Baixe Processo e definições nas obtenções das bebidas e outras Esquemas em PDF para Ciência e Tecnologia de Alimentos, somente na Docsity! Aula 4 — Bebidas fermentadas | — cerveja
Objetivos
Definir fermentação alcoólica.
Comparar a fermentação alcoólica com os demais tipos de fermentação.
Distinguir os diferentes tipos de cervejas.
Descrever o processo básico de elaboração da cerveja.
Identificar os ingredientes da cerveja e suas funções para o processo.
4.1 Fermentação
Ao longo da história, a fermentação foi um dos fenômenos que mais desper-
tou curiosidade no homem, uma vez que proporcionava alterações perceptí-
veis na matéria-prima, trazendo benefícios aos alimentos e bebidas por meio
de alterações gustativas e aromáticas e aumento da conservação.
A fermentação é um processo de transformação de uma substância em ou-
tra mais simples a partir de microrganismos, tais como leveduras e bactérias.
Essa transformação bioquímica, que ocorre em produtos de origem animal e
vegetal, é responsável por inúmeros produtos que consumimos diariamente.
As leveduras e bactérias liberam enzimas que crescem o pão e transformam
suco de uva em vinho, produzem diversas substâncias químicas e antibióticos
por meio do controle das condições de fermentação. Da transformação que
ocorre em aerobiose se obtém vinagre e ácido cítrico. Já da transformação por
anaerobiose ocorre a obtenção de cerveja, vinho, iogurte, penicilina etc. Desta
forma, muitos desses microrganismos são considerados aeróbios facultativos.
Assim, a fermentação é uma importante base de processos na indústria de
alimentos, os quais convertem matéria-prima, como grãos, açúcares e sub-
produtos industriais, em produtos diferentes; conservam alimentos de ori-
gem animal (salame, iogurte) e vegetal (picles, chucrute), além de produzem
antibióticos (penicilina).
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Na área da fermentação,
a maior parte dos estudos
realizados mundialmente
foi relacionada à
fermentação alcoólica.
A fermentação alcoólica é utilizada para a elaboração de bebidas alcoólicas,
dentre as quais temos as fermentadas (vinhos e cervejas) e as destiladas
(rum, aguardente, uísque etc.). Os açúcares solúveis presentes nas diversas
matérias-primas são transformados, principalmente, em etanol, o álcool en-
contrado em todas as bebidas alcoólicas. A transformação dos monoglico-
sídeos em etanol e gás carbônico é realizada devido à presença de enzimas
excretadas por leveduras (Saccharomyces cerevisiae e Schizosaccharomyces
pombe). Essas enzimas promovem diversas reações que terminam por trans-
formar, com liberação de calor, um açúcar simples (C,H,,0,) em etanol e gás
carbônico, conforme a equação geral:
CiH,/0, > 2 CH,CH,0H +2 CO, + 33cal.
O açúcar pode ser fornecido pela uva, cana-de-açúcar, maçã, cevada, ou
seja, por frutas, cereais, raízes e tubérculos em geral, para obtenção de be-
bidas alcoólicas. Dependendo do açúcar presente, são adicionadas leveduras
adequadas à quebra das moléculas para obtenção, principalmente, de eta-
nol e gás carbônico. Os carboidratos são muito usados para complementos
de fermentação porque possuem elevados teores de açúcares fermentesci-
veis e baixos teores de proteínas. Entre os mais comuns estão a sacarose,
glicose, maltose e açúcar invertido (glicose e frutose).
A fermentação alcoólica produz bebidas com teor alcoólico próximo a 15%
porque as enzimas excretadas pelas leveduras são inativadas, produzindo
bebidas muito aquosas.
Além da fermentação alcoólica, temos:
e Fermentação láctica: muito utilizada para a preservação de alimentos
de origem vegetal (picles, chucrute, azeitona) e animal (queijos e sala-
mes). O leite é a principal matéria-prima dessa fermentação, porém, para
conservação de alimentos é realizada a fermentação láctica de hortaliças
e azeitonas, produzindo o picles.
* Fermentação acética: utilizada na indústria de alimentos para a produ-
ção do vinagre. Através dela é obtida a oxidação do álcool na presença
de bactérias acéticas (microflora mista Acetobacter), porém, existem es-
pécies que oxidam o álcool a gás carbônico e água, o que é indesejável
quando o objetivo é a obtenção do vinagre.
70 Tecnologia de Bebidas
ao por O Neo iara malte de cevada > 20% e < 50%, como fonte de açúcar
minante
Quanto à fermentação
ietefmaso processo de fermentação que utliza leveduras ativas a temperaturas baixas (9º a
15ºC), com fermentação mais lenta e mais aromas
alta fermentação processo de fermentação que utiliza leveduras ativas a temperaturas mais eleva-
ds (15º a 25ºC), com aromas típicos frutados e, por vezes, condimentados
a: pesoipeso; b: volumelvolume
Fonte: EBC: European Brewery Convention
A legislação ainda regulamenta os tipos de cervejas, as leveduras, enzimas,
agentes clarificantes, filtrantes e absorventes e aditivos. Estes últimos são
classificados em:
* intencionais - usados intencionalmente para melhorar, corrigir ou preser-
var as características organolépticas;
* incidentais — defensivos agrícolas, solventes da extração do lúpulo e con-
taminantes minerais.
As cervejas, segundo a mesma legislação, não podem apresentar micror-
ganismos patogênicos ou substâncias produzidas por microrganismos em
concentração suficiente para causar danos à saúde humana. Além disso, as
fábricas devem apresentar condições higiênico-sanitárias satisfatórias.
Pesquise na nossa legislação quais os coadjuvantes utilizados na fabricação
da cerveja e a função deles.
4.2.1 Matéria-prima
A fabricação da cerveja em qualquer lugar do mundo, como na Alemanha,
é realizada com três ingredientes básicos e adjuntos. Entretanto, a cerveja é
uma bebida muito versátil que permite muitas variações em função da pro-
porção dos ingredientes, do grau de maltagem do cereal, o tipo de lúpulo e
de fermentação, temperatura e duração das etapas do processo e as formas
de armazenamento e envase.
Os adjuntos são produtos ou materiais que fornecem carboidratos para o
mosto cervejeiro, desde que permitido por lei. Normalmente, são produtos
do beneficiamento de cereais ou outros vegetais ricos em carboidratos, são
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Mais de 70% da produção
mundial de cevada é destinada
à ração animal. Além disso,
atualmente temos o cultivo de
grãos voltado à produção de
biocombustíveis.
utilizados principalmente por razões econômicas. Além disso, melhoram as
características físico-químicas e sensoriais da cerveja.
Veja a seguir os seus ingredientes básicos.
4.2.1.1 Malte
A cevada, cereal que apresenta maior facilidade na maltagem (Figura 4.2) é
componente obrigatório da cerveja, mas às vezes pode ser acrescida de ou-
tros cereais (trigo, aveia, arroz e milho), embora mais difíceis de maltar. Além
da facilidade de maltagem, a cevada apresenta características que a tornam
mais adequada para produção de cerveja, quais sejam:
e elevado teor de amido, ou seja, de extrato fermentescível;
* quando maltada possui elevado teor de enzimas que ajudam no processo
de produção do mosto;
* contém proteínas que proporcionam a formação de espuma, corpo e
equilíbrio coloidal;
e teor de lipídio relativamente baixo;
* mais barata e mais fácil de maltar.
Figura 4.2: Grãos de cevada
Fonte: <www.thumbs.dreamstime.com/thumb. 246/120522287 InjihjPjpg>. Acesso em: 13 jan. 2011.
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O processo de maltagem é fundamental para a qualidade da cerveja, sendo
o malte o responsável pela cor e pelo paladar da bebida. Além disso, a fer-
mentação alcoólica será realizada pelos açúcares obtidos da transformação
do malte na fabricação do mosto.
Para obtenção do malte, os grãos de cereais são umedecidos a ponto de
iniciarem a germinação. Quando o embrião começa a germinar, produz en-
zimas que quebram as cadeias de amidos e proteínas. A intensidade dessa
quebra é conhecida como grau de maltagem. Nesse ponto, temos o malte
“verde”, que será seco ou torrado. Durante o processo de secagem e tor-
refação a cor sofre alterações. Dessa forma, quanto mais torrado o malte,
mais escura será a cerveja. O mesmo acontece com o aroma, que adquire
notas aromáticas diferenciadas (caramelo, chocolate, café etc.). Essas carac-
terísticas são importantes para que o mestre cervejeiro elabore cervejas com
características próprias.
4.2.1.2 Lúpulo
O lúpulo é utilizado em pequena quantidade na fabricação da cerveja, de 40
g a 300 g para 100 L de produto final. O lúpulo, ao contrário do malte, não
altera o teor alcoólico da cerveja, sua presença é fundamental para o amar-
gor típico da bebida. Além disso, possui notas aromáticas — floral, frutado,
herbáceo e condimentado — essencial para muitos estilos de cerveja.
A maior parte da produção de lúpulo ocorre em regiões de clima tempera-
do, entre os paralelos 35º e 55º, nos hemisférios Norte e Sul. Por ser muito
sensível às condições climáticas, apresenta diferenças visíveis em função do
microclima. A produção concentra-se na Alemanha, Estados Unidos, China
e República Checa, responsáveis por 80% da produção mundial.
A comercialização é realizada na forma de cones secos, em pequenos blocos
compactos, e como extrato. Este último, por ser mais estável e concentra-
do, exige menor espaço de armazenamento e é facilmente manipulado na
indústria cervejeira.
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Genericamente, o malte de
cevada fermentado produz
cerveja e o malte de cevada
destilado produz uísque.
para conferir o gosto amargo e a segunda para contribuir com a complexida-
de aromática, com substâncias voláteis, como vimos anteriormente. Durante
essa etapa é formado o trub, uma aglomeração de proteínas separada por
sedimentação. Quanto mais eficiente o processo de separação, mais sabor e
estabilidade de brilho a cerveja terá. Em seguida, o mosto é resfriado rápido,
evitando aromas indesejáveis e contaminação microbiana, até a temperatura
de fermentação com trocadores de calor de placas.
Figura 4.4: Trub do mosto, produção artesanal
Fonte: <www.henrikboden.blogspot.com>. Acesso em: 13 jan. 2011.
4.2.3.2 Fermentação alcoólica
A fermentação alcoólica se processa em tanques (Figura 4.5.), com a trans-
formação dos açúcares pelas leveduras, basicamente em gás carbônico (CO,)
e etanol. O controle dessa etapa tem como objetivo favorecer a formação de
aromas agradáveis e eliminar os indesejáveis, por meio da temperatura de
fermentação, duração, contrapressão e escolha e quantidade de levedura.
Ao término da fermentação, a levedura sedimenta ou flocula, sendo remo-
vida para utilização em outra fermentação, desde que mantida a qualidade
microbiológica.
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Figura 4.5: Tanques de fermentação
Fonte: <http://wwwpapodebar.com>. Acesso em: 13 jan. 2011.
4.2.3.3 Maturação
A maturação ocorre em temperatura inferior à fermentação para que acon-
teçam reações físico-químicas que conferem maior qualidade ao aspecto
visual e que produzem alguns aromas e sabores, é o “afinamento” da cer-
veja. Nessa etapa, a carbonatação natural da cerveja ocorre como efeito da
contrapressão exercida pelo próprio tanque de maturação pelo restante do
gás carbônico produzido durante a fermentação. A temperatura mais baixa
favorece a complexação de proteínas e polifenóis, contribuindo com a etapa
de clarificação.
4.2.3.4 Clarificação e carbonatação
A filtração confere à cerveja um acabamento brilhante, eliminando quase
que totalmente as leveduras que ainda restam após a maturação. Geralmen-
te, o meio filtrante é a terra de diatomácea (mineral de origem sedimentar
rico em sílica) e os filtros são de placas verticais ou horizontais. Além dos
filtros, são utilizadas centrífugas para clarificar a cerveja maturada.
A concentração de gás carbônico é corrigida por meio de injeção de CO, na
cerveja, logo após a filtração.
4.2.3.5 Acondicionamento
Após a carbonatação, a cerveja é acondicionada em tanques pressurizados
com temperatura de 0º a 1ºC. A pressurização dos tanques garante a con-
Aula 4 — Bebidas fermentadas | - Cerveja 79
Apenas no Brasil, o chope é a
cerveja armazenada em barris
e servida por meio de torneiras
depois de passar por um
trocador de calor de serpentina.
centração de gás carbônico na cerveja. O acondicionamento nesses barris de
aço inox é conhecido como embarrilamento e proporciona a manutenção
da qualidade da bebida e características do produto original, devendo ser
mantido nessas condições até a chegada ao bar.
O acondicionamento em garrafa de vidro, tradicionalmente de vidro escuro
e com 600 mL, surge da necessidade de comercialização da cerveja em me-
nor volume. Como a cerveja é uma bebida que facilmente sofre degradação,
a pasteurização e os sistemas avançados de refrigeração possibilitam maior
estabilidade da cerveja envasada, possibilitando a entrega em locais distan-
tes da cervejaria. No setor de engarrafamento, as condições sanitárias do
local e das garrafas e o controle de qualidade são críticos.
Outra forma de comercialização são as latas de alumínio com revestimento
interno para preservação das características organolépticas. Quando com-
paradas com as garrafas, as latas têm como vantagens o baixo custo, maior
facilidade de manuseio e logística e maior produtividade de envase.
O processo de pasteurização, que como vimos colabora com a manuten-
ção da qualidade da bebida, proporciona aquecimento rápido, em torno de
60ºC, por um curto período de tempo, garantindo uma estabilidade micro-
biológica. O aquecimento excessivo provoca reações que prejudicam o pa-
ladar (aumento da adstringência) e o aroma (“caramelado” e “queimado”).
Pesquise as diferenças entre os processos de elaboração da cerveja e da cer-
veja sem álcool.
Resumo
Nesta aula, vimos que a fermentação alcoólica é uma sequência de reações
bioquímicas, na qual as leveduras transformam açúcares e amidos em eta-
nol, gás carbônico e produtos secundários. Esse processo de obtenção de
bebidas alcoólicas é utilizado na produção da cerveja, obtida pela fermen-
tação de cereal maltado (cevada, milho, trigo etc.), sendo a cevada o mais
apropriado, adicionado de lúpulo (elemento que garante amargor e comple-
xidade aromática), água e aditivos. Vimos também que os diversos tipos de
cervejas são obtidos por combinação do grau de maltagem, cereal utilizado
e controles na etapa de fermentação.
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