mas, é indiscutível a efe- tividade do modelo, dentro de suas limitações. Com a evolução das formas organizacionais, levando a grandes conglomerados, os contadores responde- ram com a técnica de consolidação de balanços, um grande passo. Mas, note-se que a essência é sempre a de evidenciar o resultado do grupo RC-USP_pg007-019.indd 16 7/22/aaaa 09:49:31 17 CONTABILIDADE: ASPECTOS RELEVANTES DA EPOPÉIA DE SUA EVOLUÇÃO R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, n. 38, p. 7 – 19, Maio/Ago. 2005 de entidades com relação às transações com o mundo fora do conglomerado. Talvez que, se não tivesse sido inventado o mé- todo das partidas dobradas, se a Contabilidade, com difi culdades enormes, tivesse continuado a ser ape- nas o levantamento periódico de inventários de bens, direitos e obrigações (balanços patrimoniais), a ava- liação dos elementos patrimoniais teria sido, desde o início, a valores de mercado, atuais, pelo menos na data de cada avaliação. Não existindo a sistemática de acumulação propiciada pelas partidas dobradas, provavelmente, o contador, ao levantar o balanço, avaliaria seus elementos patrimoniais por um valor mais atualizado possível. Mas, essa é apenas uma hi- pótese de impossível comprovação. O fato é que as partidas dobradas, pela tempestividade e efi ciência com que permitiram o registro das operações (com as fases posteriores de balancetes, ajustes, balan- ços etc.), privilegiaram o valor de transação (custo histórico). O valor histórico para determinados ele- mentos patrimoniais (estoques e imobilizado, princi- palmente), por signifi car a retenção, na memória, do valor do caixa despendido na sua aquisição, a fi m de se descarregar esse fl uxo contra o da entrada propi- ciado pelo reconhecimento da receita também pare- ce explicar fortemente a manutenção dessa base de registro. Veja-se Martins (1999; 2001). Apesar de, ao longo da história, terem se veri- fi cado, em vários países, surtos infl acionários de di- mensões às vezes extraordinárias (como na Alema- nha, por volta da Primeira Grande Guerra, no Brasil, nas décadas de 80/90 e em muitos outros países, inclusive nos EUA, na década de 70, com taxas, para aquele país, altas), a profi ssão contábil foi relativa- mente lenta em responder com técnicas e modelos compensatórios, talvez com exceção do Brasil e de poucos outros paises (como Argentina, Chile e Isra- el). De fato, desde 1958, o Brasil institui a reavaliação de ativos fi xos e, em seguida, adotou vários modelos de correção, culminando com a Correção Monetária Integral, em 1987. Abruptamente, em meados da dé- cada de 90, o Governo Federal extinguiu a correção monetária, como se a infl ação tivesse desaparecido completamente de nosso cenário econômico. Os pesquisadores e acadêmicos, entretan- to, dedicaram-se, desde os primórdios dos surtos infl acionários, a moldar modelos compensatórios. Antigos trabalhos acadêmicos com relação ao cus- to histórico corrigido pela infl ação geral remontam a 1919, com E. Schmalenbach e F. Schmidt (este mais em relação ao custo de reposição) na Alema- nha, década de 20 com G. Zappa (GALASSI e MAT- TESSICH, 2004; MATTESSICH e KUPPER, 2003), culminando, em 1936, com a extraordinária obra de Sweeney. Não se contará, aqui, sobre a cronologia de trabalhos acadêmicos de autores da USP e ou- tros de outros centros de pesquisa no Brasil, por ser demasiado conhecida de nossos estudiosos. É forçoso reconhecer, entretanto, que, mesmo entre alguns acadêmicos, tratou-se mais de dar res- postas parciais e espaçadas no tempo para proble- mas emergenciais, do que de erigir uma verdadeira teoria da avaliação patrimonial a valores econô- micos, de forma estruturada e integral, com exce- ção do notável trabalho de Edwards e Bell (1961). Trabalhos nessa linha, principalmente na trilha do custo de reposição, transformaram-se em marcos no Brasil, como o primeiro dos autores deste en- saio, Iudícibus (1966) e Szüster (1985). Estranhamente, por volta de meados a fi ns dos anos 90, e anos iniciais do Século XXI, foram os órgãos reguladores internacionais, como o FASB e IASB, a dar o toque de avançar, instituindo, limi- tadamente é verdade, a avaliação a valores de mer- cado e, fi nalmente, o fair value, enquanto os aca- dêmicos fi cavam extasiados ao contemplar, como novos Narcisos, no espelho das vaidades, suas an- tigas imagens, distorcidas por modelos parciais de correção. Rara exceção, nesse contexto, é a obra da FIPECAFI, organizada por Eliseu Martins (2001), intitulada “Avaliação de Empresas: Da Mensuração Contábil à Econômica”, editada pela Atlas. Os contadores têm sido criticados por pro- vidências que “deveriam” ter tomado, segundo os críticos, mas que, na verdade, representariam um excesso de subjetivismo, talvez não totalmente res- ponsável, como tentar inserir no ativo o valor do Ca- pital Intelectual, ou do Goodwill criado internamente, conceitos reconhecidamente importantes, mas ain- da pouco suscetíveis de uma avaliação que, embora sempre subjetiva, tivesse um mínimo de sustenta- ção. Entretanto, nada impediria, a não ser conside- rações de custo/benefício, de apresentar tais ava- liações em quadros suplementares, indicando com clareza os critérios utilizados. Existem, todavia, tópi- cos mais urgentes a serem atacados no Brasil como Relatórios por Segmentos, Resultado de Operações Descontinuadas, Leasing, Concessões e outros para os quais existem encaminhamentos parciais. A travessia do custo histórico para o valor, como detalhada em trabalho anterior por Iudíci- bus (1998), não é isenta de difi culdades e perigos. Acadêmicos e profi ssionais divergem sobre o que seria exatamente valor para a Contabilidade. Será um custo de reposição calculado? Ou um valor de cotação de mercado (de compra ou de venda?). Ou o valor presente dos fl uxos de caixa que um ativo é capaz de gerar? Um ativo isoladamente, ou em con- jugação com outros e outros fatores? A defi nição de Fair Value, ou seja, “... importância pela qual um RC-USP_pg007-019.indd 17 7/22/aaaa 09:49:31 18 Sérgio de Iudícibus • Eliseu Martins • L. Nelson Carvalho R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, n. 38, p. 7 – 19, Maio/Ago. 2005 ativo poderia ser transacionado entre um compra- dor disposto e conhecedor do assunto e um ven- dedor também disposto e conhecedor do assunto, em uma transação sem favorecimento” (IUDÍCIBUS, MARION e PEREIRA, 2003), também é repleta de di- fi culdades, pois, no fundo, dever-se-ia reproduzir, já passado certo tempo da transação original, a con- dição da própria transação, até expurgada de even- tuais situações de força de barganha por parte do vendedor ou comprador, tendo em vista sua posi- ção no mercado. Entretanto, não se vê como deixar de enfrentar o desafi o. A Contabilidade repousou por longo tempo, longo demais, na auto-satisfação de sua “objetividade” presumida, como se, mesmo avaliando a valores de custo histórico, as cifras con- tábeis, exceto algumas, não fossem meras estimati- vas. Já que se trata de aproximações, está na hora de assumir, de vez, o subjetivismo responsável, de que falam Iudícibus e Carvalho (2001). 9 O PROBLEMA DAS LINHAS DOUTRINÁRIAS No Brasil, limitadamente ao campo acadêmico, ainda se discute que “escola” de Contabilidade de- veria ser seguida. A Européia Continental, primordial- mente Italiana, considerada pelos seus seguidores como a única capaz de atribuir conteúdo conceitual e fi losófi co à essa disciplina, ou a “escola” denomina- da, por brevidade, de “anglo-saxônica”, e duramente criticada pelos “supporters” da primeira (mas abra- çada completamente pelo IASB – International Ac- counting Standards Board, pela União Européia para suas companhias abertas (o que inclui países latinos e germânicos) a partir de 2005, e em direção à qual caminham a China, o Japão, o México, e, tímida e tentativamente, o Brasil, entre outros), qualifi cando-a como privada de densidade teórica e apressadamen- te classifi cada e taxada de “empírica”. Interessante que se destitui ao empirismo qualquer conotação conceitual, como se os empíricos tivessem sido um bando de aventureiros e de desprovidos de razão, quando, na verdade, se tratou de uma corrente fi losó- fi ca extremamente nobre que baseava e baseia suas visões do mundo na evidência e na constatação. Considera-se que, no estágio atual da evolu- ção da Contabilidade, com a globalização e a con- vergência internacional da regulação, tal acalorada discussão sobre as duas visões da Contabilidade perde parte de seu signifi cado na prática, sendo certo, todavia, que ambas são dignas (pelo menos para os “scholars”), de estudo e de meditação. O mais importante, mesmo nesse exercício teórico, é buscar os pontos de convergência, sempre se pri- vilegiando o usuário da informação contábil. Estu- diosos de grande capacidade pertencem ou perten- ceram a uma dessas orientações, obviamente com muitos ajustes fi nos. Diga-se que, usualmente, são os que vestem a camisa de uma escola a classifi car os outros no outro time, “arqui-rival”. Não se pode deixar de comentar, todavia, que, na opinião destes ensaístas, a forma de encarar a Contabilidade, sim- plesmente taxada de “anglo”, encontra muito mais amparo e seguidores nas empresas de ponta e entre os profi ssionais mais atualizados num número cada vez maior de países. Na verdade, na prática, possi- velmente nem se cogitaria da aplicação das normas emanadas da “outra” escola, mesmo que existis- sem. Academicamente, entretanto, as discussões sérias e profundas são sempre bem-vindas, sempre no pressuposto do respeito intelectual e pessoal em face das divergências de visão. 10 O ENIGMA PERMANECE: AFINAL, O QUE É CONTABILIDADE? Não haverá relato da evolução passada da Contabilidade, por mais completo e pormenorizado que possa ser, que apresente o retrato perfeito e integral do que é e, mais ainda, do que possa vir a ser essa disciplina. Uma fotografi a de uma paisa- gem ou de qualquer ser ou objeto transmite uma visualização instantânea do ser; uma série de retra- tos, tirados em datas e épocas diferentes, traduzem a evolução. Da análise dessa evolução podem-se extrair algumas generalizações, com muito cuidado, mas a integralidade do ser e sua tendência no futuro se apresentam como enigmáticos. É confortante poder expressar as dimen- sões atuais da Contabilidade como uma forma efi caz de avaliação de desempenho econômico e fi nanceiro (e social) de entidades e gestores; como insumo essencial para a tomada de deci- sões econômico-fi nanceiras; como instrumento de accountability efi ciente de qualquer gestor de recursos perante a sociedade. Isso é um fato. Acredita-se que a Contabilidade possa evoluir muito mais, mas a dimensão e a direção dessa evolução dependem de muitos fatores institucio- nais, econômicos e sociais. Querer, assim, prognosticar o que a Contabi- lidade possa vir a ser é querer prever o que a so- ciedade humana será, no futuro. Afi nal, Melis (1950) expressou da forma mais feliz a complexidade do enigma: “A história da contabilidade confunde-se com a história da própria civilização!”. RC-USP_pg007-019.indd 18 7/22/aaaa 09:49:31
Docsity logo



Copyright © 2024 Ladybird Srl - Via Leonardo da Vinci 16, 10126, Torino, Italy - VAT 10816460017 - All rights reserved